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NO PLANALTO
Governo do ex-PT repete vício que PT condenou
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Nasceu em 1974. O nome oficial é Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência
Social. Quem a vê de fora chama
pela sigla: Dataprev. Quem a conhece por dentro prefere o apelido: "casa-da-mãe-joana".
É o braço tecnológico do Ministério da Previdência. Administra
computadores instalados no Rio e
em São Paulo. Rodam todo o sistema de arrecadação e pagamentos previdenciários.
Só os benefícios à clientela da
Previdência geram 21 milhões de
lançamentos mensais (aposentadorias, pensões e auxílios). Somam R$ 107 bilhões por ano. Dinheiro maculado por fraudes que
põem em xeque a "inteligência"
das máquinas.
A ruína da Dataprev não foi
improvisada. É fruto de reflexão
de três décadas. Deve-se à Secretaria Federal de Controle (hoje
Controladoria Geral da União) a
auditagem da encrenca. O quadro veio à luz em 1999. Foi confirmado pelo TCU em 2002. Possui
cores berrantes:
1) a Dataprev tornou-se escrava
tecnológica de um único fabricante de computadores. Aluga,
desde sempre, equipamentos da
multinacional Unisys;
2) as máquinas funcionam
num ambiente de "plataforma fechada". Em português claro: o sistema Unisys não roda softwares
de outras marcas;
3) os contratos que acorrentaram a Dataprev à Unisys foram
firmados sem licitação;
4) nos últimos quatro anos, a
Dataprev repassou ao fornecedor
cativo cerca de R$ 180 milhões.
Detectaram-se "graves indícios"
de sobrepreço;
5) há diferentes contabilizações
dos desembolsos irregulares. A
conta mais otimista aponta o descaminho de R$ 60 milhões. A
mais pessimista soma cerca de R$
100 milhões;
6) graças às suspeitas, o tema foi
aos tribunais. Um dos processos
nasceu de representação de parlamentares petistas. A Unisys defende-se nos autos. Nega os malfeitos.
Ao assumir a Previdência, Ricardo Berzoini recebeu do grupo
de transição do PT um inventário
dos problemas do setor. A Dataprev foi guindada à condição de
prioridade.
O TCU indicara o caminho em
2002. Impunha-se: (a) o rompimento com a Unisys, (b) a abertura de licitação e (c) a migração
para um "sistema aberto", compatível com outros bancos de dados públicos.
Havia uma data mágica para o
início da reformulação: 30 de junho de 2003. Nesse dia, sabia-se
desde 1999, expiravam os contratos com a Unisys. Oportunidade
única. Governos, porém, não costumam perder a oportunidade de
perder uma boa oportunidade.
Ao chegar, o fatídico 30 de junho encontrou um imprevidente
Ministério da Previdência ainda
dividido quanto à solução a adotar. A corporação da Dataprev
defendia a recontratação da
Unisys.
Decidido a evitar o impensável,
Berzoini optou pelo desaconselhável: contratou, por seis meses,
a empresa Cobra, subsidiária tecnológica do Banco do Brasil. Deu-se em 15 de agosto. Nem sinal de
licitação. Alegaram-se "necessidades emergenciais". Uma
"emergência" prevista desde 1999.
"Não podíamos fazer a licitação
antes de ter clareza sobre a estratégia de migração para um sistema seguro", diz Berzoini. "A pressa é inimiga da perfeição." Na reforma da legislação previdenciária adotou-se tática diversa. Fez-se em oito meses, a toque de caixa, o que FHC não fizera em oito
anos.
A primeira providência da Cobra foi a aquisição de um novo
computador para a Dataprev. O
nome do fornecedor? Unisys.
"Antes de migrar para plataforma mais segura, é preciso aumentar a capacidade do sistema
atual, com taxas de utilização superiores a 90%", alega Berzoini.
Só em 25 de setembro o ministro
constituiu um grupo de trabalho
para preparar a ansiada licitação. Não se está falando da aquisição de maquinário novo. Tampouco se está tratando da migração da plataforma fechada para o
sistema aberto. Busca-se, por ora,
apenas a contratação de empresa
capaz de manter o velho parque
tecnológico da Previdência em
movimento.
O contrato com a Cobra sorverá
dos cofres da Previdência R$ 19,3
milhões. "Estamos economizando
dinheiro", festeja Berzoini. De fato, os antigos acertos com a
Unisys previam desembolsos
mensais de R$ 4,3 milhões, contra
R$ 3,2 milhões a serem pagos à
Cobra.
O diabo é que, manuseando os
contratos firmados com a Unisys,
o repórter constatou que, vencido
o prazo de 30 de junho, o custo do
aluguel das máquinas da Dataprev cairia a zero. Restariam despesas com manutenção e aluguel
de softwares. A própria Unisys orçou a continuidade de seus serviços em R$ 2,8 milhões mensais.
Sob FHC, o PT classificava como vício a dispensa de licitação
na Dataprev. Agora, o ex-PT rebatiza o fenômeno. Chama-o de
prudência. O contrato com a Cobra contém cláusula prevendo a
prorrogação por mais um ano.
"Espero que não seja necessário
prorrogar", diz Berzoini. A torcida do Corinthians também espera.
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