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NO PLANALTO
Planalto tem R$ 4,8 mi para cartões de crédito
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Soube-se na semana passada
que a Casa Civil será dividida. As tarefas burocráticas ficarão com o Zé. A ação política,
com o Dirceu. Vai aqui um conselho para o camarada Dirceu: convém pedir ao companheiro Zé para dar uma espiada nos cartões
de crédito da Presidência.
Há muito gasto e pouca transparência. Coisa feia para um governo que retém pensões de fome
de aposentados nonagenários e
veta repasses monetários para escolas de crianças excepcionais.
Como você, caro leitor, o Planalto dispõe de cartões de crédito.
O dinheiro que paga os gastos
mensais sai, nos dois casos, do seu
bolso. A diferença é que a fatura
do seu cartão você vê e às vezes
não paga. E a conta do cartão da
Presidência você paga e não vê
nem às vezes.
Cartão corporativo governamental é coisa recente. Foi criado
(decreto de agosto de 2001) e regulamentado (instrução normativa de agosto de 2002) na gestão
FHC. Mas é na era Lula que vem
sendo utilizado à larga.
Diz-se que o governo Lula é
igualzinho ao de FHC. Não no
manuseio dos cartões. O petismo
gasta mais. Muito mais.
Nos cinco meses finais do tucanato, o Planalto pagou seis faturas de cartão de crédito. Custaram R$ 709 mil (média mensal de
R$ 141,8 mil). Nos dez meses iniciais de Lula, a Presidência bancou 50 faturas. Saíram por R$
2,875 milhões (média mensal de
R$ 287,5 mil).
As contas de novembro chegam
no dia 26. Estima-se que deve ser
rompida a barreira dos R$ 3 milhões. O Planalto empenhou até
dezembro de 2003 R$ 4,8 milhões
(média mensal de R$ 407 mil) para gastos com cartões.
A prática ganhou a Esplanada e
o Poder Judiciário. Tudo somado,
incluindo ministérios e tribunais,
os cartões de crédito de Brasília
aliviarão os cofres do Tesouro em
R$ 5,4 milhões até dezembro.
Todos os cartões foram emitidos
pelo Banco do Brasil. No caso palaciano, são geridos pela Secretaria de Administração da Presidência, apêndice da Casa Civil.
Repartição que, doravante, vai
merecer atenção exclusiva do
campanheiro Zé.
Rezam as regras que os cartões
devem ser usados na aquisição de
passagens aéreas e na compra de
materiais e serviços emergenciais,
de baixo custo. Na prática, bancam do aluguel de automóveis a
diárias de hotel.
Os portadores são funcionários
de denominação pomposa. Chamam-nos "ecônomos". Têm delegação para gastar em todo o território nacional.
Sob FHC, a fatura mais gorda
venceu em 26 de novembro de
2002: R$ 180.836,50. Sob Lula, o
gasto mais robusto veio numa fatura de 26 de maio de 2003: R$
516.226,66. Em junho de 2003, a
soma de dois cartões (R$
356.293,39 e R$ 304.667,61) custou ao erário R$ 660.961,00.
O que une os dois governos nessa matéria é o hermetismo das
despesas. Consultando-se o Siafi,
o sistema informatizado que registra os gastos governamentais,
descobre-se apenas o valor global
de cada fatura. Não há vestígio do
detalhamento dos dispêndios.
Nem sinal dos nomes dos autores
das despesas. Nada sobre a quantidade de cartões em circulação.
Ouvido, o Planalto informou
que os cartões "racionalizaram"
as despesas. Evitam que funcionários saiam às ruas com os bolsos fornidos. Cobrem despesas dos
gabinetes de Lula e dos ministros
que, como ele, despacham no Planalto. Aí incluídos o camarada
Dirceu e o companheiro Zé.
O grosso dos gastos está relacionado com "deslocamentos do presidente". Nada a ver com as viagens internacionais, custeadas
pelo Itamaraty.
Quanto à (falta de) transparência, mantiveram-se práticas do
governo anterior. Cabe ao TCU
(Tribunal de Contas da União) a
tarefa de "auditar os gastos". O
histórico não é tranquilizador.
Deu-se em agosto de 2001 a última visita dos auditores do TCU à
contabilidade da Secretaria de
Administração da Presidência.
Não havia ainda a novidade dos
cartões. Despesas de pequena
monta eram executadas em dinheiro vivo.
Detectaram-se de "compra de
alimentos e utensílios domésticos" à "construção de uma guarita". Fracionavam-se despesas para driblar a obrigatoriedade de licitação. Foi o que ocorreu em sucessivas aquisições de "material
para instalações telefônicas, [...]
em geral no mesmo conjunto de
empresas".
Bancaram-se pagamentos de
"diárias para funcionários em
serviço" aos sábados e domingos.
Houve quem dispensasse as diárias, mas não as passagens. Em
muitos casos não ficou "efetivamente comprovado" que os servidores "deslocaram-se a serviço da
Presidência".
Renata Zacarelli Lopes, por
exemplo, viajava semanalmente
de Brasília para São Paulo. Sua
missão oficial era a de "assessorar
o ministro Ângelo Andrea Matarazzo", seu chefe. Em compromissos que "envolviam o final de semana".
Os auditores recomendaram a
devolução do dinheiro. Levado ao
plenário do TCU, o relatório virou pó. Os ministros deram de
ombros para sugestões de punição. Limitaram-se a encaminhar
ao Planalto um conjunto de recomendações.
Aguarda-se com incontida expectativa a auditagem dos gastos
do governo do ex-PT, às voltas
com o mundo encantado dos cartões de crédito.
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