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New York Times

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Inteligência/Kostas G. Tsapogas

Grécia vive atoleiro político

Crise é perpetuada por políticos que são imunes a ela

ATENAS

Giannis e sua mulher evitam a fila e entram pela porta dos fundos. A senhora que dirige o "sopão" concordou em lhes poupar o embaraço de esperar, como centenas de outras pessoas, pelos pratos de comida que eram distribuídos. Até dois anos atrás, afinal, a senhora trabalhava como secretária de Giannis.

Em 2011, Giannis (nome fictício) era um executivo de alto nível que trabalhava em uma grande companhia e ganhava 10 mil euros por mês. Quando a crise financeira atingiu a Grécia, ele não se preocupou. "Só precisamos ser mais fortes e nos livrarmos desse governo. As coisas voltarão a ser como antes", pensava. Como muitos gregos, ele sentia que as dificuldades que a sociedade grega enfrentava eram consequência de um governo lacaio e traidor, que cedia às odiosas exigências de governos estrangeiros, especialmente o da Alemanha, e permitia que o Fundo Monetário Internacional impusesse suas políticas catastróficas a um membro da zona do euro.

Desempregado há dois anos, Giannis recusou ofertas de trabalho por um décimo de seu salário anterior porque não queria "se prostituir". Ele acredita que os gregos devem resistir a uma tentativa organizada de transformar seu país em um repositório de trabalhadores mal remunerados. Ainda está convencido de que a situação na Grécia é imposta de fora, agravada por um sistema político incompetente, corrupto e servil a seus patrões e seus "clientes". Embora muitos gregos concordem com isso e a maioria esteja decepcionada com a política, podem discordar sobre duas questões: a definição desse sistema político e quem são seus "clientes".

Para Giannis e seus amigos, que costumam se encontrar em uma pequena livraria em um bairro central de Atenas, o "sistema político" é formado pelos dois partidos que governaram a Grécia nas últimas quatro décadas, desde a queda da ditadura em 1974.

Como muitos outros gregos de tendência esquerdista, Giannis acha que hoje existe a oportunidade de criar um Estado socialista há muito desejado. Essas pessoas acreditam que a crise oferece uma oportunidade de derrubar o sistema capitalista -ou pelo menos partes dele.

Outros gregos não vão tão longe. Concordam que os partidos políticos que governaram o país chegaram ao fim de sua vida natural. Pensam que um dos partidos de oposição existentes, como o Syrizia, de esquerda, deve subir ao poder e esperam que um novo partido, não manchado e carregado de ligações com o passado, surgirá para dar voz à parte crescente da sociedade grega decepcionada com as opções que lhe são oferecidas. Mas não há sinal de que tal partido esteja surgindo.

Depois de seis anos em recessão, ainda há uma parte significativa da sociedade grega, principalmente a que goza dos privilégios do setor público, que odeia mudanças, resiste a reformas e tenta preservar sua relativa imunidade à crise atual. Para outra parte da sociedade, a reforma é mais que bem-vinda. O que se busca, porém, não são as medidas esporádicas impostas pela "troica" do FMI, Banco Central Europeu e União Europeia, mas decisões mais radicais que modifiquem o sistema político. Essa pressão por mudanças tectônicas cria resistência a qualquer movimento.

Reforma, argumentam alguns gregos, não é apenas privatizar algumas empresas públicas, abrir as profissões à concorrência, remover regulamentos protecionistas, combater a corrupção e eliminar os monopólios profissionais. O que é realmente necessário, afirmam, é um novo paradigma, uma inversão da bolha populista que se seguiu à queda da ditadura em 1974 e gradualmente levou ao atual Estado paternalista, que cuida de seus clientes em troca de votos, emprestando no exterior para sustentar um relacionamento simbiótico corrupto. Eles anseiam por um sistema político que não seja ao mesmo tempo mentor e refém dos vários "exércitos de ocupação interna", na maioria sindicatos do setor público ou organizações profissionais que agarram o que podem.

Esse é um sistema político que não existe hoje na Grécia.

A última tentativa atrasada e tímida do governo de mostrar que é capaz de desfazer alguns danos que seus partidos políticos causaram foi o recente fechamento da emissora estatal ERT. Essa iniciativa corre o risco de dar em nada, pois o governo julgou mal o apoio que teria. O resultado é que uma ação destinada a mostrar decisão aos credores internacionais da Grécia pode na verdade revelar a impotência do governo.

Um número crescente de gregos, na maioria de classe média e trabalhadores do setor privado, prefere um progresso gradual. Eles são menos agressivos que aqueles que tentam salvar seus privilégios, menos visíveis porque não têm uma verdadeira representação. Muitos desse grupo uniram-se à enxurrada de gregos, em geral instruídos, que está deixando o país para trabalhar no exterior. Mas os que ficam estão aos poucos conquistando massa crítica. Se isso acontecer, e suas vozes forem ouvidas, poderão arrancar a Grécia do pântano em que esteve atolada nos últimos seis anos.


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