São Paulo, domingo, 28 de julho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Visual "light" expõe petista, diz estudo

RAFAEL CARIELLO
DA SUCURSAL DO RIO

O discurso "light" e a imagem de moderação assumidos pelo candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, dão força às críticas de "despreparo" feitas contra o petista.
Ao procurar ocupar uma posição de autoridade, se diferenciando das pessoas comuns que encarnava e desfazendo o discurso "radical", Lula tende a ser mais cobrado por seu suposto "despreparo", estigma que, em campanhas anteriores, era colocado em segundo plano pela imagem de "operário combativo".
A análise é da antropóloga Irlys Barreira, professora da UFC (Universidade Federal do Ceará) e integrante do Nuap (Núcleo de Antropologia da Política), que reúne pesquisadores de universidades federais do Rio (UFRJ), Ceará e Rio Grande do Sul (UFRGS).
Barreira falou com a Folha anteontem, por telefone. Ela é autora do texto "Um Operário Presidente?", um dos capítulos do livro "Como se Fazem Eleições no Brasil" (Relume Dumará, 275 págs.), lançado neste mês. Nele defende que a razão para o apoio ou a rejeição a Lula vinha sendo a mesma nas últimas três eleições presidenciais: sua imagem, identificada com a que a maioria da população brasileira faz de si mesma.
Essa imagem -responsável em grande parte pelo carisma do candidato- criaria limites eleitorais graves em uma sociedade hierárquica, diz Barreira, em que a Presidência seria um lugar simbólico associado à suposta capacidade de resolução das elites.
É por isso, diz a pesquisadora, que "a estratégia da identificação [com a população em geral" não foi suficiente [para eleger Lula"".

Despreparo
"A idéia do despreparo [intelectual de Lula" sempre foi acionada [pelos adversários", em todas as campanhas. Desde a formação, da origem, até as expressões que o Lula usa", afirma Barreira.
Antes, contudo, quando cobrado sobre seu preparo, Lula podia contrapor-se como um "reservatório ético e símbolo de combate". Para aquela estratégia, para seu discurso anterior, ser ou não "bem preparado" era uma questão secundária.
A diferença é que na atual eleição o candidato do PT teria decidido abandonar parcialmente essa imagem e, de maneira pragmática, assumir a posição de candidato "dotado de diferenciações referentes à competência, diferenciação em relação à maioria dos brasileiros".
"Nas últimas eleições, ele não conseguiu romper essa barreira de eleitores anti-Lula. Agora há uma mudança no discurso: há a idéia de que o trabalho tem que ser feito menos em função desse processo de identificação entre Lula e os excluídos sociais."
A nova estratégia é centrada, para a antropóloga, na "construção de um lugar de autoridade". "Um lugar de onde se possa dizer: "Eu tenho condição de governar". Isso vai desde a imagem física, de como Lula se veste, de como encara o público, como também implica estar ladeado de pessoas que são dotadas de um capital cultural reconhecido", afirma.
Para a pesquisadora, a campanha petista constrói uma imagem de Lula como "autoridade bem apessoada fisicamente, bem vestida, com o discurso certo para o lugar certo, com capacidade de fazer alianças, com capacidade de negociar. Enfim, um homem de poder". Barreira afirma ainda que a construção dessa nova imagem terá reflexos na própria organização do PT. "O partido não será o mesmo, ganhando ou perdendo [a corrida presidencial"."
A pesquisadora diz que o carisma de Lula tem sido em parte responsável pela manutenção do partido unido e que, após a transformação na estratégia de campanha, essa função pode ficar comprometida.


Texto Anterior: Alianças: Apoio a Lula envolve até político cassado pelo TSE
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.