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CIDADÃ REVISTA
Idéia é que próximos parlamentares revisem a Constituição
FHC defende novo "pacto constitucional" em 2007
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ex-presidente da República
Fernando Henrique Cardoso
(PSDB), 72, defende um novo
"pacto constitucional" a partir de
2007. Na prática, seria uma miniconstituinte, com os deputados e
senadores eleitos em 2006 tendo
poderes mais amplos para revisar
o texto constitucional.
O tucano, que presidiu o Brasil
de 1995 a 2002, não acredita ser
necessário eliminar a necessidade
de quórum qualificado (dois terços dos votos na Câmara e no Senado). "O procedimento é que
não pode ser como ele é. O regimento é muito ruim, com verificação de quórum artigo por artigo. É uma loucura. Faz com que o
Executivo fique refém da negociação parlamentar", disse FHC à
Folha, por telefone, no final da
tarde da última sexta-feira -o
ex-presidente passa apenas o fim
de semana no país e retorna em
seguida para o exterior.
"Acho razoável fazer com que
os eleitos em 2006 possam fazer
esse trabalho a partir de 2007. Você tem de dar um mandato para
isso. Mas eu acho que tem de ser
com uma área específica. É para
resolver as grandes questões",
afirma o tucano.
FHC incluiria nessa minirrevisão as áreas tributária e previdenciária, além daquilo que ele considera ser o mais importante, que é
"definir o que cabe à União, aos
Estados e aos municípios".
Ele também disse que considera
necessária uma redefinição da
área de segurança: "Eu tive de enfrentar a inflação. Enfrentei. Agora, não tem mais jeito: tem de enfrentar a questão da segurança, o
medo que existe nas cidades brasileiras".
Apesar de achar que esse é o
melhor caminho, o ex-presidente
diz ser difícil vingar a proposta
-que seria por meio de uma
emenda constitucional.
"Na época da Constituinte, eu
falava em entulho autoritário.
Agora, as pessoas não vêem relação direta entre a reforma da
Constituição e as suas vidas. Mas
há. Vai levar algum tempo."
A seguir, trechos do depoimento do ex-presidente à Folha sobre
os 15 anos da Constituição:
CENÁRIO DE 1988 - Não foi fácil
convocar a Constituinte. Houve
muita resistência. Havia a idéia de
fazer a Constituição a partir de
um documento de base. Isso era
totalmente inviável, porque o clima era o de maio de 1968 na França: é proibido proibir. Todo mundo queria opinar.
Deu um trabalho enorme. Até
que tivesse uma cara mais aceitável, custou muito. Mas eu acho
que a Constituinte foi um momento de catarse nacional. Era
uma espécie de grande sonho nacional, mas que resultou numa
outra coisa.
A parte da visão econômica e da
visão do Estado veio antes da queda do Muro de Berlim. Era uma
visão de um Estado mais intervencionista e, pior do que isso,
muito corporativista.
Foi um texto muito detalhista e
eu tentei salvar com uma emenda
minha na época, que nunca foi levada a sério. Inspirado na Constituinte de 23, eu dividia a Constituição em três pedaços. Um com
as cláusulas pétreas. Um para modificar com maioria qualificada. E
outro que pudesse ser mudado
com maioria mais um. Já era visível que teria que mexer.
REVISÃO DE 1993 - Só eu, o Luís
Eduardo Magalhães [na época,
deputado federal pelo PFL-BA], o
[Nelson] Jobim [na época, deputado pelo PMDB-RS] e alguns
poucos queríamos fazer a revisão
de 1993. Havia muita resistência.
Alguns, porque achavam que
iriam ganhar a eleição e depois
mudariam tudo -o pessoal do
PT, na época.
O lado positivo da Constituição
é o que o Ulysses [Guimarães]
chamou de "Constituição cidadã". Garantiu-se direito como
nunca. Hoje, vários órgãos podem questionar a constitucionalidade de uma lei. Antes, isso não
era possível. É uma Constituição
democrática. Não houve nenhuma modificação proposta nesse
lado bom do texto constitucional.
Esse lado de garantias é bom. O
lado ruim é o do corporativismo.
Nós perdemos a chance da revisão constitucional. Vamos continuar assim até que haja uma crise.
Tomara que não haja. Porque não
há como fazer um plebiscito, uma
mudança. Nós fizemos uma loucura: o sistema tributário brasileiro é constitucional.
PACTO CONSTITUCIONAL - Se
houvesse um momento de lucidez no Brasil, se as pessoas colocassem os interesses institucionais acima dos outros, eu acho
que valeria a pena fazer uma reflexão constitucional sobre algumas
matérias definidas. De outra forma, o governo esgota suas energias só para fazer emendas constitucionais.
Não sei se pode chamar-se miniconstituinte. No fundo, é um
pacto constitucional. Pode até
manter o quórum qualificado
[60% dos votos], mas o procedimento é que não pode ser como
ele é. O regimento é muito ruim,
com verificação de quórum artigo
por artigo. É uma loucura. Faz
com que o Executivo fique refém
da negociação parlamentar.
Acho razoável fazer com que os
eleitos em 2006 possam fazer esse
trabalho a partir de 2007. Você
tem de dar um mandato para isso.
Mas eu acho que tem de ser com
uma área específica. É para resolver as grandes questões. Uma certamente é a tributária. A previdenciária vai continuar. E o mais
importante é definir o que cabe à
União, aos Estados e aos municípios. Tanto com relação a dinheiro, mas sobretudo com relação às
obrigações.
SEGURANÇA - Acho que também
seria a oportunidade para enfrentar outra grande questão que está
fragmentada no Brasil, que é a segurança. Eu tive de enfrentar a inflação, enfrentei. Agora, não tem
mais jeito: tem de enfrentar a
questão da segurança. O medo
que existe nas cidades brasileiras.
Como é tudo recortado, com
várias polícias, vários Estados, o
que é da União, o que é do Estado,
o que é do município? Desse jeito,
não resolve. O melhor é tirar isso
da Constituição, porque a Constituição define as áreas, o que é privativo de cada polícia.
Não acho que exista clima no
país para fazer tudo isso. Nós estamos governando com emendas.
Tem um problema aqui? Então
vamos colocar um esparadrapo.
Antes, o problema recorrente
era a governabilidade. Hoje ninguém mais fala disso. Hoje é uma
questão de rearranjo institucional. É muito difícil fazer isso agora. Na época da Constituinte, eu
falava em entulho autoritário.
Agora, as pessoas não vêem relação direta entre a reforma da
Constituição e as suas vidas. Mas
há. Vai levar algum tempo.
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