|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Ministro do Trabalho atribui aumento do número das pessoas que procuram emprego à queda da renda em 2002
"Não sou ministro paliativo", diz Wagner
MARCIO AITH
EDITOR DE DINHEIRO
O ministro do Trabalho, Jaques
Wagner, 52, admite que os primeiros meses do governo Lula,
marcados por medidas econômicas restritivas, não foram propícios à geração de empregos.
"Adotamos um modelo com a
preocupação de não permitir que
se desorganizasse a economia",
disse ele em entrevista à Folha. "E
é óbvio que esse modelo tem dois
lados...É óbvio que, nesse aspecto,
o modelo não contribui."
Apesar disso, Wagner sustenta
que uma das razões para o aumento no número de brasileiros
procurando emprego foi a queda
da renda durante o último ano do
governo anterior.
Com menos dinheiro em casa,
mais pessoas foram trabalhar para manter o padrão de vida. O ministro citou vários esforços oficiais para reduzir o desemprego
no Brasil, mas reconheceu que, se
o país não voltar a crescer, todos
fracassarão. "Se o êxito da primeira etapa não tiver como consequência o retorno do investimento e o crescimento econômico, o
esforço terá sido inútil."
Wagner disse que não ingressou no governo para ser uma espécie de "ministro paliativo". Segundo ele, o emprego deve ser
uma das "variáveis" principais da
política econômica.
Folha - A política econômica do
presidente Lula adicionou 287 mil
novos desempregados às estatísticas, se compararmos o começo do
governo ao primeiro semestre de
2002. Não são dados inquietantes
para um governo que prometeu
criar 10 milhões de empregos?
Jaques Wagner - Qualquer desemprego é preocupante, nem
que seja de uma só pessoa. E aí
não estou falando só da questão
do dinheiro. Refiro-me ao fato de
o desempregado não se sentir útil
na sociedade. É um drama para
qualquer pessoa. Do ponto de vista do governo Lula, é preciso lembrar que a economia não se interrompe quando um governo novo
é eleito. Ela é uma continuidade.
Nós tivemos, no ano passado,
uma perda de 14% da renda em
consequência da inflação. Esse
dado, por si só, obrigou as famílias a colocar mais membros atrás
de empregos para complementar
a renda familiar. Isso explica, em
parte, por que os dados, desde janeiro, apontam para uma subida
da ocupação e, ao mesmo tempo,
para uma subida do desemprego.
Ou seja, temos mais gente ocupada e, ao mesmo tempo, mais gente desempregada, porque quem
está ocupado está ganhando menos do que ganhava antes. Além
disso, houve também a expectativa de um governo novo e, portanto, esperança nova. Pessoas que
tinham abandonado a procura
voltaram a buscar emprego.
Folha - O sr. disse que a economia
não se interrompe quando um governo novo é eleito. Mas Lula foi
eleito justamente para interromper os efeitos negativos de um modelo econômico. Quais ações o governo está tomando para cumprir
essa promessa?
Wagner - A primeira ação foi
controlar a inflação, medida que
corta a perda salarial. Com inflação menor, fica mais fácil a negociação salarial entre trabalhadores e empresários para recuperar
essa perda -ou parte dessa perda. A primeira ação do governo
foi organizar a economia e reduzir a inflação. Tivemos sucesso
nisso. Também estamos fazendo
várias ações pontuais na alavancagem do investimento produtivo e da geração do emprego. Aqui
citaria a agricultura familiar, o
Pronaf [Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura
Familiar], onde colocamos R$ 5
bilhões, o microcrédito e a microfinança. Estamos ajudando pessoas de faixas salariais mais baixas a ter acesso ao financiamento,
o que, consequentemente, alavanca o consumo e melhora a
economia. Tivemos as ações do
FAT [Fundo de Amparo ao Trabalhador], que dará R$ 5,3 bilhões
a diversos programas de turismo,
de habitação e de revitalização de
centros históricos. Assim, estamos focando os segmentos que
são mais geradores de empregos.
O programa do primeiro emprego foca nisso também. A expectativa é atender aproximadamente
90 mil jovens ainda neste ano.
Folha - O sr. acredita sinceramente que esses programas vão gerar
postos de trabalho sólidos num
ambiente de restrição ao crédito,
aperto fiscal e estagnação?
Wagner - Não somos vendedores de ilusão. O problema do desemprego é o maior drama social
da humanidade neste começo de
terceiro milênio. Digo da humanidade porque ele está presente
em todos os países, desenvolvidos
ou não. Os Estados Unidos estão
com as taxas mais altas de desemprego em anos. Esse é um problema cuja matriz, na minha opinião, está no modelo econômico
preponderante hoje, que é o modelo de globalização excludente.
Folha - Cite uma medida que o
governo está tomando para se contrapor a esse "modelo de globalização excludente".
Wagner - Economia, como a
medicina, não é uma ciência exata. Concordo que adotamos um
modelo com a preocupação de
não permitir que se desorganizasse a economia completamente, e é
óbvio que esse modelo tem dois
lados. Para fazermos isso, restringimos o Orçamento e o investimento público. E é óbvio que,
nesse aspecto, o modelo não contribui. Mas a economia não trabalha com uma só variável, seja ela
juros altos, inflação, taxa de câmbio ou restrição orçamentária.
Estamos tentando encontrar o
equilíbrio para ter o menor preço
social num processo de arrumação. Mas não acho que o Brasil
saia desse ciclo isoladamente. Estamos tentando rompê-lo com a
posição do presidente da República, de líder mundial. Estamos
preparando a Conferência dos
ministros do Trabalho das Américas, para setembro, no Brasil.
Vamos assumir a presidência. O
foco da discussão é a globalização
e a exclusão.
Folha - Não seria mais útil reunir
ministros da Fazenda nesse fórum,
já que são eles, e não vocês, os únicos ministros com poder e recursos
em países que passam por ajustes,
como o Brasil?
Wagner - Esse era o script anterior. Agora quero dizer que quem
manda é o presidente da República. Ele toma a decisão final e é óbvio que, no mundo inteiro, há
uma tensão entre ministérios da
área social e o da Fazenda. Rejeito
a hipótese de ser um ministro para tratar das consequências negativas de decisões da Fazenda.
Folha - O senhor então não é um
ministro paliativo?
Wagner - Não, não sou um ministro paliativo. Não foi para isso
que vim ao governo. Estamos trabalhando para que o emprego e a
renda sejam variáveis tão importantes quanto as outras dentro
das decisões de governo. Caso
contrário, é como você falou: se
eu não fizer isso, fico somente responsável para cuidar das consequências negativas.
Folha - O senhor mencionou o fato de a ocupação ter aumentado
durante o governo Lula, juntamente com o desemprego. De fato, houve aumento da ocupação. Mas 68%
desse aumento deu-se em áreas
precárias: trabalhadores sem carteira assinada, por conta própria,
subocupados...
Wagner - Não contesto esse dado, mas os números do Caged
[Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados], que é o sistema
público de intermediação do Ministério do Trabalho, registram,
nos primeiros seis meses do ano,
um saldo líquido, positivo, de
mais de de 500 mil novas carteiras
assinadas. Nem todas essas carteiras são novos empregos. Dentro
disso, você tem também a ação da
fiscalização do Ministério do Trabalho, que, na minha opinião, é
mais eficaz do que a anterior. Portanto aproximadamente 150 mil
são trabalhadores que já estavam
na informalidade e que, pela ação
da fiscalização, foram legalizados.
Mas houve um saldo líquido positivo nos empregos formais.
Folha - Mas o sr. concorda que o
aumento da ocupação se deu basicamente em áreas precárias?
Wagner - Concordo, mas, se você verificar essa mesma pesquisa
do Caged, verá que os empregos
no setor do agronegócio, comparados com dezembro de 2002, tiveram acréscimo de 17%. Houve
um deslocamento dos empregos.
O setor econômico que mais está
puxando é o agronegócio.
Folha - Mas o trabalho rural é um
dos mais informais...
Wagner - É verdade, ele agrega
muita gente do trabalho informal
porque é sazonal. Tem o cidadão
que vai para a colheita. Mas há
outros esforços. Há medidas que
eu acho que vão produzir resultados. Por exemplo, na Petrobras,
empresa da qual sou conselheiro,
há o investimento nas plataformas, que foram nacionalizadas
-pelo menos parte delas. Estamos em fase final de licitação para
a construção. Estamos investindo
em segmentos que dão maior retorno à geração de emprego.
Folha - O sr. concorda que, se não
tiver crescimento, todos esses esforços vão ser tragados pelo efeito
colateral do ajuste, ou da arrumação, como o sr. diz?
Wagner - Não tenho a menor
dúvida. Na verdade, tínhamos o
cenário de 1º de janeiro. Poderíamos ter feito duas apostas. Ou renegociávamos a dívida brasileira
e, eventualmente, chegaríamos ao
caos, à desarrumação total, ou tomávamos a decisão que acabamos tomando. Falamos: "Vamos
ter que fazer um ajuste duro para
arrumar as contas do Brasil". Tivemos êxito nesse aspecto.
Agora, concordo com você: se o
êxito da primeira etapa não tiver
como consequência o retorno do
investimento e o crescimento
econômico, o esforço terá sido
inútil. Estamos numa lógica de
mercado, numa economia globalizada. Estamos fazendo uma
aposta com segurança. Mas vocês
têm que registrar, ao mesmo tempo, o fato de o FAT nunca ter liberado tanto dinheiro para um investimento produtivo quanto
neste ano. O presidente Lula faz
questão de garantir que esses recursos cheguem ao destino. Falo
como participante de todas as
reuniões. O Banco do Brasil está
construindo o Banco Popular do
Brasil para capilarizar o crédito.
Autorizamos também cooperativas de crédito abertas. Estamos
desburocratizando, eliminando
dificuldades. Nas áreas de microcrédito e de microfinança, bastará
ao cidadão chegar ao banco, dizer
o nome, endereço e pegar o dinheiro. Isso é inédito.
Texto Anterior: De uma vez, 15 empresas demitem 2.800 Próximo Texto: Frase Índice
|