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BRASIL E VENEZUELA
Recebeu críticas da oposição
venezuelana a passagem de
Marco Aurélio Garcia -enviado especial do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva- por aquele país.
Alguns líderes do movimento que
pressiona pela saída de Hugo Chávez
do poder qualificaram o envio de gasolina brasileira -a fim de combater
o desabastecimento causado pela paralisação prolongada na estatal petrolífera venezuelana- de perpetrar
uma "intromissão indevida nos assuntos internos do país".
A greve na produção de combustível tem sido um dos principais instrumentos da oposição para manter
a pressão sobre Hugo Chávez. É
compreensível que a frente oposicionista se sinta frustrada com o envio
do navio-tanque da Petrobras. A decisão do governo brasileiro -que
atende, ao que consta, a uma convergência de opiniões entre Lula e
FHC-, no entanto, não deve ser
analisada apenas à luz dos interesses
dos que se antepõem a Chávez.
Não é desejável que a diplomacia
brasileira atue na Venezuela ou em
qualquer outro país de modo a favorecer esta ou aquela facção política. A
oposição venezuelana por vezes quer
fazer crer que prevalece no país a indefinição institucional. Mas ocorre
que Hugo Chávez, com todas as suas
debilidades políticas e administrativas, ainda é o presidente legítimo da
Venezuela, eleito democraticamente.
O diálogo entre FHC -e, a partir
de janeiro, entre Lula- e Chávez é,
portanto, também um diálogo entre
chefes de Estado. Seria deselegante o
Brasil deixar de atender a um pedido
de auxílio do governo da Venezuela,
ainda mais quando se levam em conta os efeitos potenciais do desabastecimento prolongado de combustível
numa sociedade já marcada por profunda rivalidade entre ricos e pobres.
Outro argumento a favor da ajuda
brasileira é a existência de um precedente de auxílio entre os dois países
justamente na questão do petróleo.
O embaixador Rubens Ricupero, secretário-geral da Unctad, relata que,
em 1979 (segundo choque do petróleo), a Venezuela foi o único país que
atendeu a um pedido emergencial do
governo do Brasil, que tinha sérias
dificuldades para encontrar outros
fornecedores. O país vizinho garantiu o abastecimento do mercado brasileiro durante alguns meses.
A melhor maneira de o futuro governo Lula evitar os riscos de uma
atuação partidária na Venezuela é estabelecer-se como um mediador, em
harmonia com a Organização dos
Estados Americanos, para a retomada do diálogo entre o chavismo e
seus opositores visando a uma saída
negociada, pacífica e institucional
para o impasse venezuelano.
O envio de gasolina brasileira não
representa "intromissão" partidária
em assuntos internos da Venezuela.
Mas Lula e seus assessores devem ter
claro que o ato contrariou a oposição
a Chávez e que, agora, o Brasil precisa trabalhar para não perder a confiança desse importante setor da sociedade venezuelana. A consolidação
da imagem internacional de Lula como um aliado incondicional de líderes como Hugo Chávez e Fidel Castro também dificultaria muito a política externa brasileira. Nesse terreno,
princípios e linhas de força sempre
devem ser temperados com uma boa
dose de pragmatismo.
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