São Paulo, domingo, 01 de dezembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Em 99, argentinos "ignoraram" Lula

MARCELO BILLI
DE BUENOS AIRES

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva começa hoje sua segunda visita à Argentina, a primeira viagem internacional depois de eleito. Será uma viagem muito diferente da primeira, em agosto de 1999. Naquele ano, os mesmos governantes que amanhã receberão Lula entusiasmados recusaram ou simplesmente ignoraram o convite para se reunir com o então candidato derrotado nas eleições de 1998.
Lula viajou a Buenos Aires a convite do Instituto de Estudos Brasileiros. O diretor do instituto, Alberto Etcheberry, convidou praticamente todas as autoridades e políticos importantes do país, inclusive o atual presidente, Eduardo Duhalde, então candidato à presidência que seria derrotado por Fernando de la Rúa.
O chanceler Carlos Ruckauf, então governador da Província de Buenos Aires, também não se interessou em conhecer Lula. O mesmo Ruckauf, na semana passada, afirmava que "as portas do mundo poderão se abrir ao Mercosul graças à vocação para a união aduaneira que demonstra o presidente eleito do Brasil".
Dos candidatos à Presidência argentina, apenas Fernando de la Rúa, que ganhou as eleições, se encontrou com Lula. O ex-presidente Raúl Alfonsín (1983-1989), membro da UCR (União Cívica Radical), mesmo partido de De la Rúa, também foi ao encontro. Outro anfitrião do presidente eleito foi o sindicalista Víctor de Gennaro, atual secretário-geral da CTA (Central dos Trabalhadores Argentinos).
"Poucos se interessavam em receber o que chamavam de "morto político". Eu respondia que François Mitterrand também perdera três eleições e que Lula chegaria à Presidência. Claro que era uma brincadeira, mas não deixa de ser curioso ver o que está acontecendo agora", diz Etcheberry.
O próprio reitor da Universidade Nacional de San Martín -cidade da Grande Buenos Aires- à qual o Instituto de Estudos Brasileiros estava vinculado na época, deixou de ir à conferência da qual Lula participou na universidade. "Encaravam a visita mais como uma excentricidade da minha parte do que qualquer outra coisa", afirma o diretor.
Os grandes empresários argentinos, que agora vêem como positiva a vitória de Lula e sua preferência por fortalecer o Mercosul, também não o ouviram em 1999. Naquele ano, a platéia de Lula era de pequenos e médios empresários, estudantes, pesquisadores e sindicalistas.
O presidente eleito visitou, durante sua passagem pela Grande Buenos Aires, as áreas mais pobres da região. Conheceu a Fundação Mama -uma instituição que abriga crianças e jovens carentes- e restaurantes populares, conhecidos na Argentina como comedores e que se multiplicaram depois do agravamento da crise que fez a economia argentina encolher mais de 20%.
Lula chegou na Argentina em um momento delicado. O Brasil havia abandonado o regime de câmbio controlado e a moeda brasileira havia se desvalorizado. O impacto da desvalorização já se fazia sentir pelos exportadores argentinos, que vendiam cada vez menos ao Brasil. Não eram poucos os argentinos que culpavam a mudança de política econômica brasileira pela recessão pela qual passava o país.
Depois de 1999, seguiram-se outros três anos de recessão. Como presidente eleito, Lula visita uma Argentina que passa pela pior crise econômica de sua história e que, como diz o chanceler Ruckauf, espera que o Brasil possa ajudar a "abrir as portas do mundo ao Mercosul".



Texto Anterior: "Petista é referência para argentinos"
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.