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CONTRA OS RADICAIS
Demais, de menos e na conta
FÁBIO WANDERLEY REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA
O governo FHC pode ser
criticado por seu realismo
excessivo. Eleito em circunstâncias singularmente favoráveis,
Fernando Henrique abriu mão do
necessário investimento intelectual e acomodou-se de maneira
preguiçosa e autocomplacente
aos imperativos reais e aparentes
da cena mundial.
O governo petista de Lula começou rodeado de dificuldades várias. Além do que há de real nos
constrangimentos do quadro econômico-financeiro mundial e da
herança "fernandista" de inserção
vulnerável nele, há a própria origem revolucionária do partido e
as expectativas que suscitava.
Na perspectiva dessa dificuldade, é bom lembrar que o Lula do
discurso de 1987 não ganhou a
eleição presidencial, e se ganhasse
provavelmente não governaria
muito tempo.
E cabe festejar o aprendizado
que desemboca na moderação e
no realismo da última campanha
eleitoral e do começo do governo
atual, capazes de neutralizar as
ameaças mais imediatas e dramáticas que cercavam o acesso de
Lula à Presidência.
Reconhecida a necessidade do
realismo, fica, para a avaliação da
atuação dos chamados "radicais"
do PT, a questão dos limites do
realismo e de como combiná-lo
com a fidelidade a princípios e
idéias que ajudou a singularizar o
partido até aqui. Obviamente, não
se trata, para o governo, de quatro
ou cinco meses de encenação para
enganar investidores e depois "fazer a revolução" (da mesma forma que não parece haver razão
para tomar coisas como a oposição à contribuição de inativos como dogma de fé esquerdista). Os
constrangimentos reais de vários
tipos que o governo Lula defronta, incluídos os relativos à democracia como valor verdadeiro, exigem redefinição mais profunda
das idéias e compromissos antes
impensáveis.
Mas há, sim, a necessidade de
que se possa contar com melhor
equilíbrio do que temos tido sempre entre princípios e realismo,
ideologia e pragmatismo. E, se os
"radicais" do partido podem ter
papel positivo a cumprir aqui
(desde que não se transformem
em quinta-coluna, caso em que
não haverá alternativa senão excluí-los), o governo precisa estar
atento à possibilidade de que o
realismo degenere em acomodação preguiçosa ao estilo de Fernando Henrique Cardoso. Como,
aliás, adverte ponderado documento da Fundação Perseu Abramo ("Os caminhos da transição"), um encorajador indício do
empenho de reflexão interna.
FÁBIO WANDERLEY REIS, cientista político, é professor emérito da UFMG e autor de "Mercado e Utopia" (Edusp).
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