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NO PLANALTO
Dinheiro da Educação escorre pelo ladrão
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A justa grita de Cristovam
Buarque por mais verbas para a educação abafa um som produzido nos fundões de seu ministério. Ruído antigo e incômodo.
Barulho de dinheiro público escapando pelo ladrão.
Aqui se noticiou, em março e
em dezembro de 2002, detalhes de
uma encrenca chamada escândalo das escolas técnicas. Deitou raízes sob o tucanato. Está florescendo sob o petismo.
Antes localizado, o problema se
alastrou. O MEC gerencia rede de
72 escolas técnicas e agrotécnicas.
Todas custeadas pelas arcas públicas. Pelo menos 20 estão sob
suspeição. Colecionam-se indícios
de que têm a contabilidade carunchada.
Encontra-se em Belém a ramagem mais viçosa da confusão. Ali
está assentado o Cefet/PA (Centro
Federal de Educação Tecnológica
do Pará). Tem cerca de 7.000 alunos. Vem sendo auditado pela Secretaria Federal de Controle desde 2001.
Documentaram-se desvios de
R$ 4,5 milhões. Outros gastos de
R$ 7 milhões exalam mau cheiro.
Ou seja, o buraco pode atingir, só
nessa escola, a profundidade de
R$ 11,5 milhões.
Com o auxílio do Ministério
Público, os auditores colheram
notas frias e documentos falsos;
desencavaram uma folha salarial
oculta; descerraram contas bancárias paralelas borrifadas com
verbas oficiais.
É de 7 de julho de 2003 o relatório mais recente dos auditores
acerca das malfeitorias praticadas no Cefet/PA. Farejaram-se
novas irregularidades em convênios que a escola firmou com quatro prefeituras do interior do Pará
(Tucuruí, Santarém, Redenção e
Parauapebas).
Pelos convênios, o Cefet/PA treinou professores nessas localidades. Em troca, tornou-se credor de
R$ 5,028 milhões. Parte do dinheiro foi desviado para a conta
de uma empresa privada. Chama-se MLC Terraplanagem e Serviços Ltda. De lá, a grana migrou
para o bolso de pessoas que ocupavam postos de direção na escola. Um acinte.
Os auditores anotaram em suas
conclusões:
1) "[...] A direção do Cefet/PA,
em conjunto com diversos servidores, praticou atos que atentam
contra os princípios basilares da
administração pública e causaram prejuízo à Fazenda Nacional";
2) "Foram constituídas comissões de processo administrativo
disciplinar, tanto pela direção do
Cefet/PA quanto pelo Ministério
da Educação, entretanto, até a
presente data, nenhuma alcançou os resultados esperados";
3) "[...] A administração das receitas próprias, objeto de grande
parte dos desvios de recursos, continua sendo feita de forma irregular";
4) "[...] É necessário que a direção do Cefet/PA, em conjunto
com o Ministério da Educação,
adote providências objetivando
mudar os rumos adotados até então, de modo a apurar efetivamente a responsabilidade pelos
atos irregulares e os desvios de recursos."
O relatório aportou em Brasília
no mês de julho. Em 1º de setembro, o governo decidiu agir. E o
fez no melhor estilo petista: resolveu constituir um grupo de trabalho.
Em 8 de setembro, Jorge Hage
Sobrinho, subcontrolador-geral
da União, enviou ao MEC uma
portaria instituindo o grupo. O
documento trazia a assinatura do
controlador-geral Waldir Pires. E
reservava espaço para a rubrica
de Cristovam Buarque.
O papel dormitou nos escaninhos do Ministério da Educação
durante um mês e meio. Na última quarta-feira, o repórter discou para Antonio Ibañez Ruiz, o
assessor de Cristovam incumbido
de chefiar o setor que controla as
escolas técnicas. Perguntou: por
que a portaria ainda não foi ao
"Diário Oficial"?
Ibañez Ruiz disse: "O ministro
[Cristovam] assinou e o documento foi devolvido para a Controladoria [da União]." Contatado, Hage Sobrinho o contraditou:
"Aqui não chegou".
Na quinta-feira, Ibañez telefonou para o repórter. Corrigiu-se:
"A portaria estava aqui, na mesa
de alguém. Amanhã [sexta], vai
estar no Diário Oficial". De fato,
foi, finalmente, publicada.
Para pedir dinheiro, Cristovam
fala dez vezes antes de pensar. Para fechar ralos instalados nos porões do Ministério da Educação,
conta 45 dias antes de apor a assinatura numa reles portaria. Contaria mais não fosse o telefonema
do repórter a Ibañez Ruiz.
É com pesar que aqui se vaticina: nos próximos meses, o contribuinte brasileiro ouvirá falar
muito a respeito de escolas técnicas. As más notícias virão de localidades variadas: Maceió (AL),
Salvador (BA), São Luiz (MA),
Vitória de Santo Antão (PE),
Bento Gonçalves (RS) e um imenso etc.
Ex-reitor da UnB, Ibañez Ruiz
tem lindos planos para as escolas
técnicas. Deseja transformá-las
em centros de desenvolvimento
regional, em parceria com a iniciativa privada. Antes, terá de fechar o "desvioduto". Já afastou
alguns diretores. Mas há muito
por fazer.
Ou o MEC age com celeridade,
ou suas pretensões escorrerão pelo dreno, junto com as verbas de
uma pasta em petição de miséria.
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