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"Rádio
Espaço Livre: só não ouve quem não vive." Nome e slogan não
poderiam ser melhores. Até porque nenhum ouvinte está em liberdade.
Primeira rádio a funcionar em uma
prisão no país, segundo o governo paulista, desde setembro
a Espaço Livre anima os almoços de quarta e quinta-feira das
680 detentas da Penitenciária Feminina, em São Paulo.
A rádio é comandada por 11 presas,
que aprenderam a operar o equipamento, a produzir reportagens
e a fazer a locução com estudantes de jornalismo da Universidade
Metodista.
A cada edição, duas se revezam na
locução e duas na mesa de som. Uma é responsável por colocar
a rádio no ar e as demais vão atrás de reportagens pensadas
nas reuniões que ocorrem toda sexta-feira. Os programas, de
45 minutos, são finalizados apenas duas horas antes de começarem,
uma vez por semana. No dia 14 de dezembro, a Folha acompanhou
a gravação.
Eram 10h03 quando o slogan deu partida
ao programa. Um grupo de 10 pessoas, entre detentas e estudantes,
se espremia em uma salinha sob o olhar de um Jesus Cristo
crucificado. Uma das locutoras, Priscila Fernandes de Oliveira,
22, chama a primeira reportagem, sobre prevenção da tuberculose,
e a escuta atentamente. Condenada a 12 anos por tráfico e
formação de quadrilha, ela sabe que, quanto mais informação
tiver, mais fácil será sua sobrevivência. "Aqui a gente tem
de ficar esperta para não ficar doente.
" Entre uma reportagem e outra, música.
Quem inaugura a seção é Zeca Pagodinho. No começo da rádio,
lembram as presas, as ouvintes queriam que a programação fosse
apenas musical. Até que se acostumaram com a proposta e hoje
ficam atentas às dicas dos departamentos de saúde e jurídico.
Mas o grande sucesso está por vir:
o horóscopo. Bastam os signos serem anunciados para o silêncio
se instalar no refeitório (onde ficam as duas caixas de som),
conta Karla Meneses, 35, condenada por seqüestro.
A diretora da penitenciária, Maria
Risola Dias diz que, no início, ficou com medo de autorizar
a rádio. Mas agora a recomenda para outros presídios. "O comportamento
das detentas mudou: estão mais disciplinadas", afirma.
Oito estudantes da Metodista participam
do projeto, um trabalho de conclusão de curso. Para viabilizá-lo,
gastaram R$ 5 mil na compra do equipamento, doado às presas.
"Não tivemos problema nenhum com as detentas", diz Fernanda
Vergueiro, 23. "No começo a gente não entendia as gírias mas,
em pouco tempo, nos entrosamos."
Os alunos continuarão ajudando as
presas na rádio por mais seis meses e, a partir daí, esperam
que estejam seguras para tocá-la sozinhas.
DANIELA TÓFOLI
da Folha de S.Paulo
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