|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTIGO
Dia do Índio no Supremo
MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA
O NTEM FOI Dia do Índio no Supremo Tribunal Federal (STF). Nada impede que mais à frente o
julgamento da demarcação da
Terra Indígena Raposa/Serra
do Sol (TIRSS) acabe num Dia
do Arrozeiro, mas tal desfecho
parece agora menos provável.
O voto do relator Carlos Ayres Britto veio com ímpeto demolidor. Britto não se limitou a
declarar a improcedência da
ação popular. Tratorou, um por
um, os débeis argumentos alinhavados na ação movida no
interesse de meia dúzia de fazendeiros de arroz.
Para o relator, não faz sentido falar em subtração de áreas a
uma unidade da Federação,
pois os índios já estavam lá antes da criação do Estado de Roraima. Seu direito à terra é originário, reza a Constituição. Os
rizicultores só multiplicaram
plantações depois de 1992, mas
o processo de demarcação começou em 1977. Os índios foram enxotados e escorraçados,
no que descreveu como "espremedura topográfica".
Terras indígenas não são territórios, deixa claro a Constituição. Ela é que garante seu
usufruto pelos índios brasileiros, que não precisam de uma
Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas. Demarcação e homologação são
meros atos declaratórios, reconhecimento de um direito
preexistente.
O laudo antropológico que
atesta a ocupação contínua e
pacífica pelas cinco etnias não
merece ser qualificado como
fraude ou generalidade. Toda a
metodologia prescrita na legislação foi seguida. O contraditório e o direito de defesa foram
amplamente exercidos.
Índios não atrapalham o desenvolvimento. Não impedem
a defesa de fronteiras -ao contrário. E por aí foi...
O ponto alto do relatório, porém, foi o reiterado elogio à generosidade da Constituição de
1988 com os índios. Britto afirmou que ela se encontra na
vanguarda mundial por "não
antagonizar colonização e indigenato" e pautar-se por um espírito fraternal e solidário, contra o "ignominioso preconceito" antiindígena.
Encarando de frente aqueles
que vêem nos índios um sinônimo de atraso, disse que a Constituição nos redime perante
nós mesmos de uma insensatez
histórica, só comparável à escravidão. Disse mais: que nos
índios está o primeiro elo da
identidade nacional. E que o
"doravante" de Roraima não
apaga o seu "desde sempre".
Era tudo que os "civilizados
com aspas" não queriam ouvir.
Carlos Alberto Menezes Direito pediu vistas. O Dia do Arrozeiro fica adiado, e pode talvez
nunca chegar.
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Laudo e autonomia de RR dominam debate Índice
|