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São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 2003

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ESPERANÇA X MEDO

Mudança brusca de modelo provocaria impeachment, diz filósofa

Alta dos juros é aceitável, diz Chauí

DA REPORTAGEM LOCAL

A professora do departamento de filosofia da USP Marilena Chauí, ligada ao PT, afirmou que considerava aceitável a última elevação da taxa básica de juros determinada pelo Banco Central porque não quer "que haja impeachment" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
"Qualquer tentativa de sair do modelo neoliberal da noite para o dia provocaria o impeachment", disse ela na última quinta-feira, após participar de debate sobre a "mercantilização da educação", em auditório da USP.
Durante o debate, do qual também participou o professor licenciado de física da USP Otaviano Helene -atual presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão vinculado ao Ministério da Educação-, Chauí defendeu a saída gradual do atual modelo de política econômica.
"Estamos com esse modelo [econômico] implantado exatamente há dez anos. Não é possível que em 35 dias se espere de um governo que ele desmonte um modelo implantado durante dez anos. Precisa ter cuidado."
Chauí defendeu a decisão do BC sob o governo Lula de aumentar a taxa básica de juros de 25,5% para 26,5% para conter a inflação e disse não haver alternativa à atual política econômica a curto prazo.
"Por enquanto, não tem jeito, porque o modelo colocou o Brasil numa dependência internacional jamais vista. Não precisa ter uma tempestade lá fora para acontecer alguma coisa, soprou uma brisa lá fora você tem consequência aqui", afirmou.
"Não tem jeito. Fomos lançados nessa total subordinação. E eu não quero que haja impeachment. Quero que o Lula governe. Portanto é preciso que haja um período no qual se possa perceber que ele é capaz de realizar o projeto social."

Autonomia do BC
A professora de filosofia, no entanto, disse concordar com as críticas do sociólogo Francisco de Oliveira à possível autonomia do Banco Central, uma das reformas prioritárias para o governo federal. Oliveira afirmou em entrevista à Folha, após aula magna na USP, que a autonomia do BC significaria esvaziar o sentido de mudança contido na eleição do presidente Lula.
Para Chauí, "a ênfase de Chico de Oliveira contra a autonomia" do BC se justifica pelo fato de que "a luta democrática e republicana está demarcada agora pela luta pelo fundo público [recursos do Estado]".

Intelectuais do PT
Mas disse que os intelectuais do PT enfrentam "um problema gravíssimo": "Chico [de Oliveira] tem dito isso, [o sociólogo] Emir Sader tem dito isso. [Que] a nossa função é gritar, ser contra, criticar, fazer tudo isso que temos que fazer porque é necessário para um governo democrático. Mas ninguém sabe como se sai do modelo neoliberal".
Segundo a secretária de Cultura na gestão de Luiza Erundina (então no PT) à frente da Prefeitura de São Paulo, "seremos os primeiros no planeta a sair do modelo".
"Vai ser complicado porque a gente não sabe como sai. Nós vamos inventar o jeito que sai. O que significa que vamos errar. Vamos errar muito para sair, mas é isso que vai fazer a nossa grandeza: se daqui a quatro anos o modelo estiver efetivamente terminado", disse ela.
Chauí disse que o presidente não vai simplesmente "tentar" sair do atual modelo econômico. "Não é a tentativa: é a obrigação de sair do modelo. Foi para isso que ele foi eleito. Vai ser dificílimo." (RAFAEL CARIELLO)


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