|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JUDICIÁRIO
Nilson Naves diz ser contrário a projeto que proíbe parentes de ministros de tribunais atuarem como advogados junto a órgãos
Presidente do STJ defende atuação de parentes
DA REPORTAGEM LOCAL
O presidente do STJ (Superior
Tribunal de Justiça), Nilson Naves, 62, que tem dois filhos advogando no tribunal, não vê constrangimentos na atuação de advogados parentes dos ministros. Ele
é contrário ao projeto que veda a
prática e só admite a possibilidade
de introduzir outras "restrições".
A seguir, a entrevista concedida
à Folha por escrito.
(RV e JD)
Folha - O sr. é favorável ao projeto de lei nº 3.881/2000, em tramitação no Congresso, pelo qual fica
proibida a atuação de advogado
"cônjuge, companheiro ou parente, em linha reta, colateral ou afim,
até o terceiro grau inclusive, de
membro do tribunal, junto ao respectivo órgão judiciário"?
Nilson Naves - O instituto dos
impedimentos e suspeições já resolve todas as questões de incompatibilidade. Agora, se o que se
pretende com o projeto de lei é
restringir o exercício da profissão,
tudo indica que sim, então o que
se há de fazer com o preceito
constitucional que garante o livre
exercício de qualquer trabalho,
ofício ou profissão? E o pior é o
disposto na Constituição (direitos
e garantias individuais).
Talvez fosse melhor o estabelecimento de restrições tais como
existem, por exemplo, na Suprema Corte dos Estados Unidos,
bem como no Conselho de Estado
e na Corte de Cassação da França.
No exemplo americano, exige-se
que se prove a experiência de três
anos de prática forense em uma
corte estadual superior. Na França, para atuar perante os órgãos
mencionados, o bacharel deve
submeter-se a três anos de preparação, abrangendo estudos acadêmicos, estágio e prática junto àqueles órgãos, culminando com
o exame de aptidão, oral e escrito.
De mais a mais, por que não se
criam idênticas restrições para os
dois outros Poderes?
Folha - Os últimos episódios envolvendo filhos de ministros não
recomendam que o STJ tome medidas para evitar futuros constrangimentos, como apoiar publicamente a aprovação de lei semelhante
ao PL-3.881?
Naves - A idéia é boa, mas a mim
me parece que já existem disposições que disciplinam a matéria. A
dúvida que tenho é a da legitimidade da proposta em face de preceitos constitucionais garantindo
o livre exercício de qualquer profissão. Veja que, ao se pretender
vedar aos juízes o exercício da advocacia no juízo ou tribunal do
qual se afastaram, tal se vem fazendo através de emenda à Constituição.
Folha - O sr. tem dois filhos que
atuam em processos no STJ. Embora não haja lei que os impeça, não
seria melhor, do ponto de vista preventivo, que seus filhos deixassem
de atuar no tribunal que o sr. preside?
Naves - O que disciplina a pergunta são os artigos 134 a 138 do
Código de Processo Civil e 251 a
256 do Código de Processo Penal,
a propósito do impedimento e da
suspeição. Ora, de acordo com o
artigo 5º, II, da Constituição,
"ninguém será obrigado a fazer
ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei".
Folha - Quando um colega ministro decide contrariamente a algum
pedido de seus filhos advogados,
em determinado processo, não está criado um constrangimento entre o sr. e o seu colega?
Naves - Absolutamente. Não se
está criando constrangimento algum. Se se criasse, constrangimento haveria quando um ministro divergisse de outro na sala de
julgamento. É própria dos colegiados a divergência: divergimos
entre nós, diariamente, sem que
haja qualquer constrangimento.
Folha - O sr. discute com seus filhos os processos em andamento
no STJ?
Naves - Em andamento, não.
Costumamos conversar sobre a
jurisprudência do STJ, do mesmo
modo como conversamos sobre a
jurisprudência de outros tribunais; do Supremo, por exemplo.
Nas oportunidades que temos,
poucas, por sinal, não deixamos
de falar sobre o Direito, de modo
geral. É um ótimo exercício de reflexão.
Folha - Como presidente do tribunal e pela experiência que tem, o
sr. certamente sabe a tendência de
voto de cada ministro. Seus filhos
não estariam, assim, detendo informação privilegiada, em relação
aos demais advogados?
Naves - De maneira alguma.
Aliás, a qual informação privilegiada se refere a pergunta, se, em
sendo públicas as sessões e publicáveis todas as opiniões e votos
dos magistrados, obviamente todos advogados, procuradores,
promotores, partes etc. sabem de
antemão a tendência, a filosofia e
o norte dos julgadores?
Folha - Na sua vida social, seus filhos participam de eventos que envolvem outros colegas ministros,
como jantares, aniversários ou casamentos? Em caso positivo, isso
não significa que seus filhos têm
um contato mais estreito e privilegiado com outros ministros do que
a absoluta maioria dos advogados?
Naves - Quanto aos meus filhos,
ao que sei, eles frequentam festas
de pessoas que têm idade semelhante à deles. Ainda que eventualmente possam ir a outros eventos, não creio que daí possa
advir qualquer tipo de privilégio.
Folha - Há alguma recomendação
especial da presidência do STJ aos
outros ministros sobre a relação
deles com seus filhos advogados,
além do que a lei já prevê?
Naves - Se a cada dia basta o seu
cuidado, a cada qual também há
de bastar o seu cuidado.
Texto Anterior: Mudança na lei ainda divide os advogados Próximo Texto: Frase Índice
|