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New York Times

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Indústria de vestuário controla Bangladesh

Por JIM YARDLEY

DACCA, Bangladesh - Em meio ao barulho das buzinas no congestionado coração desta superlotada capital, um prédio de escritórios, de vidro, destaca-se por estar sozinho, cercado de água e acessível por uma pequena ponte. Ele é o símbolo do poder da indústria do vestuário em Bangladesh: a sede da mais poderosa associação industrial do país. E é também ilegal.

Assim determinou a Alta Corte de Bangladesh, concluindo que o terreno havia sido adquirido irregularmente, que o edifício havia sido erguido sem os alvarás necessários e que sua localização ameaçava uma rede de lagos que forma o sistema natural de drenagem da capital.

A Alta Corte qualificou o prédio como "um golpe de proporções abismais" e deu 90 dias para que ele fosse demolido.

Isso foi há dois anos. O prédio continua de pé. O caso está agora em um limbo judicial -mais uma prova, segundo críticos, do poder da Associação dos Industriais e Exportadores de Vestuário de Bangladesh. Seus membros controlam o motor da economia nacional -as exportações de roupas para os Estados Unidos e a Europa. Muitos estão no Parlamento ou são donos de jornais e canais de TV.

Nestas duas décadas desde que Bangladesh se tornou uma potência global do vestuário, hoje só atrás da China como exportador de roupas, a associação industrial muitas vezes mais parece um ministério do governo.

A BGMEA, como é conhecida a entidade, ajuda a regulamentar e a administrar as exportações, e seus líderes participam de importantes comissões governamentais.

Mas o desabamento, em abril, do edifício fabril Rana Plaza, que matou mais de 1.100 pessoas, colocou sob escrutínio toda a cadeia global de suprimento que leva as roupas das fábricas bengalesas para os consumidores ocidentais. O órgão setorial, na opinião dos críticos, constitui um grave conflito de interesses no centro dos problemas bengaleses.

"Não se pode colocar a raposa para tomar conta das galinhas", disse a advogada ambientalista Rizwana Hassan.

"A BGMEA não tem autoridade regulatória. É um clube do setor de vestuário."

Bangladesh está trabalhando para restaurar a credibilidade do setor do vestuário depois que o governo Obama suspendeu preferências comerciais especiais para o país. A União Europeia também está cogitando penalidades. Bangladesh reagiu aprovando novas leis trabalhistas e prometendo inspecionar as 5.000 fábricas de roupas do país.

Mas a entidade setorial fez valer sua influência, e o Parlamento emendou as leis trabalhistas. Restrições à organização sindical foram atenuadas, mas não chegaram nem perto de serem totalmente suspensas. A lei exige que 30% dos operários fabris assinem petições para formar um sindicato, um obstáculo notável, já que muitas fábricas têm milhares de empregados e poucos lugares para que eles se reúnam e se organizem.

"Bangladesh teve uma oportunidade de ouro", disse o sindicalista Roy Ramseh Chandra, para quem a influência política dos donos de fábricas diluiu algumas das emendas. "Os empregadores têm uma influência enorme."

O governo bengalês é notoriamente corrupto e tem capacidade burocrática limitada. Nesse ambiente, o grupo se tornou uma força estabilizadora numa fase em que o comércio global cresceu rapidamente. Hoje, a entidade praticamente controla as exportações.

A saúde do setor do vestuário costuma ser vista como uma questão de segurança nacional, já que essa rubrica responde por 80% das exportações industriais de Bangladesh. É a associação setorial que mantém a ordem nas operações cotidianas do setor, segundo proprietários.

"Do contrário, haveria caos", disse Annisul Huq, ex-presidente da BGMEA.

Uma improvável crítica da associação é Rubana Huq, mulher de Annisul, que hoje dirige o Mohammadi Group, conglomerado familiar do setor do vestuário. Ela disse que a indústria do vestuário em Bangladesh precisa ser regulamentada por um árbitro transparente e independente. "É claro que há um conflito de interesses", afirmou.

Críticos apontam para o edifício-sede da entidade setorial como um símbolo do seu status protegido e privilegiado.

"Ele não é ilegal", disse Annisul Huq. "Solicitamos o terreno ao governo. O governo nos deu o terreno. Dois primeiros-ministros o inauguraram. Que validação você quer?"

Por enquanto, o caso do prédio está parado. O governo demonstra pouco interesse em confrontar o mais poderoso bloco industrial do país.

"Foi para a Suprema Corte", disse Huq. "Isso pode demorar para sempre. É Bangladesh. Temos total confiança -desde que eles deem um veredicto a nosso favor". Ele está brincando, até certo ponto.

Colaborou Julfikar Ali Manik


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