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Assentamento no Pontal vive drama da fome
DO ENVIADO ESPECIAL AO PONTAL DO PARANAPANEMA (SP)
Se o assentamento Guaná-Mirim, de Euclides da Cunha Paulista (750 km de São Paulo), um dos
quatro que o governo Lula dizia
ter realizado no ano de 2003 em
São Paulo -todos implantados e
tocados pelo governo paulista-
vive a sua hora da verdade, o ex-sem-terra Leodino Alves Pereira,
51, é quem a encarna.
Comendo quase sempre apenas
arroz, farinha e andu (uma espécie de feijão), sem sentir o gosto
de carne bovina há mais de um
ano, Pereira dá sinais de fraqueza.
Vive sozinho no barraco de lona
cheio de buracos no teto, mantido
por doações de vizinhos em situação um pouco melhor que a dele,
porque contam com filhos e parentes para trabalhar em subempregos nas fazendas da região.
Embora na penúria, Pereira diz
querer continuar. Com maior ou
menor grau, é a mesma provação
das outras 33 famílias do Guaná-Mirim (104 crianças, 28 barracos
de lona, quatro de alvenaria e dois
de madeira, um Voyage ano 88 e
uma motocicleta Honda ano 78).
Ex-cortador de cana-de-açúcar
que passou quatro anos sob um
barraco de lona num acampamento do MST, Pereira ajeita a camiseta do "Avança Brasil", programa de desenvolvimento do
governo FHC, doada há dois
anos, e diz lembrar do pai, morto
em 2002, quando pensa em desistir: "Ele ficou muito feliz quando
eu recebi esse lote".
As famílias entraram na área em
5 de agosto de 2002. Com exceção
da terra, nada receberam do governo. Com pouco dinheiro para
comida, sem sementes para plantar, sem instrumentos para cultivo, os ex-sem-terra se entregam a
um jogo de paciência que alguém
resumiu, a rabiscos de prego, na
carroceria do "Trovão Branco", o
caminhão-pipa que atende o assentamento: "Não tenha preça, o
enportante é chegá [sic]".
O caminhão chegou à casa de
Ednilson Pereira da Silva, 34, na
tarde da última quarta-feira, pondo fim a cinco longos dias de gasto controlado de água. Ele acha
que isso só ocorreu porque havia
jornalistas na área. O intervalo
normal era de dez dias.
O córrego mais próximo fica a 3
km. A escola para as crianças, a 5
km. Mas o ônibus dá diversas voltas para pegar todos os alunos, o
que faz a viagem levar inacreditáveis duas horas (com tantas curvas, tem criança que passa mal,
com tonturas e vômitos). Acordam às 5h para a aula das 7h.
"Você está como assentado e
não é. Você é jogado e abandonado", diz Maria de Fátima Pereira,
36, uma espécie de líder do assentamento. Há duas semanas as famílias entregaram um documento ao Ministério Público de Euclides da Cunha Paulista com um rol
de denúncias sobre a falta de infra-estrutura no assentamento.
Querem providências.
O diretor de desenvolvimento
do Itesp (Fundação Instituto de
Terras do Estado de São Paulo),
Afonso Curitiba Amaral, classificou de "terrível" a situação do assentamento. Disse que está empenhado em ajudar as famílias, prometeu abrir em agosto um poço
artesiano na área e tentar acelerar
a liberação de recursos. "No Estado tudo obedece a um processo
legal, com licitações, períodos,
prazos", explicou.
(RV)
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