|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PARTIDO AO MEIO
Ala petista que discorda da política econômica do governo busca apoio de Dirceu com vistas à disputa municipal
Eleição estressa a relação entre Lula e PT
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
As recentes disputas no governo
que geraram "fogo amigo" contra
a política econômica do ministro
Antonio Palocci Filho (Fazenda)
são a ponta de um iceberg.
Reunidos em torno do ministro
José Dirceu (Casa Civil) e temerosos do efeito da política econômica nas eleições de outubro, setores
moderados do PT, partido que
completa 24 anos, tentam reduzir
o que chamam de poder "quase
imperial" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Nesse contexto, a queda-de-braço mais importante do começo do segundo ano do governo
Lula não é entre Dirceu e Palocci.
É entre um PT que não se reconhece no governo e um presidente disposto a bancar políticas, sobretudo a econômica, que o partido combateu ferozmente antes de
chegar ao poder.
Dirceu catalisa o sentimento
dos setores do PT que buscam influenciar Lula de forma a colocá-lo nos trilhos do tradicional modo
petista de governar. Esses grupos
toleraram o rigor fiscal e monetário no primeiro ano por julgá-lo
passageiro. Agora, aliaram-se às
alas radicais ao constatar que ele
tende a ser permanente. É por isso
que a política econômica apanha
tanto dentro do governo.
Prefeitos, governadores, parlamentares, candidatos a prefeitos e
intelectuais petistas desiludidos
buscam naturalmente o ministro
da Casa Civil na hora de desafogar
as mágoas. Dirceu foi o presidente
do PT que, em aliança com Lula,
consolidou a hegemonia das tendências moderadas no partido e
isolou as radicais. Mas também
sempre foi uma espécie de contrapeso a Lula.
A relação Lula-Dirceu é fria, política, racional -bem diferente da
que o presidente, que diz acreditar mais no coração que na razão,
tem com Palocci e Luiz Gushiken
(Comunicação de Governo).
As principais críticas são três:
1) Ao contrário do que se imaginava, Lula contrariou as previsões
de que o "assembleísmo" marcaria seu processo de tomadas de
decisões. Ouve um grupo muito
próximo de petistas, no qual Dirceu se inclui, mas decide de forma
centralizadora.
2) A avaliação de que a política
econômica é conservadora demais, com um rigor fiscal e monetário que não dá satisfação ao PT
nem aos seus quadros históricos.
Na economia, Palocci dá as cartas
e ponto, dizem os críticos.
Daí a política econômica em geral e dois auxiliares do ministro da
Fazenda em particular serem tão
atacados. Caciques do PT na Câmara próximos a Dirceu deixaram digitais na articulação para
minar Joaquim Levy, secretário
do Tesouro, e Marcos Lisboa, secretário de Política Econômica.
Lula acha os dois conservadores,
mas respeita a decisão de Palocci
de bancá-los. Eles estão fora da
lista de fritura presidencial.
3) A nove meses das eleições
municipais, temem que o alto desemprego afete o desempenho do
partido e que o prometido crescimento econômico não seja suficiente para vitaminar candidaturas, especialmente nas capitais e
nas grandes cidades.
"Primeiro-ministro"
Esses são os motivos que levam
os moderados do PT a trabalhar
pelo aumento da influência de
Dirceu nas diretrizes de governo e
pelo declínio de Palocci. Até onde
a vista alcança nos bastidores, não
há sinal de que Lula aceite passivamente essa articulação. O presidente quer, sim, maior espaço na
política econômica para a promoção do crescimento, mas tem se
mostrado cauteloso e conservador para não jogar por terra todo
o esforço que fez até agora. E crê
que Palocci assumiu um papel de
avalista perante o mercado fundamental para o governo.
A ordem de Lula para que Dirceu se dedique mais ao gerenciamento do governo tem a ver com
esse desejo de fazer acontecer na
economia, mas está longe de ser
carta branca ou delegação para
atuar como "primeiro-ministro".
Por estilo e cálculo político, Dirceu sempre dá corda aos setores
do partido que o enxergam como
o mais petista do governo. Na semana da transmissão de cargo aos
novos ministros, foi a uma posse
carregada de símbolos. Ricardo
Zarattini Filho, antigo militante
dos grupos de esquerda que combateram o regime militar de 1964,
assumiu o mandato de deputado
federal.
Dificilmente Lula cederá tanto
quanto pedem Dirceu e esses setores do PT. O presidente se recorda bem dos moderados do
partido que acharam que ele nunca chegaria à Presidência e que
discutiram ardorosamente uma
alternativa à sua candidatura nas
eleições de 1998 e 2002.
No longo prazo, o presidente,
com estilo centralizador e uma
comunicação direta de metáforas
simples para atingir a população
mais pobre e despolitizada, avalia
que deve fazer um governo com
"cara mais ampla" do que a do
Partido dos Trabalhadores, no
que pese PT e Lula serem marcas
que se confundem.
No curto prazo, Lula acredita
que a partir de maio a economia
real (emprego e renda dos trabalhadores, por exemplo) dará fortes sinais recuperação e criará clima que favorecerá políticos petistas e aliados em 3 de outubro. Até
maio, o governo espera lidar com
notícias ruins na economia. É isso
o que Palocci e o presidente do
Banco Central, Henrique Meirelles, prometeram ao presidente.
Texto Anterior: Só Bastos resta do governo paralelo Próximo Texto: Puxão de orelha: Mãe de Palocci dá nota 5 ao governo Lula Índice
|