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OPÇÃO RELIGIOSA
Os movimentos de homossexuais têm pressionado para
que legislações nacionais reconheçam, senão o casamento entre pessoas do mesmo sexo, ao menos contratos de união civil. Gays tentam
também cruzar "a última fronteira",
que é a ordenação de sacerdotes assumidamente homossexuais.
Como a ações costumam corresponder reações, religiosos se insurgem contra as mudanças. A recente
nomeação de um bispo gay na Igreja
Episcopal dos Estados Unidos poderá resultar num cisma entre os anglicanos. Também a Igreja Católica divulgou há pouco um documento em
que condena com veemência os projetos de reconhecimento legal de
uniões homossexuais.
O diálogo entre movimentos homossexuais e religiosos tende a ser
difícil. A razão para a incomunicabilidade é que, enquanto gays raciocinam dentro de uma lógica terrena,
segundo a qual tudo muda -e de
preferência para melhor, para a plena igualdade-, a religião, particularmente a Igreja Católica, trabalha
com a idéia de permanência, de
transcendência.
Sem compreender que o Vaticano
pretende defender uma moral incondicionada, ou seja, com valores éticos estabelecidos diretamente por
Deus, que não podem, portanto, ser
relaxados ou "negociados", muito
do que Roma diz em matéria de sexualidade ou costumes não parecerá
mais do que um tolo exercício de
obstinação. A verdade, porém, é que,
na economia interna da Igreja, o que
pode parecer um detalhe, como a
não-aceitação de métodos contraceptivos, adquire a dimensão de dogma. E dogmas não podem ser derrubados impunemente. O risco é que,
com eles, caia também o edifício lógico sobre o qual se assenta a própria
Igreja.
É claro que, na prática, as coisas
não são assim tão drásticas. Mesmo
o Vaticano já passou por mudanças
sensíveis. Com um pouco da boa casuística que notabilizou os jesuítas,
pode-se caminhar em várias novas
direções. Esse, no entanto, é um processo que, quando ocorre, se dá no
tempo da Igreja, que é o dos séculos
dos séculos, e não no das pessoas.
O Vaticano e a maioria das religiões
monoteístas, com base nas próprias
Escrituras, passaram tempo demais
afirmando que o homossexualismo
era um pecado, que contrariava Deus
e a natureza, e deveria ser punido.
Sob essa ótica, o catecismo 2.358,
que manda que os homossexuais
não sejam discriminados, pode ser
considerado um avanço.
Compreender a posição da Igreja
Católica, que é apenas a mais paradigmática entre as de religiões monoteístas, não significa que se deva
partilhá-la ou aceitá-la. Na lógica do
Estado, não entram dogmas religiosos. Para o Estado, o direito não é natural, mas positivo. O terreno ganha
preponderância sobre o divino.
Direitos de gays podem e devem ser
afirmados, porque o homossexual
não é fundamentalmente diferente
do heterossexual e, ao Estado, não
interessam preferências sexuais. O
católico segue livre para exercer seu
catolicismo, e os que não quiserem
ouvir os ensinamentos de Roma podem seguir outros caminhos.
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