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POLÍTICA CIENTÍFICA
Temas escolhidos para a reunião deste ano, em Recife, são inclusão social, soberania e política externa
Governo Lula "pauta" encontro da SBPC
DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DO RIO
A 55ª Reunião Anual da SBPC
(Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) começa hoje à
noite em Recife, Pernambuco,
"afinada" com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ao menos em sua pauta de debates, orientada para a discussão
de temas caros ao governo e até ao
ministro Roberto Amaral (Ciência e Tecnologia), que encontra
resistências na comunidade científica.
Entre os grupos temáticos propostos aos participantes estão a
política externa do governo Lula e
a relação entre o conhecimento
científico, a defesa e a soberania
nacional. Amaral causou celeuma
no governo (e no mundo) ao relacionar justamente esses temas,
declarando em janeiro, à rede britânica BBC, que o Brasil não poderia renunciar ao domínio da
tecnologia necessária para a fabricação da bomba atômica, ressalvando depois que isso não significava que o país fosse fabricá-la.
O subtítulo do encontro -Educação, Ciência e Tecnologia para a
Inclusão Social- também sinaliza a influência do novo governo.
O sociólogo Flávio Pierucci,
coordenador da organização do
encontro, afirma que o governo
Lula influenciou na escolha dos
temas. "No momento em que a
gente começou as reuniões da comissão de programação, o novo
presidente estava começando
suas viagens, dando importância
à América Latina, uma afirmação
mais pró-ativa do Brasil no cenário internacional. E a gente está
enfrentando problemas de todo
tipo. A biodiversidade, por exemplo. São questões que, de uma forma ou de outra, acabam tangenciando a questão da soberania."
Pierucci, no entanto, faz uma
ressalva quanto a Amaral. "O episódio do ministro serviu como
uma inspiração para nós, mas para discutirmos a questão da soberania de outra forma. Acho que a
contribuição do ministro não foi a
mais feliz. Ele vinha naquele momento com um discurso que nos
pareceu ultrapassado."
O próprio Amaral fará uma
conferência no encontro, dentro
do ciclo "Integração e Soberania".
Ele disse à Folha que reconhece
afinidades entre a pauta de debates da SBPC e interesses do governo. "Acho excelente [que esses assuntos sejam discutidos]. Vejo
que a pauta do governo federal está se transformando numa pauta
da sociedade", afirmou.
Para o professor de ética e filosofia política da Unicamp Roberto Romano, "há uma ansiedade
de toda a comunidade científica
[em discutir esses assuntos]".
Também ele fará uma conferência
sobre o tema, amanhã, sob o título "Ciência e tecnologia para a defesa nacional".
"Como a política do ministro
vai também nessa linha, houve
uma união de preocupações. Mas
é bom deixar ressaltado que a atitude da comunidade científica
não é a favor ou contra a política
do ministro. Ela quer é pensar",
afirma Romano.
A política externa brasileira merecerá duas conferências no encontro, uma delas a ser apresentada pelo secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães,
que tem conhecidas posições contrárias à Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
Apesar da "inspiração" da política externa de Lula para a discussão do tema, segundo Pierucci,
por suas atitudes inovadoras no
início do governo, Roberto Romano lembra que o governo vive
um momento de aparente indefinição na área -e justamente por
conta da negociação da Alca.
Outros grandes temas tratados,
além de soberania e biodiversidade, serão "educação e inclusão social", "qualidade de vida" e "desigualdades no Brasil". Para Sérgio
Besserman, ex-presidente do IBGE e diretor de informações gerenciais do Instituto Pereira Passos, entretanto, a agenda da SBPC
está sintonizada com o momento
brasileiro, mas não necessariamente com a agenda de governo.
Dissenso
Apesar de afinada com a agenda
do governo, a reunião deve também ter dissensões. Pela primeira
vez, a SBPC, tradicionalmente alinhada com o PT, se reúne quando
o partido é governo. Simpatizantes petistas críticos em relação ao
governo federal, como o sociólogo Francisco de Oliveira e o próprio Romano, têm falas agendadas na 55ª reunião.
O momento é de transição também na própria entidade. Após
uma eleição disputada, em junho,
a SBPC elegeu Ennio Candotti, da
Universidade Federal do Espírito
Santo, para substituir Glaci Zancan, da Universidade Federal do
Paraná, que ficou quatro anos à
frente da SBPC. Candotti toma
posse na quarta-feira.
(RAFAEL CARIELLO E ANTÔNIO GOIS)
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