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CIDADÃ REVISTA
Especialistas se dividem entre a real aplicação da Carta e a revisão completa do texto constitucional
Antigas polêmicas ainda envolvem a Constituição de 88
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Passados 15 anos, a Constituição segue hoje marcada pela mesma polêmica em que foi gerada.
Anacrônica e poluída por minúcias, dizem alguns que defendem
a substituição completa do texto
aprovado em 1988. Perfeita na
teoria, mas desprezada pelos governantes, afirmam os que apontam como caminho a educação
política da sociedade.
Quatro especialistas ouvidos
pela Folha concordam em um
único ponto: a Constituição foi o
estopim da mais ampla discussão
sobre temas sociais. Definiu garantias e deveres individuais, deu
sentido à expressão "democracia
de massas" e estabeleceu irrestrita
liberdade de expressão.
Na prática, no entanto, diz Fábio Konder Comparato, especialista em direito constitucional, a
democracia social não foi minimamente realizada e o direito
universal à saúde e à assistência
social permanecem no papel.
Para Comparato, a culpa não é
da Carta, mas de uma sociedade
fraca. "Não precisa mudar o texto.
Precisa educar politicamente a
população e dar ao poder público
força suficiente para lutar contra a
elite dominante da globalização
capitalista. Para garantir o cumprimento da Constituição, a soberania deve estar com o povo."
Na época consultor-geral da República, o advogado e ex-ministro
da Justiça Saulo Ramos diz que a
ampla lista de direitos individuais
de 1988 deu a diretriz para novas
leis de cunho social. "Mas o texto
precisa ser revisto. A Constituição
nasceu de costas para o futuro."
Um "equívoco lamentável", segundo Ramos, foi provocado pelo
próprio contexto político da época, marcada ainda pelo trauma
das prisões de militantes políticos.
"Nas garantias individuais, por
exemplo, há uma preocupação
maior com o direito dos presos do
que com o direito das vítimas."
Mais radical, o tributarista Ives
Gandra Martins chama o texto de
"monstrengo" e defende uma
substituição da Constituição. Para ele, o enunciado das garantias
individuais é positivo, mas o texto
está poluído de interesses isolados. "Todos os políticos quiseram
participar. Incluíram absurdos,
como o artigo 242, que determina
que o colégio Pedro 2º, no Rio, seja mantido na esfera federal. Isso
nunca deveria entrar num texto
constitucional."
Para Gandra Martins, o resultado foi um texto pormenorizado e
em constante conflito com o
mundo atual. "A Constituição
transforma tudo em inconstitucional", diz o advogado, que defende a elaboração de um novo
texto, mas que nasça das mãos de
especialistas.
"Na época, foram criadas 24
subcomissões, que trabalhavam
de forma independente. Quando
juntou tudo, [a Constituição] virou um monstrengo", disse.
Para o economista e especialista
em contas públicas Raul Velloso,
pelo menos três áreas que "engessam" o Orçamento da União deveriam ser revistas.
A primeira e mais polêmica se
refere à determinação constitucional de ampliar a destinação de
parte da receita da União para a
cobertura de programas de assistência social -de 5% para 20%
da receita. "Será que são beneficiadas as pessoas certas? E, numa
época de crise social, é adequado
engessar o Orçamento? Eu acho
que não", diz Velloso.
Para ele, precisam de revisão
outros dois pontos: a criação de
regime especial do funcionalismo
e a descentralização de recursos
da União para Estados e municípios. "Não é à toa que a gente vive
de reforma em reforma."
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