Grandes
grupos investem em novas tecnologias de edificação
e elevam salários de engenheiros para driblar gargalos
no setor
Falta de mão-de-obra leva
empresas a investir em treinamento; incorporadoras fazem estoque
de material de construção, o que eleva preço
O engenheiro João Cláudio Robusti é dono
de uma construtora e, desde agosto de 2006, enfrenta atrasos
em suas obras devido à falta de equipamentos no mercado.
Agora, ele está na fila de espera por máquinas
e até materiais de construção.
Presidente do SindusCon/SP (Sindicato da Indústria
da Construção Civil do Estado de São
Paulo), Robusti se juntou a um grupo de empresários
para evitar o que muitos temem: um apagão logístico
na construção civil de São Paulo.
Para o presidente da Abef (Associação Brasileira
de Empresas de Engenharia de Fundações e Geotecnia),
José Luiz Saes, haverá falta de equipamentos,
como guindastes, perfuradores e guinchos até, pelo
menos, o final de 2008.
"Não conseguiremos trazê-los antes disso",
afirma Saes. Segundo ele, os fabricantes nacionais de hélice
contínua, por exemplo, não conseguirão
turbinar a produção a tempo. As hélices
contínuas servem para perfurar o solo lançando
as bases de fundação.
"A importação também demoraria demais
e cada unidade custa US$ 1,5 milhão", diz Saes.
"O setor não tem como investir sem garantias de
que esse crescimento da construção civil atual
será sustentável."
Há cerca de dez dias, uma missão do SindusCon
foi à China para tentar viabilizar a importação
de maquinário. Os chineses conseguem fabricar os equipamentos
em três meses, mas, segundo as construtoras, haveria
demora no transporte e no desembaraço das mercadorias
nos portos.
Outra incerteza é quanto ao fornecimento de materiais
de construção. Um estudo feito pela Abramat
(Associação Brasileira das Indústrias
de Materiais de Construção) em parceria com
a FGV (Fundação Getulio Vargas) mostra que o
PIB da cadeia de construção crescerá,
no mínimo, 10,2% em 2008, contra 4,8% do PIB nacional.
Se a previsão se confirmar, os riscos de escassez serão
maiores. Segundo Robusti, ainda que as fábricas produzam
no máximo de sua capacidade (hoje elas operam com 20%
de ociosidade), a distribuição ficará
comprometida. "Não há como entregar as
mercadorias. As montadoras têm fila de espera para a
compra de caminhões."
Diante desse cenário, as incorporadoras começaram
a fazer estoque e isso já pode estar pressionando os
preços. "Estamos fidelizando fornecedores e antecipando
contratos", afirma Sílvio Chaimovitz, diretor
da Klabin Segall.
O mercado já se ressente dessa prática. A Tecnisa
diz que paga R$ 270 pelo metro cúbico de estruturas
de concreto, contra os R$ 185 desembolsados no final de 2006
para fazer lajes e vigas -aumento acima de 45%.
Esse é só um detalhe da elevação
de preços da construção registrada pela
FGV. De acordo com o professor Salomão Quadros, o índice
teve variação de 7,55% em setembro em São
Paulo. "A falta de cimento foi determinante."
Toma lá, dá cá
A falta de mão-de-obra qualificada é outro gargalo
do setor. Como o número de profissionais caiu pela
metade na última década, as grandes construtoras
começaram a tomar funcionários de suas concorrentes.
De acordo com André Denoni, coordenador de obras da
MAC, a construtora já perdeu até pedreiros.
"É uma surpresa porque esses profissionais são
recrutados por empresas especializadas. É um sinal
de que não há mais garantia", afirma.
Para alimentar essa "dança de cadeiras",
as ofertas salariais foram infladas. Na Gafisa, há
engenheiros que mudaram de emprego para ganhar 70% a mais.
A Tecnisa paga até R$ 15 mil por um engenheiro residente,
quase 80% a mais do que eles ganhariam no ano passado.
Para evitar complicações ainda maiores em 2009,
essas companhias firmaram um acordo para treinar profissionais
em cursos técnicos que duram de seis meses a dois anos.
As primeiras turmas de pedreiros e ajudantes estarão
prontas no final de 2008.
Para tentar escapar dessa armadilha, as construtoras também
estão adotando novas tecnologias de edificação.
Trocando as paredes de tijolos pelas de concreto, elas conseguirão
erguer um andar de um prédio em uma semana com 70%
dos trabalhadores. Pelo sistema tradicional, levariam um mês.
O que preocupa a concorrência é que essas companhias
querem ter exclusividade dos poucos fornecedores existentes.
"Neste momento, há sinais claros de concentração
em São Paulo", afirma Walter Frigieri, diretor
da ABCP (Associação Brasileira de Cimento Portland).
"Nesse ritmo, quem pagará a conta serão
as pequenas e médias construtoras."
Julio Wizack
Folha de S.Paulo
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