|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LAVOURA ARCAICA
Segundo a organização, sucroalcooleiros não avançaram como o resto do país; produtores dizem estar lutando contra essa imagem
OIT vê mais ações antiescravidão, mas critica setor da cana
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DAS REGIONAIS
O país evoluiu nos últimos dois
anos nas ações de combate ao trabalho escravo, mas o setor sucroalcooleiro não acompanhou
essa evolução, avalia Patrícia Audi, coordenadora nacional do
Projeto de Combate ao Trabalho
Escravo no Brasil, da OIT (Organização Internacional do Trabalho). ""Somente no ano passado, o
Ministério Público Federal apresentou 36 denúncias-crime. O
maior incentivo à exploração do
trabalhador era a impunidade,
mas esse quadro está mudando."
Audi compartilha com os produtores de açúcar e álcool a avaliação de que o Brasil corre risco
de perder mercados se o país for
acusado de dumping social por
nações importadoras.
O diretor técnico da Unica
(União da Agroindústria Canavieira de São Paulo), Antonio de
Padua Rodrigues, afirma que o
setor está tentando se livrar da pecha de explorar a mão-de-obra.
Rodrigues diz que, há dois meses, a Unica foi ao Parlamento do
Reino Unido e ao PV (Partido
Verde) alemão tentar convencer
os europeus de que o setor não
pratica dumping social ou ambiental. ""Acham que a gente desmata a Amazônia e mantém escravos para produzir açúcar", diz.
O coordenador da Pastoral do
Migrante no Estado, Jadir Ribeiro, diz que há um fenômeno novo. A cada ano, trabalhadores de
Estados cada vez mais distantes
vêm para São Paulo colher cana.
""Antes eles eram do sul da Bahia e
do Vale do Jequitinhonha [norte
de Minas Gerais]. Agora, há gente
do Maranhão e do Piauí."
Se para a Unica somente 10%
dos cortadores de cana são migrantes, para a pastoral, que faz a
avaliação com base nos relatórios
de seus núcleos espalhados pelo
Estado, o número é bem maior,
cerca de metade deles.
Uma amostragem feita pela
pastoral com 367 famílias do Nordeste que já haviam voltado às
suas cidades de origem após trabalhar em São Paulo revelou: somente 15% conseguiram deixar o
serviço espontaneamente, sem dívidas ou ameaças.
Uma forma de os empregadores
driblarem a fiscalização, diz o
coordenador da pastoral, é manter os alojamentos no meio dos
canaviais. ""Pegamos um caso em
que, por falta de comida, o trabalhador andava 10 km para comprar bolacha."
O presidente do Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Catanduva, Walter Hipólito, relata um
caso de quase tráfico humano.
Em março, um ônibus chegou
de Pernambuco a Catanduva (SP)
com cerca de 30 trabalhadores. O
motorista começou a procurar
""gatos" com a seguinte oferta: por
R$ 150, ele ""venderia o passe" dos
trabalhadores.
""Se o "gato" concordasse, ficava
com o passe e uma nota promissória de R$ 150 assinada pelo cortador. Ficamos sabendo, pusemos fogo nas notas promissórias
e libertamos o pessoal."
No Estado de São Paulo, os trabalhadores geralmente chegam
em ônibus clandestinos fretados,
em grupos de 30 a 50 pessoas, vindo por estradas secundárias e
pouco fiscalizadas. Na cidade origem, eles são amealhados pelos
"gatos", que fazem os primeiros
contatos em bares da periferia.
A Pastoral do Migrante diz ter
localizado neste ano 66 alojamentos no meio de canaviais e estima
haver 15 mil migrantes em cidades-dormitórios, como Novais,
Catiguá e Santa Adélia.
Texto Anterior: Personagem: Família sofre abuso, deixa SP, mas retorna Próximo Texto: Frases Índice
|