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NO PLANALTO
Jovem destemido ou
Bonaparte do sertão
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Autoritário ou enérgico? Arrogante ou determinado? Imprudente ou corajoso?
O estilo de liderança a que se
propõe Ciro Gomes constitui um
enigma.
José Serra apregoa que as primeiras alternativas são as verdadeiras. Ciro seria truculento,
aventureiro, "desprovido de
equilíbrio mental".
Com um pé no segundo turno,
Ciro calibra o discurso. Tenta
provar que as segundas opções
são as corretas. Seria brioso e arrojado. Mas não insensato.
O embate foi levado ao horário eleitoral por um Serra disposto a travessuras compatíveis
com a sua estatura de Garotinho. Mas já havia transbordado
do ambiente dos comitês de
campanha para rodas mais politizadas do eleitorado.
À falta de coisa melhor para
festejar, os marqueteiros de Serra celebram o "estancamento"
da trajetória ascendente do rival nas pesquisas. Cautelosos,
aliados de Ciro o aconselharam
a moderar o linguajar.
O rol de conselheiros inclui de
Tasso Jereissati a Antonio Carlos Magalhães. Sim, até ele, o
babalorixá da malvadeza, acha
que Ciro deve medir os vocábulos, para não submeter a riscos
desnecessários a posição que ostenta nas pesquisas.
Abra-se um parêntese para
lembrar que ACM se notabilizou pela crítica contumaz ao estilo acomodatício de FHC. Peitou a autoridade presidencial a
mais não poder. Até debaixo do
teto do Alvorada.
Como em maio de 1999, num
encontro testemunhado por Pimenta da Veiga, Jorge Bornhausen e Marco Maciel. FHC
cobrava coesão dos aliados.
"Tudo bem, mas você precisa se
ajudar", alfinetou ACM.
O presidente saltou da cadeira: "Como assim?". E ACM: "O
seu estilo está superado. É preciso mais ação". FHC se eriçou:
"Com esse meu estilo ganhei
duas eleições".
ACM persistiu: "O Getúlio ganhou três e terminou dando um
tiro no peito". E FHC: "Eu não
tenho o seu jeito. Não sou brigão. Nem por isso fujo da responsabilidade. Combati a Oban
em São Paulo. Fui encapuzado,
interrogado".
Antes que Bornhausen e Maciel providenciassem panos
quentes, ACM ainda disse: "Isso
não me impressiona, presidente.
Nessa época eu dava tapa em
general". Referia-se a entrevero
que teve, em 1965, com o general
João Costa.
Era deputado federal pela
Arena. O general, que comandava a 6ª Região Militar, em
Salvador, acusou-o de espalhar
boatos sobre um caso extramatrimonial que jurava inverídico.
Encontraram-se na sede do governo baiano. Deu-se num pequeno elevador o ápice do sururu. Sob os olhos esbugalhados de
Lomanto Júnior, então governador da Bahia.
Enfezado, o general se dirigiu
a ACM com o dedo em riste e a
voz no teto. ACM golpeou-lhe o
quepe, lançando-o ao chão. Minutos depois, isolados numa sala do Palácio da Aclamação,
ACM contou ao desafeto que
ouvira sobre sua suposta amante dos lábios de outro general:
Ernesto Geisel, então chefe do
Gabinete Militar de Castelo
Branco. Fecha parêntese.
Suponha-se, apenas para efeito de raciocínio, que a cena de
1999, em Brasília, tivesse não
FHC, mas Ciro na pele de presidente. Talvez o poder de persuasão de Maciel e Bornhausen fosse insuficiente para evitar que
as paredes do Alvorada testemunhassem uma histórica cena
de pugilato envolvendo duas almas mercuriais. Almas que,
eleito Ciro, estarão condenadas
à convivência.
Ao recolher os farrapos do
Centrão que FHC foi deixando
pelo caminho, Ciro chega às
portas de Brasília enrolado numa colcha de apoios que mistura, em tormentosa fraternidade,
gregos e baianos, Robertos para
todos os gostos -de Jeffersons a
Freires. Eleito, terá uma usina
particular de conflitos.
De resto, a exposição ao contraditório é indissociável da
Presidência da República assim
como a ignição instantânea é
inseparável do DNA de Ciro.
Cabe ao candidato mostrar-se
disposto à civilizada fricção de
pontos de vista.
Geisel, o último presidente forte que os brasileiros conheceram, dispunha de ferramenta
que o eximia da costura de bases congressuais: o AI-5. Fernando Collor, o último a confundir
"aquilo roxo" com força, teve
fim conhecido.
Ciro leva sobre Collor vantagens que desautorizam comparações fáceis: tem uma biografia
a exibir, e dela não consta que
seja dado ao furto. Tampouco
há em seu histórico os elogios a
Hugo Chávez que pendem da ficha de Lula da Silva.
Mas não será chamando fotógrafos de babacas ou mandando às favas o mercado que sedimentará a imagem de um líder
confiável. A legítima onda de
questionamentos aos candidatos vai aumentar. Nesse jogo,
não há perguntas embaraçosas,
só respostas constrangedoras.
Ciro pode continuar dizendo
que a imprensa é governista e
conspira a favor de Serra.
Quem acompanha o noticiário de certas publicações talvez
lhe dê razão. Mas fica entendido
que o lero-lero não o livrará do
convívio com a contradita.
Preferindo a bajulação fácil,
viverá melhor se voltar para Sobral. Lá, como revelou o repórter César Felício, o prefeito Cid
Gomes, seu irmão, patrocinou, a
expensas do erário municipal, a
edição do livro da estudante
Maria Cristina Fernandes Melo.
Chama-se "Ciro Gomes por
Excelência - Síntese da Vida Pública do Maior Benfeitor da História Política do Ceará de Minha Geração". Sopa igual não
vai ter. A menos que, vitorioso,
nomeie El Cid para a vaga de
ministro da Cultura.
Do fundo do guarda-roupa:
Ricardo "no limite da irresponsabilidade" Sérgio, o caixa de
campanhas do grão-tucanato,
está na bica de virar estrela no
palco eleitoral. É como diz Ciro
Gomes: "Se é para rasgar roupa,
vamos rasgar". Do lado de Serra, buscam-se peças novas de
vestuário em Harvard. A campanha promete.
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