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AMÉRICA LATINA
Governo prometera zerar cultivos ilegais até 2002; fenômeno segue crescimento político do movimento cocaleiro
Cultivo de coca cresce na Bolívia e inviabiliza meta
ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO
Festejado pelos EUA e pelas Nações Unidas, o plano boliviano de
erradicação das plantações ilegais
de coca, que previa a completa erradicação desses cultivos até 2002,
não conseguiu atingir seu objetivo. Dados da DEA (agência antinarcóticos dos EUA) mostram
que as plantações ilegais na Bolívia chegaram a 12,4 mil hectares
em junho deste ano, o maior nível
desde 1998, com um aumento de
25% em relação ao ano passado.
Somando os 12 mil hectares de
cultivos de coca legais na Bolívia,
há hoje no país 24,4 mil hectares
de cultivos da planta, matéria-prima para o refino da cocaína.
Os cultivos ilegais, que vinham
caindo consideravelmente desde
1998, primeiro ano de implantação do Plano Dignidade, de erradicação dos cultivos, voltaram a
crescer a partir do ano passado.
O fenômeno coincide com o
crescimento do poder político do
movimento dos cocaleiros, os
plantadores de coca. O principal
líder cocaleiro do país, Evo Morales, chegou ao segundo turno das
eleições presidenciais, em agosto,
e seu partido, o MAS (Movimento
ao Socialismo), fez a segunda
maior bancada no Congresso.
"O governo anterior impôs o
Plano Dignidade de cima para
baixo, sem diálogo, e chamava
Evo Morales de narcotraficante e
terrorista", disse à Folha Oscar
Coca, principal assessor de Morales. "Agora, com a grande legitimidade proporcionada pelo voto,
os cocaleiros são reconhecidos
como força política pelo atual governo e chamados a negociar."
Nos anos anteriores, os cocaleiros foram responsáveis por grandes e violentos protestos, que chegaram a deixar as estradas do país
interrompidas por várias semanas. Vários policiais e manifestantes foram mortos em confrontos
renitentes.
O governo do presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, do liberal
MNR (Movimento Nacionalista
Revolucionário), que assumiu em
agosto, diz que existe interesse em
dialogar com os cocaleiros, mas
nega que tenha havido uma redução no trabalho de erradicação
dos cultivos ilegais.
"Há vontade do governo de dialogar com todos os setores, não
somente com os cocaleiros, porque não podemos nos dar ao luxo
de ter conflitos sociais, que prejudicam nossa economia", diz o vice-ministro de Defesa Social, Ernesto Justiniano Urenda, responsável pelo programa de combate
às plantações ilegais.
Apesar disso, o diálogo está em
um impasse. Os cocaleiros, insatisfeitos com as propostas do governo, prometem um novo protesto, com bloqueios de estrada,
para 6 de janeiro -o primeiro
enfrentado pela atual administração.
Os cocaleiros pedem a interrupção dos trabalhos de erradicação
dos cultivos de coca, enquanto
um grupo independente realizaria um estudo sobre o potencial
do mercado legal da planta. O argumento dos cocaleiros é que o limite para as plantações legais, estabelecido por uma lei de 1988, está aquém do potencial para atender ao mercado legal da coca.
O governo concorda com a avaliação do mercado legal da coca,
mas não admite a paralisação da
erradicação.
Na Bolívia, o comércio das folhas de coca é livre. Ela é consumida tradicionalmente pelas populações indígenas do país para
mascar ou na forma de chá. O
consumo de folhas de coca é recomendado para evitar os efeitos do
chamado "mal de altitude", mal-estar comum nas cidades andinas, por causa do ar rarefeito.
Apoio reiterado
Apesar dos dados que indicam
um crescimento acentuado nas
plantações ilegais de coca no país,
a ONU e o governo dos EUA, os
dois principais incentivadores do
Plano Dignidade, continuam reafirmando seu apoio a ele.
Fontes da embaixada americana em La Paz disseram à Folha
que o fato de a promessa de zerar
os cultivos ilegais não ter sido
cumprida não alterou a posição
do governo dos EUA sobre o plano. "O Plano Dignidade teve muito sucesso e cumpriu com seus
objetivos em grande medida",
disse um membro da missão diplomática americana no país.
Um representante da UNDCP
(Programa das Nações Unidas
para o Controle Internacional de
Drogas), que pediu para não ser
identificado, admitiu que o levantamento sobre cultivos realizado
pela entidade, a ser divulgado em
janeiro, também mostra um importante crescimento das plantações. Ele disse, porém, que a ONU
continua considerando o Plano
Dignidade um sucesso e um
exemplo a ser seguido.
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