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CÉU DE PRESIDENTE
Compra de avião prevê situação de "grave anormalidade"
Governo usa o 11 de Setembro
para justificar Airbus de Lula
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A possibilidade de o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva ou um de
seus sucessores precisar comandar o país dos céus, "em ambiente
de grave anormalidade ou conflito", foi um dos motivos alegados
pelo Comando da Aeronáutica
para cercar de sigilo detalhes da
compra do novo avião presidencial, sigilo esse que também justifica oficialmente a compra sem licitação de um modelo personalizado da Airbus, o Airbus Corporate Jetliner-319.
As explicações constam de documento enviado há poucos dias
ao Congresso Nacional pelo ministro José Viegas (Defesa) em
resposta a um requerimento de
informação. O documento, classificado como "confidencial", lembra que o presidente George W.
Bush teve de comandar os Estados Unidos a bordo do "Air Force
One" nas horas que se seguiram
aos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001.
O "Número Um" do governo
brasileiro está em fase de montagem em Hamburgo, na Alemanha. Sabe-se disso em consulta ao
site da empresa Airbus, com sede
em Toulouse, na França. Detalhes
sobre o equipamento pelo qual o
governo pagará US$ 56,7 milhões
até o final do ano podem ser encontrados no site.
Parte das peças é fabricada nos Estados Unidos,
por exemplo. Entre
elas, há vários
microprocessadores, radares, modernos
sistemas de
navegação e de
segurança. Na fuselagem, é usada
uma combinação de fibras sintéticas, de carbono e de vidro. O
avião pode pousar sem restrições
em aeroportos pelo mundo e tem
autonomia para cruzar continentes. Lula poderá ir de Brasília a Paris sem escalas, por exemplo.
A cabine -uma das mais espaçosas, confortáveis e silenciosas
de jatos do tipo, conta a empresa- tem cerca de 80 metros quadrados. Seu arranjo interno
-mais ou menos luxuoso, com
capacidade para abrigar cama de
casal, banheiro com chuveiro na
área reservada e até uma UTI a
bordo- é escolha do freguês.
De acordo com o Comando da
Aeronáutica, o ACJ encomendado chegará com uma área reservada com capacidade para oito
pessoas e, dependendo do "tipo
de missão", mais uma área para
16 a 36 passageiros. Haverá um
centro de comunicações a bordo e
uma área que pode ser convertida
em unidade de terapia intensiva.
Pagamento antecipado
A entrega do avião está prevista
para dezembro, quando o governo desembolsar a quarta e última
parcela do pagamento.
Ela garantirá o acesso do presidente brasileiro a um time restrito
de governantes que dispõem de
um ACJ em sua frota. Os governos da Itália, da Venezuela e da
França têm cinco desses aviões, e
os dos Emirados Árabes e da Tailândia fizeram encomendas recentemente.
A primeira parcela, no valor de
R$ 47 milhões, foi paga em fevereiro, dias depois do fechamento
do contrato com a Airbus. O pagamento ainda representa o mais
caro investimento feito nos primeiros quatro meses do ano pelo
governo federal.
Os próximos pagamentos estão
marcados para junho (R$ 48,7 milhões), agosto (R$ 40,6 milhões) e
dezembro (R$ 32,1 milhões). Os
preços em real podem variar de
acordo com a cotação do dólar na
data do desembolso.
Em resposta a um pedido feito
pela Folha, o Comando da Aeronáutica disse que o contrato assinado em fevereiro com a Airbus
não pode ser divulgado porque é
sigiloso e envolve questões de segurança nacional.
O caráter sigiloso do negócio é
reiterado pelo ministro José Viegas em resposta a um requerimento de informação do deputado Chico Alencar (PT-RJ). O governo lançou mão de um decreto
baixado em 1997 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso para comprar o avião sem licitação -mecanismo que teoricamente assegura transparência ao
negócio, além de menor preço.
O texto do decreto prevê que
para a compra de "recursos aeroespaciais" o governo possa dispensar licitação quando ela colocar em risco objetivos de segurança nacional.
Custo da hora de vôo
Para justificar a compra, o Comando da Aeronáutica usou dados da empresa de consultoria
Conklin & de Decker Associates.
Eles comparam o custo da hora de
vôo e da manutenção do ACJ e do
Boeing-707, usado no transporte
do presidente e cuja substituição
foi negociada desde maio do ano
passado, quando se chegou à conclusão de que o avião era obsoleto. Numa viagem de ida e volta a
Londres, por exemplo, a economia de gastos conseguida pelo
modelo escolhido chegaria a R$
360 mil, afirma um documento
encaminhado pelo ministro Viegas ao Congresso.
"Após todas as análises efetuadas, a comissão de seleção do projeto VC-X identificou a proposta
da empresa Airbus como sendo a
opção mais vantajosa no conjunto das avaliações das áreas técnica, logística, "offset" (compensação industrial e tecnológica) e comercial", resume.
O documento explica a dispensa de licitação nos seguintes termos: "O conhecimento indiscriminado das características do
projeto por parte de outros países
ou mesmo de grupos ou entidades que exerçam atividades ilícitas pode vir a comprometer a segurança da aeronave e, por conseguinte, do próprio presidente da
República".
A brasileira Embraer não participou do negócio porque não dispõe de aeronaves desse tipo.
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