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DEBATE AGRÁRIO
Ex-presidente do Incra diz que já não há latifúndios improdutivos e que FHC fez assentamentos por pressão política
Desapropriação perdeu sentido, diz tucano
GUILHERME BAHIA
DA REDAÇÃO
A reforma agrária que distribui
terra aos sem-terra está ultrapassada. É o que diz o ex-deputado
federal pelo PSDB Xico Graziano,
presidente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária) em 1995, na gestão FHC.
Para Graziano, o campo se modernizou, e já não há latifúndios
improdutivos como no passado,
o que torna sem sentido uma política de desapropriações e transferência de propriedade da terra. A
seguir, trechos da entrevista.
Folha - Por que, no seu livro, o sr.
diz que se opõe à reforma agrária
na forma como ela é colocada hoje?
Xico Graziano - No livro, uso as
informações que existem para
comprovar que hoje a questão
agrária mudou. Na antiga questão
agrária, o problema era a existência de muita terra improdutiva. O
drama fundamental da questão
agrária de hoje está nos "com-terra". Está no emprego, a começar
pelo emprego de quem está produzindo, os trabalhadores com
terra. Precisamos fazer uma outra
reforma agrária. Classicamente
falando, nem é mais reforma
agrária. A reforma agrária clássica
significa redistribuir terra, tirar de
alguém para dar a outrem. Tudo
bem, então acabou a reforma
agrária, vamos fazer outra coisa.
Folha - O sr. acha então que uma
reforma agrária distributivista não
aumenta a produção agrícola?
Graziano - Não aumenta a produção e não ataca a miséria, nem
no campo e muito menos na cidade. É totalmente ineficaz.
Folha - Dados do Instituto de Terras do Estado de São Paulo mostram que no Pontal do Paranapanema houve aumento da arrecadação de impostos municipais onde
há assentamentos. Isso não mostra
que essa política é benéfica?
Graziano - O que é facilmente
comprovável é que [a implantação de assentamentos] movimenta mais o comércio, e a partir daí
acontecem outras coisas. Você
despeja milhões de reais em crédito subsidiado e a fundo perdido
para as famílias. Elas vão gastar.
Isso movimenta o comércio, e a
partir daí há uma arrecadação
maior. Mas não é devido ao aumento da produção rural.
Folha - Quer dizer, o resto da sociedade está bancando isso?
Graziano - É, está bancando. Mas
é fogo de palha, não é consistente.
Folha - O sr. já foi um defensor da
reforma agrária. O que mudou?
Graziano - Ao executar na prática a reforma agrária [no governo
José Sarney, de 1985 a 1990, quando Graziano também trabalhou
no Incra], nós não encontrávamos os latifúndios que pensávamos existir. Esse processo de modernização agrícola já tinha começado, e os latifúndios já estavam se modernizando.
Folha - Há economistas que dizem que a reforma agrária, mesmo
sem aumentar a produção, tem um
efeito distribuidor de riqueza que
aumenta o mercado interno e favorece a economia. O que o sr. acha?
Graziano - Não são bons economistas. A primeira coisa que um
economista faz numa política pública é ver a relação custo-benefício. É inequívoco que há os outros
efeitos. Agora, a qual custo social
ou a qual custo para o Tesouro? O
custo médio de assentamentos,
hoje, é de R$ 50 mil. Em São Paulo, R$ 80 mil. É muito oneroso.
Folha - No livro, o sr. diz que Fernando Henrique Cardoso compartilha da sua visão sobre a questão
agrária. Porém, o governo dele assentou mais de 300 mil famílias.
Graziano - Ele não conseguiu
condição política para rever o que
estava sendo feito. O dinamismo
da política impediu que essa revisão de conceitos, ou de modelos,
pudesse ser feita. [No livro] eu insinuo que, paradoxalmente, este
governo [o de Lula] é que pode ter
a chance de fazer isso. E está fazendo, em certo sentido.
Folha - Mas muitas superintendências do Incra são ocupadas por
integrantes do MST. Isso não mostra que o governo acredita na reforma agrária distributivista?
Graziano - Eu diria que é uma
contradição dentro do Incra. Como o governo resolve isso, eu não
sei. Você tem o Plínio de Arruda
Sampaio [economista que coordenou o Plano Nacional de Reforma Agrária, com a proposta de
que Lula assente 1 milhão de famílias até 2006] e sua equipe, que se
alinham totalmente ao MST e à
CPT [Comissão Pastoral da Terra], você tem uma linha mais racional, que faz mais contas, que
hoje é representada pelo próprio
presidente do Incra [Rolf Hackbart], e você tem uma componente claramente social-democrata
dentro do governo do PT que
pensa como eu estou pensando.
Folha - Quem são esses?
Graziano - Você conclua.
Folha - Como o sr. vê a declaração
do secretário-executivo do Incra,
Guilherme Cassel, de que a medida
provisória que proíbe vistorias em
terras invadidas não é eficaz?
Graziano - Então o governo precisa ter a coragem de revogar. Não
tem coragem de revogar e não
tem coragem de fazer cumprir? É
impossível governar assim.
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