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NEO-OPOSIÇÃO
José Roberto Afonso diz que PT sofre com falta de credibilidade no mercado e não sabe como "reformar a casa"
Economista do PSDB nega "herança maldita"
DA REPORTAGEM LOCAL
O economista José Roberto
Afonso, coordenador da parte
econômica do documento do
PSDB que faz críticas à gestão Lula, avalia que o PT está pagando
pela falta de credibilidade no mercado internacional. Para ele, o PT
foi eleito para "reformar a casa",
mas não sabe como fazer essa tarefa. "Essa era a proposta não só
do Lula como do [José] Serra",
completa Afonso, que também
coordenou o programa do então
candidato tucano à Presidência.
Afonso defende o que chama de
avanços obtidos pelo governo
FHC e desvincula qualquer dificuldade enfrentada pela atual
equipe econômica da herança
deixada pelos tucanos.
"É fácil dizer que não repetiríamos esses passos, mas não sei até
onde isso ajuda. Nós perdemos a
eleição. Acho que podemos mostrar as alternativas." Leia abaixo a
entrevista.
(JULIA DUAILIBI e LILIAN CHRISTOFOLETTI)
Folha - Quais as principais críticas
do PSDB em relação à política econômica do PT?
José Roberto Afonso - O presidente prometeu o espetáculo do
crescimento, mas o que se viu, lamentavelmente, é a situação inversa: o espetáculo da recessão.
Há uma piora muito acentuada
nos indicadores de produção e de
emprego do país. Muitos economistas, até a gente, estão alertando para a dosagem dos juros. Isso
não é a continuidade da política
econômica anterior.
Você até pode estar usando os
mesmos instrumentos, mas numa graduação muito diferente. A
taxa de juros real projetada pela
economia brasileira, levando em
conta a inflação futura, é a maior
no país desde 99, quando houve
uma crise cambial. Os problemas
do começo deste ano foram
oriundos das incertezas da campanha eleitoral. Preocupa ainda a
questão do desemprego. Vemos
que o governo não tem política
para combatê-lo.
Folha - Para o PT, isso é fruto da
política econômica de vocês.
Afonso - Esse governo lembra
um adolescente que acabou de tirar a carteira de motorista e, de repente, cai no meio de uma estrada
e não sabe o que fazer. São duas as
reações: olhar no retrovisor e pisar no freio. Para a gente, é fácil dizer que não repetiríamos esses
passos, mas não sei até onde isso
ajuda. Nós perdemos a eleição.
Acho que podemos mostrar as alternativas: dosar os juros, enfrentar a questão externa por meio da
reforma tributária.
Não acho que há herança maldita. Se houvesse, não estaríamos
ganhando tantos prêmios internacionais, não chegaríamos ao segundo turno. Durante a transição,
não me lembro de ninguém falar
em herança maldita. E lá eles conheceram detalhes do governo
que nem eu conhecia.
Folha - É fácil falar quando se está
na oposição. Durante a gestão FHC,
o país cresceu a taxas medíocres e o
desemprego aumentou.
Afonso - Fácil era o que o PT fazia. Nós não vamos fazer o que
eles faziam. O nosso papel é criticar e apontar alternativas. Durante a gestão FHC, temos de lembrar
que o crescimento foi tolhido por
uma sucessão de crises internacionais que não estão ocorrendo
agora. Do ponto de vista econômico, o governo arrumou a casa.
E nisso ele teve sucesso. Consolidou a estabilidade da economia,
reduziu a inflação, fez reforma estrutural. Precisava de mais, precisava. Mas partindo da casa arrumada, vamos reformá-la. Essa era
a proposta não só do Lula como
do Serra. O que vemos hoje é que
o PT não sabe como reformar a
casa e nesse sentido até economistas históricos do partido falam a
mesma coisa.
Folha - O governo FHC levou oito
anos para arrumar a casa? Não é
muito tempo?
Afonso - Não. Você fez uma arrumação de casa conjuntural e estrutural. O Plano Real foi uma arrumação importante depois de 30
anos de inflação. Conseguimos,
pela primeira vez, sem quebrar
contrato, estabilizar. Avançamos
nas reformas institucionais, como
as desestatizações, fizemos a Lei
de Responsabilidade Fiscal. Na
política social, não adotamos paternalismos. Talvez seja por isso
que a população não reconheça o
que se fez nessa área.
Folha - O fato é que existiam restrições quando o governo assumiu.
Afonso - Você exagerou na dose
dos juros. Mesmo quando precisava aumentar os juros para combater a inflação, em decorrência
do câmbio, e, depois, das incertezas eleitorais, não precisava elevar
tanto nem por tanto tempo. E o
resultado é que, mesmo quando
já havia indicadores de deflação, a
taxa de juros continuou elevada.
Aumentaram a meta de superávit
sem que o FMI tivesse pedido. Esse é o custo que o PT tinha de pagar pela falta de credibilidade junto ao mercado. Agora precisa, a
curto prazo, tomar medidas firmes que melhorem o resultado
externo, que seja permanente e
não dependente de câmbio. Daí a
reforma tributária.
Folha - Por que existe esse ceticismo em relação ao "espetáculo de
crescimento"?
Afonso - Essa agenda era a agenda antiga, que nem servia mais a
FHC. Era agenda para arrumar
casa, que já foi arrumada. Precisa
de algo mais, que é o que não estamos vendo. Precisa de choque externo muito grande. Até hoje não
trataram com governadores pacto para aumentar exportações.
Não pode exportar como alternativa ao mercado interno que está
ruim ou porque o câmbio subiu.
Precisamos de medidas estruturais, estradas, pesquisas. Precisamos aumentar o crédito imediatamente. O dos bancos públicos
caiu, mas o dos privados caiu
mais ainda.
Folha - Nada melhorou?
Afonso - O governo conseguiu
melhorar os indicadores de inflação. Ótimo, parabéns. O risco
país. Ótimo, parabéns. Mas volto
ao ponto. Vai cair a taxa de juros?
Acho que vai. Impossível subir.
Mas não adianta ter juros mais
baixos se as empresas e as pessoas
não têm acesso ao crédito. O drama maior não é a taxa de juros,
mas o crédito.
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