18/05/2007
Carta da semana
Malabaristas invisíveis
“Passando pelo cruzamento entre
as ruas Bahia e Gonçalves Dias uma cena me chamou atenção.
Dois garotos faziam malabares. Cena comum nas ruas de Belo
Horizonte, e certamente nas grandes capitais do país.
Mas, aquilo tinha algo diferente. Impressionou-me a habilidade
dos dois garotos, um talvez com idade entre 14 e 16 anos,
o outro não passava dos doze. Pareciam estar num picadeiro.
O figurino era bastante simples. Apenas
o rosto pintado. Usavam camisas já desbotadas, não
dava nem para ler o nome do candidato. Os pés estavam
descalços.
A cada vez que o sinal fechava, rapidamente
se preparavam para o início do espetáculo. Sinal
vermelho, e pronto, numa fração de segundos
o garoto menor pula no ombro do maior e de pé começa
a brincar com duas lanças ateando fogo nas extremidades.
Não sei se caberia a palavra brincar, embora garotos,
conheciam a necessidade e responsabilidade de representar
ali. Com um grito iniciam a apresentação: Atenção!
Era como se estivessem dizendo: Senhoras e senhores o espetáculo
já vai começar!
A apresentação é
rápida, não passa de 60 segundos. Como se possuíssem
um cronômetro, calculam perfeitamente o tempo da apresentação
e o tempo que têm para cobrarem o ingresso dos espectadores.
Estes parecem não gostar muito, se recusam a abrir
as janelas de seus carros, nem ao menos aplaudem. Alguns pagam,
poucos na verdade, o ingresso não tem valor estipulado.
O sinal abre e os dois artistas saem de cena para dar passagem
à platéia.
Ofegantes pelo esforço praticado
aguardam por alguns minutos até a próxima sessão.
Novamente o sinal fecha, e tudo se repete. Os espectadores
parecem serem os mesmos. Não consigo entender, nenhum
aplauso, nenhuma manifestação, afinal de contas
estamos diante de dois artistas. Me pergunto se os garotos
são invisíveis. Talvez ganhassem notoriedade
e reconhecimento nas páginas policiais.
Não me contenho. Caminho em
direção aos dois garotos. Pergunto ao mais velho
seu nome, com um sorriso largo no rosto me responde: Wesley.
O outro, meio desconfiado, fica olhando de longe. Então
pergunto novamente a Wesley o nome do seu parceiro, mais uma
vez sorrindo responde: Rafael. Pergunto se ficam ali todos
os dias, ele responde que sim. Gostaria tanto de perguntar
outras coisas, mas percebo que é chegada a hora da
próxima apresentação.
Já não me restam dúvidas.
Eles não são invisíveis, falta somente
que tenhamos vontade de enxergá-los."
Luana Diana dos Santos, Belo
Horizonte (MG) - luanatolentino@yahoo.com.br
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