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Em 99, argentinos "ignoraram" Lula
MARCELO BILLI
DE BUENOS AIRES
O presidente eleito Luiz Inácio
Lula da Silva começa hoje sua segunda visita à Argentina, a primeira viagem internacional depois de eleito. Será uma viagem
muito diferente da primeira, em
agosto de 1999. Naquele ano, os
mesmos governantes que amanhã receberão Lula entusiasmados recusaram ou simplesmente
ignoraram o convite para se reunir com o então candidato derrotado nas eleições de 1998.
Lula viajou a Buenos Aires a
convite do Instituto de Estudos
Brasileiros. O diretor do instituto,
Alberto Etcheberry, convidou
praticamente todas as autoridades e políticos importantes do
país, inclusive o atual presidente,
Eduardo Duhalde, então candidato à presidência que seria derrotado por Fernando de la Rúa.
O chanceler Carlos Ruckauf, então governador da Província de
Buenos Aires, também não se interessou em conhecer Lula. O
mesmo Ruckauf, na semana passada, afirmava que "as portas do
mundo poderão se abrir ao Mercosul graças à vocação para a
união aduaneira que demonstra o
presidente eleito do Brasil".
Dos candidatos à Presidência
argentina, apenas Fernando de la
Rúa, que ganhou as eleições, se
encontrou com Lula. O ex-presidente Raúl Alfonsín (1983-1989),
membro da UCR (União Cívica
Radical), mesmo partido de De la
Rúa, também foi ao encontro.
Outro anfitrião do presidente
eleito foi o sindicalista Víctor de
Gennaro, atual secretário-geral da
CTA (Central dos Trabalhadores
Argentinos).
"Poucos se interessavam em receber o que chamavam de "morto
político". Eu respondia que François Mitterrand também perdera
três eleições e que Lula chegaria à
Presidência. Claro que era uma
brincadeira, mas não deixa de ser
curioso ver o que está acontecendo agora", diz Etcheberry.
O próprio reitor da Universidade Nacional de San Martín -cidade da Grande Buenos Aires- à
qual o Instituto de Estudos Brasileiros estava vinculado na época,
deixou de ir à conferência da qual
Lula participou na universidade.
"Encaravam a visita mais como
uma excentricidade da minha
parte do que qualquer outra coisa", afirma o diretor.
Os grandes empresários argentinos, que agora vêem como positiva a vitória de Lula e sua preferência por fortalecer o Mercosul,
também não o ouviram em 1999.
Naquele ano, a platéia de Lula era
de pequenos e médios empresários, estudantes, pesquisadores e
sindicalistas.
O presidente eleito visitou, durante sua passagem pela Grande
Buenos Aires, as áreas mais pobres da região. Conheceu a Fundação Mama -uma instituição
que abriga crianças e jovens carentes- e restaurantes populares, conhecidos na Argentina como comedores e que se multiplicaram depois do agravamento da
crise que fez a economia argentina encolher mais de 20%.
Lula chegou na Argentina em
um momento delicado. O Brasil
havia abandonado o regime de
câmbio controlado e a moeda
brasileira havia se desvalorizado.
O impacto da desvalorização já se
fazia sentir pelos exportadores argentinos, que vendiam cada vez
menos ao Brasil. Não eram poucos os argentinos que culpavam a
mudança de política econômica
brasileira pela recessão pela qual
passava o país.
Depois de 1999, seguiram-se outros três anos de recessão. Como
presidente eleito, Lula visita uma
Argentina que passa pela pior crise econômica de sua história e
que, como diz o chanceler Ruckauf, espera que o Brasil possa
ajudar a "abrir as portas do mundo ao Mercosul".
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