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SEGUNDA ONDA
Presidente impõe à equipe meta de crescimento de 3,5% para 2004
Medo de repetir FHC leva Lula a exigir "virada" na economia
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Luiz Inácio Lula da Silva acha
que chegou a hora de planejar a
"virada" na economia. Em discussões reservadas com um seleto
grupo de ministros, o presidente
mostra-se obcecado pelo vocábulo "crescimento". Impôs à equipe
uma meta: quer que o PIB do país
cresça pelo menos 3,5% em 2004.
Lula impacienta-se com a tese
de que o seu governo repete no essencial a administração de Fernando Henrique Cardoso. Daí a
obsessão pela retomada do desenvolvimento. O ânimo mobiliza a
Esplanada dos Ministérios.
Monta-se nos subterrâneos
uma estratégia chamada por algumas autoridades de "fase dois".
Não se trata de nenhuma ruptura
em relação à política do ministro
Antonio Palocci Filho (Fazenda).
Ao contrário. Parte-se da avaliação de que, em quatro meses, Palocci construiu uma atmosfera de
"estabilidade" que faculta vôos
mais ambiciosos.
A intenção é usar o resto de 2003
para armar a "plataforma" do
crescimento. Envolve basicamente iniciativas para: 1) tonificar a
poupança interna do país; 2) financiar micro, pequenos e médios empreendedores; 3) incrementar as exportações; 4) direcionar a aplicação de incentivos fiscais; 5) seduzir aplicadores estrangeiros para o investimento de
risco; e 6) estabelecer parcerias
entre o governo e a iniciativa privada nacional.
Sob reserva, Lula reconhece
uma lacuna na sua formação: não
domina como gostaria os meandros da macroeconomia. Empenha-se para superar a deficiência.
Encomenda relatórios. Dá preferência a textos curtos. Devora-os.
Grifa trechos que julga relevantes.
Faz anotações à margem dos papéis. Criva os auxiliares de perguntas.
Debate
O estabelecimento da meta de
3,5% do PIB para 2004 foi precedido de um debate entre Planalto
e Ministério da Fazenda. Armaram-se diferentes cenários. Embalados pela maré de boas notícias -arrefecimento do chamado risco-país, queda do dólar e inflação cadente-, os técnicos da
equipe econômica julgavam factível chegar a 4%.
Coube a Lula a opção pelo percentual mais modesto. Argumentou que prefere caminhar a um
ritmo mais lento a ter que dar passos para trás. De resto, abomina a
hipótese de deitar sobre o papel
objetivos que não possam ser
convertidos em realidade.
A taxa de 4% foi jogada para
2005. Para 2006, previu-se crescimento de 4,5% do PIB. Os números foram à LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). As condicionantes que envolvem a economia
emprestam à sequência de percentuais a aparência de um exercício de adivinhação. Mas Lula
trata os dados como imperativos
de governo.
A história recente dá uma medida da confiabilidade de previsões
do gênero. Sob FHC, registraram-se diferentes previsões. Em 2000,
o próprio Fernando Henrique
anunciou, em três ocasiões diferentes, o percentual de 4% como
"piso" para o crescimento. No
mesmo ano, Armínio Fraga, então presidente do Banco Central,
previu 6,5% para 2001. Vencidos
os oito anos de tucanato, a média
de crescimento econômico ficou
em modestos 2,3% do PIB.
Compõem o núcleo de análises
desenvolvimentistas de Brasília
os seguintes ministros: Antonio
Palocci Filho (Fazenda), José Dirceu (Casa Civil), Luiz Gushiken
(Secretaria de Comunicação e
Gestão Estratégica), Luiz Dulci
(Secretaria geral da Presidência),
Tarso Genro (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) e
Ciro Gomes (Integração Nacional).
Ciro Gomes
Ciro integrou-se ao grupo por
iniciativa de Lula. O presidente foi
cativado pela "lealdade" e "discrição" do auxiliar. Ao acomodá-lo
no ministério, em janeiro, receava
que houvesse nomeado um problema. Hoje, parece convencido
do contrário.
Ciro esquiva-se de jornalistas.
Por vezes, diverge de estratégias
do governo. Mas guarda as críticas mais acerbas exclusivamente
para os ouvidos de Lula. O presidente identifica na dissonância do
ex-adversário um timbre "construtivo".
Em silêncio, Ciro remonta a engrenagem de incentivos fiscais do
governo. A idéia é retirar-lhes o
caráter aleatório, direcionando-os para empreendimentos que o
Planalto julgue relevantes. O ministro tenta pôr de pé novos fundos de desenvolvimento regional.
Simultaneamente, revolve as cinzas das extintas Sudam Sudene,
autarquias voltadas respectivamente para inversões fiscais na
Amazônia e no Nordeste.
A Gushiken foi confiada a tarefa
de supervisionar uma iniciativa
que Lula julga primordial: a "democratização" dos fundos de previdência. Novas regras vão abrir
caminho para a constituição de
fundos de pensão de categorias
específicas.
Imagina-se que a proliferação
de fundos irá vitaminar a poupança interna do país, cuja aplicação ajudaria a compensar a falta
de dinheiro do Estado para investir, por exemplo, em infra-estrutura.
Tarso Genro recebeu a incumbência de abrir no CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) debate em torno de
um projeto de desenvolvimento
para o país. O encargo foi comunicado aos conselheiros pelo próprio Lula, em carta pessoal.
Conselheiros
Constituiu-se um subgrupo para tratar do tema. Integram-no 65
conselheiros, entre empresários,
sindicalistas e acadêmicos. Funcionará longe de Brasília. Haverá
reuniões no Rio e em São Paulo. A
primeira delas, marcada para o
próximo dia 28, ocorrerá na capital paulista, onde estava Genro na
última quinta-feira, para cuidar
dos preparativos.
Luiz Dulci percorre o país em
missões oficiais. Inclui no roteiro
visitas a entidades empresariais.
Já esteve três vezes na CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Foi também a três federações estaduais: Fiesp (São Paulo), Fiemg
(Minas Gerais) e Fiergs (Rio
Grande do Sul).
Dulci reúne-se ainda com intelectuais ditos progressistas. Na última terça-feira, em São Paulo,
encontrou-se em segredo com 18
acadêmicos. Portou-se com método.
Apresentando-se como enviado
de Lula, fez uma exposição minuciosa. Foi do social à política externa. No trecho dedicado à economia, mencionou os planos de
retomada do desenvolvimento,
que serão explicitados, segundo
disse, no PPA (Plano Plurianual).
Trata-se do programa de investimentos para os próximos quatro
anos, a ser fechado em junho.
Depois, Dulci abriu espaço para
manifestações da platéia. Em três
horas de reunião, ouviram-se
mais críticas que elogios. Auxiliares do ministro tomaram nota das
observações, repassadas a Lula.
Ausente do encontro, Antonio
Candido mereceu uma visita exclusiva de Dulci.
O presidente deseja antecipar-se a eventuais surtos de insatisfação de um público que julga formador de opinião. Haverá novos
encontros. O próximo, ainda sem
data marcada, reunirá a intelectualidade do Rio de Janeiro.
Todos os planos do governo
pressupõem a aprovação pelo
Congresso das reformas previdenciária e tributária. Na visão
oficial, um eventual insucesso
parlamentar envenenaria o cenário de calmaria econômica. Uma
hipótese com a qual Lula prefere
não trabalhar.
A pedido do presidente, Antonio Palocci ocupa-se inclusive da
elaboração de projetos de lei que
complementarão as reformas. A
fase "infra-constitucional", como
é chamada, deve ser ainda mais
complexa do que a atual, segundo
a previsão de Palocci.
José Dirceu joga a sua reputação
de bom estrategista na aprovação
das reformas até outubro, como
deseja Lula. Responde à rebeldia
petista com pulso de ferro. Seduz
parlamentares com as armas de
que dispõe, inclusive cargos e verbas.
Embora tenha se fixado na idéia
de preparar o terreno para 2004,
Lula tem pressa. Há um mês, convocou ao Planalto os presidentes
do BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e
Social), Carlos Lessa; do Banco do
Brasil, Cássio Casseb; e da CEF
(Caixa Econômica Federal), Jorge
Mattoso.
Pediu-lhes prioridade na concessão de empréstimos ao setor
produtivo. Pediu que dessem
atenção ao microcrédito (empréstimos para classes C e D) e às pequenas empresas. À CEF, recomendou também o incremento
das inversões em saneamento básico e habitação popular.
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