|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SEM ESPETÁCULO
Corte é de 60,7%, e do que sobrou, menos de 1% saiu do papel; investimento é menor do que o de FHC em 2002
Presidente contraria discurso e corta gasto com saneamento
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Destacados como uma das prioridades do governo Luiz Inácio
Lula da Silva em discursos e até
nas negociações com o Fundo
Monetário Internacional, os investimentos em saneamento enfrentam em 2004 corte de 60,7%
do dinheiro que a lei orçamentária destinou ao setor por meio de
quatro ministérios diferentes.
O dado, fornecido pelo próprio
Ministério das Cidades, mostra
uma realidade bastante diferente
do discurso que Lula fez na terça-feira em Rio Branco (AC), quando acusou a morte de 300 mil
crianças por falta de saneamento
básico entre 1998 e 2001, durante
o governo de Fernando Henrique
Cardoso.
Pelas contas da assessoria do
ministro Olívio Dutra, haverá
R$ 688 milhões -39,3% do que
previa a lei orçamentária- disponíveis para investir em saneamento básico neste ano. É menos
do que o valor investido com recursos federais no último ano de
mandato de FHC -R$ 908,4 milhões, já corrigidos pela inflação-, aponta estudo da Aesbe
(Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais).
Menos até do que os R$ 925 milhões que Lula teria investido em
saneamento no primeiro ano de
mandato. Desse valor, mais da
metade só será paga neste ano.
São contas pendentes. Não fosse o
corte -fixado por decreto do
presidente em fevereiro-, os
gastos com saneamento poderiam alcançar R$ 1,750 bilhão.
Até o final de março, quase nada
do Orçamento de 2004 havia saído do papel. Menos de 0,5%, segundo dados do Siafi (sistema informatizado de acompanhamento de gastos federais).
"Estamos começando a trabalhar o Orçamento agora e corremos atrás do prejuízo", alega José
Luiz Reis, coordenador-geral de
cooperação técnica em saneamento da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), que concentra a
maior parte dos gastos na área.
O prejuízo a que ele se refere é o
período curto entre o prazo final
para a apresentação de projetos
de saneamento pelas prefeituras
(15 de maio) e o limite de tempo
para a assinatura de convênios fixados pela lei eleitoral. Como haverá eleição nos municípios, as liberações ficarão bloqueadas a
partir de 3 de julho.
Segundo Reis, do dinheiro previsto para pequenas cidades (até
30 mil habitantes) em 2004, pouco mais de 1% havia sido gasto até
a última terça-feira.
Contabilidade
O maior feito do governo Lula
na área de saneamento foram, até
aqui, contratos assinados no valor
de R$ 1,647 bilhão. É dinheiro do
FGTS (Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço) e representa o
maior volume de contratos assinados pela Caixa Econômica Federal em dez anos para obras de
esgotamento sanitário, abastecimento de água e tratamento de lixo. Durante os oito anos de mandato de FHC, foram contratados
R$ 2,730 bilhões.
A marca foi comemorada em
solenidade com a presença de Lula. Mas o dinheiro não foi liberado
ainda, diferentemente do que o
presidente afirmou durante a
inauguração do Hospital do Idoso
em Rio Branco.
"Nós liberamos em dezembro
do ano passado R$ 1,7 bilhão para
saneamento básico", disse Lula.
A assessoria de imprensa da
Caixa informa que a liberação do
dinheiro dependerá do ritmo das
obras e pode demorar, em alguns
casos, mais de dois anos. As empresas estaduais de São Paulo e do
Paraná levaram a maior fatia dos
recursos.
"Existe um "timing" para o início
das obras", destaca o Ministério
das Cidades. "Como a quase totalidade dessas operações foi contratada no último trimestre do
ano, ainda não houve tempo hábil
para a realização de desembolsos
financeiros significativos."
No discurso em Rio Branco, Lula afirmou que haveria R$ 3 bilhões para "novos" investimentos
em 2004. "Não falta dinheiro para
fazer este país se desenvolver e
crescer", disse o presidente.
Ele se referia aos R$ 2,9 bilhões
para empréstimos cuja contratação foi liberada na negociação do
governo com o FMI (Fundo Monetário Internacional), no qual já
estariam incluídos R$ 940 milhões contratados pela Caixa em
dezembro passado.
O ministro Olívio Dutra negocia
a exclusão da parcela dos contratos já fechados do limite acertado
com o FMI, mas o desfecho da negociação ainda é incerto. A decisão cabe ao Conselho Monetário
Nacional.
Ritmo
Com o ritmo dos investimentos
registrados até aqui no governo
de Luiz Inácio Lula da Silva, ficará
difícil cumprir a meta de universalizar os serviços de água e esgoto no país até 2024.
Os dados oficiais mais recentes,
que foram divulgados pelo IBGE
(Fundação Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística), mostram
que 60% da população brasileira
não dispõe de coleta de esgoto,
enquanto 23,9% não possui acesso à rede de água.
Outro obstáculo aos investimentos em saneamento seria a
falta de regras para a concessão de
serviços à iniciativa privada.
O governo ainda não chegou a
um acordo sobre o projeto de Política Nacional de Saneamento
Ambiental.
Texto Anterior: Lula aumenta a carga de tributos que afetam pobres Próximo Texto: Outro lado: Ministério diz ser "normal" o ritmo de investimentos Índice
|