Há
formados em Licenciatura para suprir demanda, mas eles optam
por outros empregos
Mais de 70% dos formados em Licenciatura no País não
trabalham como professores nas escolas brasileiras. Estudo
inédito feito pelo Ministério da Educação
(MEC) mostra que, com exceção das áreas
de física e química, existem mais licenciados
do que a demanda para dar aulas em todas as salas de 5ª
a 8ª série e do ensino médio.
Cerca de 1,2 milhão se graduaram como potenciais professores
nos últimos 25 anos e o crescimento nesse contingente
desde 2001 foi de 66%. Mas eles não querem ir para
as salas de aula.
A valorização da profissão, que comemora
hoje seu dia, minguou com a expansão de estudantes
nas escolas públicas brasileiras na última década.
Em julho, o Conselho Nacional de Educação (CNE)
chegou a divulgar um estudo que falava em “apagão”
de professores, já que o País teria uma déficit
de 246 mil profissionais.
A pesquisa do MEC, agora, mostra números diferentes.
A demanda para cobrir todas as escolas de 5ª série
ao ensino médio do Brasil é de 725.991 docentes
e há 1,4 milhão em exercício. “Havia
incorreções no estudo do CNE, não faltam
professores e sim faltam professores licenciados para as áreas
específicas”, diz o diretor do Instituto Nacional
de Pesquisas e Estudos Educacionais do MEC (Inep), Dilvo Ristoff.
Ou seja, há profissionais formados em outras áreas
ou mesmo professores de disciplinas diferentes dando aulas
nas salas que estariam abandonadas. Em Física e Química
existem, respectivamente, 6 mil e 8 mil professores licenciados,
mas são cerca de 60 mil trabalhando em cada uma das
áreas. Portanto, cerca de 90% de quem ensina essas
disciplinas não tem a formação adequada
para isso.
“O profissional de física contraria a lei da
oferta e da procura. Somos poucos, mas continuamos ganhando
mal”, diz o professor das redes estadual e municipal
de São Paulo, Tomé Ferraz, de 49 anos. Ele dá
365 aulas por mês - pela manhã, à tarde
e à noite - e recebe cerca de R$ 3 mil. Se esforça
ainda para concluir um mestrado na Pontifícia Universidade
Católica (PUC-SP) sobre história da ciência.
“Tenho o sonho de um dia sobreviver dignamente da minha
profissão.”
Respeito
Em Educação Física só 32 mil dos
63 mil que dão aulas fizeram Licenciatura na área.
Mesmo assim, há um total de 195 mil formados nos últimos
anos trabalhando longe do ensino básico. Rogério
Rabello, de 30 anos, terminou a graduação em
Educação Física, com licenciatura e bacharelado,
em 2003, e nunca deu aulas em escolas. “A responsabilidade
em trabalhar com crianças é muito grande e a
remuneração é baixa”, diz ele,
que atua como personal trainner. “Além disso,
na academia somos mais respeitados.”
O trabalho de professor para profissionais com nível
superior é permitido por uma resolução
do CNE, de 1997. Eles devem participar de programas especiais
de formação pedagógica para atuar em
escolas.
Mas há ainda professores de áreas próximas
que quebram galhos. André Luiz Avanci da Rocha tem
licenciatura em Química, mas já deu aulas de
Física no início da carreira por falta de professor.
“Você não se aprofunda muito nos assuntos
e tem dificuldade para responder as perguntas dos alunos”,
conta.
Fracasso
“As pessoas não querem mesmo trabalhar
em um lugar que é um fracasso”, diz a secretária
de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar.
Para ela, a valorização do professor depende
da maior qualificação da escola, o que, segundo
ela, é o foco do Plano de Desenvolvimento da Educação
(PDE), lançado pelo governo neste ano.
O diretor executivo do movimento Todos pela Educação
e também um dos responsáveis pelo estudo do
CNE, Mozart Neves, diz que, apesar dos novos números
do MEC, não se pode dizer que não haja falta
de professores no Brasil. “Pode ser que o déficit
de 246 mil tenha sido superestimado, mas está claro
nas escolas que não há professor suficiente”,
afirma.
“Temos notícias freqüentes de que alunos
de ensino médio ficam sem aulas em São Paulo”,
completa a professora da pós-graduação
em psicologia da educação da PUC-SP, Maria Regina
Maluf. A Secretaria de Estado da Educação informou,
por meio de nota, que não há falta de professores
na rede pública estadual.
Renata Cafardo
O Estado de S.Paulo.
|