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SEGUNDO TURNO
Segundo interlocutores do presidente, ele considera escassas as chances de Serra reverter o favoritismo de Lula
FHC prevê cenário sombrio para sucessor
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Fernando Henrique Cardoso
acha que Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) é franco favorito na disputa
pela Presidência da República. O
candidato governista José Serra
(PSDB) pode reverter o quadro a
seu favor. Mas são escassas, na
opinião do presidente, as chances
de êxito.
Na última semana, FHC abriu
espaço na agenda para contatos
políticos. Articulou abertamente
em favor de Serra. Tenta sobretudo juntar em torno do tucano os
cacos do consórcio político que
deu suporte à gestão dele.
A Folha ouviu alguns dos interlocutores de FHC. Sob o compromisso do anonimato, revelaram
as aflições do presidente com a
perspectiva de êxito de Lula. Algumas delas:
1) FHC mostra-se convencido
de que, confirmada a vitória do
PT, o Brasil viverá uma fase de
enorme privação financeira. Os
investidores internacionais vão
colocar o país "no freezer" por
uns dois anos. O comportamento
arredio do dinheiro estrangeiro
nesta fase de campanha eleitoral
seria um indicativo do que vem
pela frente;
2) A retomada dos investimentos, vitais na opinião de FHC, dependeria do comportamento do
PT na Presidência. O fluxo de dólares só se normalizará se a retórica moderada do Lula candidato se
materializar no cotidiano administrativo do Lula presidente;
3) O presidente acha que não há
ambiente para a implantação de
um governo "ideológico", com
viés esquerdista. Se ceder à tentação, Lula será tratado a pão e água
pela banca internacional e pelos
Estados Unidos, maior parceiro
comercial do Brasil;
4) Sob George W. Bush, os EUA
não têm experimentado uma gestão iluminada. Preferia o estilo de
Bill Clinton, mais "sofisticado". A
resistência do PT às negociações
para a implantação da Alca (Área
de Livre Comércio das Américas)
provoca arrepios no Departamento de Estado americano;
5) Não custa, crê FHC, que o governo americano enxergue na
América Latina o risco de uma
aliança Brasil-Venezuela-Cuba,
impulsionada pelas relações
amistosas que Lula mantém com
Hugo Chávez e Fidel Castro;
6) Em reação, Bush não hesitaria, afirma o presidente, em priorizar o soerguimento econômico
da Argentina, hoje entregue à
própria sorte. Empreenderia esforço para estabelecer um contraponto geopolítico à liderança hemisférica do Brasil;
7) A ação militar dos EUA contra o Iraque, que FHC julga irreversível, irá submeter um eventual governo petista a desafios
ainda maiores. A cena econômica
internacional, já conturbada, tende a se turvar de vez. A insegurança crescerá junto com as cotações
do preço do petróleo;
8) Sob o comando de José Serra,
embora submetido às mesmas
adversidades, o Brasil atravessaria
a turbulência com mais facilidade. A preferência da banca internacional pelo candidato do governo atenuaria as desconfianças
quanto ao futuro da economia
brasileira;
9) FHC distribui palpites sobre a
condução da campanha de Serra.
Na sua avaliação, o amigo não pode se deixar levar pela estratégia
do PT, que tentará transformar o
segundo turno das eleições numa
disputa plebiscitária entre governo e oposição;
10) A seu juízo, o tucanato deve,
em contraposição, expor as contradições ideológicas do PT. Algo
que, de certo modo, o candidato
tucano já vem fazendo ao declarar
que, ao contrário do opositor, não
tem "duas caras";
11) Embora disposto a ajudar no
que for preciso, FHC cuida para
preservar o que classifica de
"comportamento de magistrado". Quer manter o comportamento que se espera de um presidente. O vocábulo que emprega é
"compostura";
12) FHC manifesta o desejo de
manter abertos os canais de interlocução com Lula. "Deixarei a
Presidência da República, não a
vida pública", afirma;
13) Considera-se detentor de
um "prestígio internacional" que
pode ser útil ao país no futuro, seja qual for o nome de seu sucessor. "Quero ajudar", adiciona. É
essencial, acredita, que Lula guarde uma boa impressão de sua
conduta, para que não recuse o
auxílio caso venha a ser eleito;
Pelo menos um dos interlocutores ouvidos pela Folha notou uma
ausência nos comentários de
FHC: a autocrítica. Em nenhum
momento o presidente incluiu
entre os fatores que contribuem
para a instabilidade do país a vulnerabilidade das contas nacionais. Nenhuma palavra, por
exemplo, sobre a dívida pública
de R$ 780 bilhões, em valores de
agosto.
É como se, na sua opinião, toda
volatilidade que se tem observado
fosse decorrente exclusivamente
da combinação do cenário internacional hostil com a percepção
de que Lula está na bica de tornar-se presidente.
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