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NO PLANALTO
Conheça os fantasmas que assombram o caixa dois
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A atual campanha presidencial trouxe uma boa
novidade: minguou o caixa
dois. Ainda há dinheiro passando por debaixo da mesa. Nada
comparável, porém, ao trânsito
de envelopes das duas eleições
que consagraram FHC. Muito
menos ao pé-de-meia amealhado por Collor.
Entre quatro paredes, FHC
chamou de "efeito Lunus" o fenômeno que esvazia as arcas de
campanha. Uma referência à
imagem que carbonizou o sonho presidencial de Roseana
Sarney -R$ 1,3 milhão sobre a
escrivaninha, em maços de notas de R$ 50.
Deve-se à obstinação do Ministério Público e à disciplina
imposta por Everardo Maciel ao
Fisco esse ensaio de moralização
dos costumes eleitorais. Disseminou-se a percepção de que o
"por fora" virou coisa perigosa.
Dias atrás, representante de
grande empreiteira compareceu
a um jantar de adesão. Desses
em que as pessoas chegam para
comer e terminam mordidas.
Lembrou-se de PC Farias, que o
visitara no passado. E decidiu
ouvir um advogado antes de assumir novos compromissos.
Na semana passada, um estagiário da banca advocatícia que
serve à empreiteira foi aos arquivos da 7ª Vara da Justiça Federal de Brasília. Constatou que
permanecem inconclusos processos que esquadrinham as relações financeiras que uniram o
alto empresariado à EPC, firma
de consultoria de PC Farias. São
sete processos. Um deles, mais
antigo, foi aberto em 1993. Os
outros, em 1995.
A lista de réus é eloquente:
Odebrecht, Cetenco, Votorantim, Cimento Portland Itaú,
Tratex etc. Morto PC, reduziram-se muito as chances de condenação. Mas o fantasma da
execração ainda assombra.
Orientado pelo advogado, o
empreiteiro informou ao procurador do candidato que o assediava que, desta vez, pingará
pouco. Bem menos do que dele
se esperava. E quer o recibo de
cada centavo.
As assombrações do passado
pairam sobre a atmosfera seca
de Brasília como uma advertência. Sobretudo depois que PC
voltou ao noticiário, pelas mãos
do repórter Mário Magalhães,
para assombrar José Carlos
Martinez, do time de procuradores das burras de Ciro Gomes.
Martinez não padece só. Longe dos olhos da imprensa, a Justiça ouviu, na última terça-feira, o testemunho de Maria Isabel Teixeira. Arquiteta, ela participou da famosa reforma da
Casa da Dinda, custeada com o
dinheiro sujo de PC.
Aberto na surdina, em maio
do ano passado, o processo que
traz o nome de Maria Isabel no
rol de testemunhas tenta responsabilizar criminalmente o
ex-presidente Collor, inabilitando-o novamente para o exercício de cargo público.
A iniciativa é do procurador
da República José Cardoso Lopes. Ele se escora em trabalho da
equipe de Everardo Maciel. O
Fisco acusa Collor de sonegação.
Auditou as verbas ilegais que recebeu de PC e taxou-as.
Embora desbastado por sucessivas contestações de Collor, o
débito com o Fisco soma R$ 8,4
milhões. Esgotadas as possibilidades de recurso na esfera administrativa, foi à dívida ativa.
E a Receita tenta receber nos tribunais.
Collor esquiva-se como pode.
Pleiteia em foro paulista a anulação da dívida. Alega que sobra de campanha, mesmo
quando convertida em renda,
não é tributável. Instado a oferecer bens em penhora, portou-se como nos bons tempos.
Ofereceu um lote de títulos públicos. Eram papéis podres, emitidos no século 19. Foram recusados. Apresentou então uma
ilha, que fica em Maceió. Chama-se Ilha das Andorinhas. Curiosamente, não pertence a Collor, mas à firma Halagoas - Empresa Alagoana de Hotéis Ltda.
Visto pelo ângulo de suas declarações de renda, Collor exibe,
nas palavras da Fazenda Nacional, situação de "insolvência".
Algo que contrasta com o fausto
que ostenta. Na vida pessoal e
em fornida campanha ao governo de Alagoas.
No Imposto de Renda entregue em 2001, relativo ao exercício de 2000, declarou patrimônio de R$ 2,4 milhões. Vendendo tudo, não paga as contas.
Afora a pendura da Receita,
mencionou dívidas de R$ 20,9
milhões.
O maior credor de Collor (R$
18,1 milhões) é, supostamente, a
TV Gazeta de Alagoas, uma retransmissora da Globo controlada pela família dele. O bem
mais vistoso que admite possuir,
uma casa em Miami, encontrava-se gravado em US$ 1,4 milhão, dos quais só havia pago
US$ 262,1 mil.
Embora se apresente à Receita
como diretor de empresa, Collor
é, na prática, um desocupado.
Na coluna de rendimentos tributáveis, anotou míseros R$
100, recebidos da Empresa Folha da Manhã S/A, que edita a
Folha, por conta de artigo escrito para a seção Tendências/Debates do jornal. Deduziu R$ 16,4
mil em despesas médicas. Pagou
zero de imposto.
Ouvido, Felipe Amodeo, um
dos advogados de Collor, disse
que é "natimorta" a ação que
tenta impingir condenação criminal ao ex-presidente. As sobras de campanha foram, a seu
juízo, "enterradas pelo STF",
que absolveu o seu cliente.
Outro fato age como inibidor
da generosidade empresarial:
nem o baú do tucanato escapou
à sanha da Receita. Sob a supervisão do Ministério Público,
prossegue a devassa fiscal nas
contas de oito coletores que besuntaram a campanha reeleitoral de FHC com pelo menos R$
10,12 milhões em doações ilegais.
Entre os investigados estão Ricardo "no limite da irresponsabilidade" Sérgio, ex-caixa de José Serra, e Luiz Fernando Furquim, novo caixa do mesmo José Serra.
De resto, a menção de FHC ao
"efeito Lunus" é premonitória.
A dinheirama clicada na firma
de Roseana e de seu marido,
Jorge Murad, encontra-se retida
por ordem judicial. Murad pede, em mandado de segurança,
a sua devolução. Atendido, terá
a Receita no seu encalço. Busca-se a origem do numerário. É barulho certo.
O melhor que podem fazer os
candidatos é mesmo lacrar o
caixa dois. A coleta mal começou. Ainda está em tempo.
Acrescentar ao desastre econômico uma nova crise política
não parece bom negócio. Melhor não se expor em demasia à
fúria de um procurador enfezado ou de um auditor aplicado.
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