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GENOINO
Condecorado pela Marinha e Aeronáutica, petista, que lutou no Araguaia e foi preso, reviveu Marx em seu 1º discurso como deputado
De coroinha a guerrilheiro, Genoino flerta com militares
EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA
FÁBIO VICTOR
XICO SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL
Do guerrilheiro Geraldo, ironicamente o codinome usado no
Araguaia, ao parlamentar especializado em defesa e candidato
que escolheu a segurança pública
como prioridade, José Genoino,
56, concorrente do PT ao governo
paulista, sempre gostou de andar
em campo minado.
O jovem que, em 1970, desembarcou aos 24 anos no Araguaia
para se juntar aos colegas do PC
do B, sendo preso dois anos depois, tornou-se o petista que mais
trânsito tem entre os militares,
seus ex-algozes, e um político obcecado por segurança, a ponto de
gravar um comercial para o horário eleitoral sendo alvejado por tiros dentro de um carro blindado.
Caso perca as eleições para Geraldo Alckmin (PSDB), Genoino
-nascido em Quixeramobim
(CE) e coroinha na infância- é
cotado para assumir o Ministério
da Defesa de um eventual governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
À primeira vista, a explicação
para o ex-guerrilheiro flertar com
os militares está no processo de
abrandamento de suas idéias ao
longo dos últimos 30 anos -mas
as causas vão além disso.
"Os guerrilheiros eram excelentes combatentes, porque tiveram
uma formação militar clássica,
baseada em Clausewitz [ideólogo
da guerra de guerrilha] e nas
guerras prussianas. O Genoino tinha tanto conhecimento militar
que seria difícil desprezar essa bagagem", interpreta o jornalista
Fernando Portela, autor de
"Guerra de Guerrilhas no Brasil
-A Saga do Araguaia", obra básica
sobre um dos principais episódios da luta armada no país.
"Ao chegar ao Congresso [em
1982], eu não poderia ser o ex-guerrilheiro, um deputado folclórico. Levei em conta o meu passado, mas avancei, construí uma relação ampla e cordial, inclusive
com os militares", disse Genoino
à Folha. Mas o comunismo ainda
predominava. Seu primeiro discurso no plenário tinha o emblemático título de "Marx Vive".
Nos últimos anos, o hoje candidato sempre tem sido acionado
para mediar crises de segurança e
conversar com militares. Já recebeu a condecoração máxima da
Marinha e da Aeronáutica.
Os militares, em troca, lhe devotam respeito. "O Genoino é um
sujeito preparado. Passado é passado, zero a zero e bola no centro", afirma o general reformado
Newton Cruz, ex-chefe da Agência Central do SNI (Serviço Nacional de Informações) e do Comando Militar do Planalto no governo
Figueiredo, que votará em Lula.
Mas o futuro de Genoino, caso
derrotado, não se resume apenas
à pasta da Defesa ou até mesmo à
Secretaria Geral da Presidência.
Pode também ocupar a presidência do PT, substituindo José Dirceu, que deve ser o homem-forte
de Lula num eventual governo.
Histórico para o cargo não lhe
falta. Nos momentos de dificuldade, o negociador Genoino aparece, como se recordam antigos
companheiros de prisão. Quando
policiais entravam na cela para
ofendê-lo, o atual candidato petista agia de forma desconcertante.
Em vez de discutir, Genoino puxava o coro de uma canção de Dorival Caymmi: "Minha jangada
vai sair pro mar, vou trabalhar,
meu bem-querer, se Deus quiser
quando eu voltar do mar...".
Isso não significa, porém, que
ele tenha se privado de conflitos
partidários. Desde que foi capturado pelos militares, em 72, a relação de Genoino com o PC do B,
seu primeiro partido, teve períodos de turbulência, indo da desconfiança ao entendimento.
Em princípio, dentro da legenda, a idéia -liderada por João
Amazonas (presidente do PC do
B, morto em maio passado)- era
a de que o hoje candidato petista
havia sido o responsável pelo fim
da guerrilha ao ter delatado seus
companheiros aos militares.
Para colocar um ponto final nas
polêmicas, a direção do PC do B
promoveu uma profunda investigação sobre o caso, que indicou a
"inocência" de Genoino.
Em 2000, quando a questão foi
colocada no plenário da Câmara
pelo deputado Jair Bolsonaro, Genoino respondeu emocionado:
"As informações [que à época
passou aos militares] referiam-se
ao motivo da minha ida para o
Araguaia, à finalidade de instauração da guerrilha e os nomes de
pessoas com quem trabalhei na
preparação da luta armada, cuja
identificação, avaliei, não prejudicaria a guerrilha. Nenhuma dessas informações poderia levar à
localização da guerrilha, pois nem
eu sabia onde se encontrava".
Segundo líderes do PC do B, o
fato de Genoino ter chorado no
velório de Amazonas fez com que
os militantes do partido que ainda
mantinham um pé atrás em relação ao petista mudassem de idéia.
"O choro do Genoino nos tocou",
disse um líder comunista.
Já o perdão de Amazonas, sempre resistente ao nome do petista,
veio no final do ano passado,
quando não colocou obstáculos
na coligação do PC do B com o PT
em torno da candidatura de Genoino ao governo de São Paulo.
Dentro do próprio PT, Genoino
passou por momentos delicados
no início dos anos 90, quando
uma ala minoritária do partido, liderada por ele, decidiu criar um
setor de esquerda democrática.
Em tese, era o início do afastamento das visões marxistas-leninista e a aproximação para questões reformistas. Mas tudo era
motivo para acender a desconfiança dos grupos radicais.
Na legenda, os arranhões do Genoino moderado aumentaram
quando ele saiu em defesa de Luiza Erundina, que aceitara integrar
o governo Itamar Franco. Genoino lutou, sem sucesso, pela participação de todo o partido no governo. O nome dele, que à época
chamou de "insensíveis" os esquerdistas do PT, chegou a ser
sondado pelos tucanos.
Em situações-limite, entretanto,
o Genoino moderado já deu lugar
ao irascível. Em meados de 75,
calçado com uma botina de pneu
e recém-saído de greves de fome e
de silêncio num presídio paulistano, ele perdeu a cabeça. Ao ser
convocado pelos militares para
uma atividade obrigatória, Genoino chutou com toda força uma
grade de ferro, deixando perplexos os comandantes e assustados
os seus companheiros de cela. Pelas circunstâncias da época, uma
afronta, foi punido com sua transferência imediata para Fortaleza.
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