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OUTRO LADO
Eduardo Jorge vê "fraude" e "armação" em ação da Corregedoria da Receita Federal
"E-mail prova que somos santos", diz EJ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em entrevista à Folha, Eduardo
Jorge Caldas Pereira usou duas
palavras para classificar o trabalho da Corregedoria da Receita
Federal: "fraude" e "armação". Os
auditores "não respeitaram os
procedimentos mínimos de defesa dos acusados", revoltou-se.
Disse mais: "Esses documentos
apreendidos só provam que somos santos". Abaixo, a entrevista.
Folha - Como o sr. recebe a nova
investida do Fisco?
Eduardo Jorge Caldas Pereira - Como fraude. Há uma ordem judicial que mantém os documentos em segredo. Já me aplicaram
uma multa fraudulenta. Agora invadiram as empresas com revólver na cinta. É uma armação. Fizeram uma busca e apreensão
concluída na noite de uma sexta.
Já na manhã de segunda mandaram um relatório para o Ministério Público. É esse o procedimento usual da Corregedoria? Não
respeitaram princípios mínimos
de defesa dos acusados.
Folha - A Receita diz, em documento oficial, que os R$ 903 mil
que o sr. recebeu do Grupo Meta, a
título de distribuição antecipada
de lucros, serviram para regularizar, mediante simulação, variação
patrimonial a descoberto da reforma de seu apartamento no Rio.
Eduardo Jorge - É besteira. O patrimônio sempre esteve coberto.
A reforma ocorreu no primeiro
semestre do ano 2000. E o acordo
para distribuição de dividendos
foi em 99. Recebi em cheques, em
1999 e no princípio de 2000. É
uma impossibilidade contábil.
Não se pode encobrir um patrimônio a descoberto com o recebimento de novas rendas. Tudo já
foi fiscalizado pela própria Receita, que considerou a operação regular. Esses documentos apreendidos pela Receita só provam que
somos santos. Tendo que me
afastar fisicamente das empresas,
deixei com meus sócios algo que
garantisse a eles o que nós tínhamos combinado de boca.
Folha - Em mensagem eletrônica
de julho de 2003, o sr. lembra aos
sócios que a necessidade de proteger o Grupo Meta levou à adoção
de procedimentos de isolamento
que não fariam mais sentido. Que
procedimentos foram esses?
Eduardo Jorge - O meu afastamento do conselho consultivo.
Agora faz sentido o meu retorno.
Esse e-mail era exatamente para
organizar uma reunião em que íamos formalizar isso.
Folha - Para a Receita o seu afastamento de fato jamais ocorreu.
Eduardo Jorge - Deixei o conselho consultivo. Nunca afirmei que
tinha deixado de ser sócio. As cotas que possuo do Grupo Meta estão na minha declaração de rendimentos até hoje.
Folha - Entre os papéis apreendidos há uma carta de 4 de setembro
de 2000. Trata do seu afastamento
do conselho das empresas e relaciona o dinheiro que o sr. já havia
recebido. Por que a carta foi feita?
Eduardo Jorge - O objetivo era
dar aos meus sócios a segurança
para que, a partir dali, continuassem a fazer distribuição desproporcional de dividendos, agora
contra mim, já que tinha havido
distribuição desproporcional a
meu favor durante algum tempo.
Folha - No e-mail de julho de 2003
o sr. faz menção à necessidade de
repactuar com os sócios o que fora
acertado no documento de 2000.
Levantou a hipótese de simplesmente rasgar o papel. Para a Receita seria "eliminação de prova".
Eduardo Jorge - Estão procurando chifre em cabeça de jumento.
Eles dizem que o documento teria
sido feito para regularizar situação patrimonial a descoberto.
Pergunto: porque nunca utilizei
esse papel? Qual o patrimônio a
descoberto que foi regularizado
por ele? Eu apenas disse para os
meus sócios que a gente tinha de
fazer um novo entendimento. Como? Fazendo um distrato? Simplesmente rasgando?
Folha - No mesmo e-mail de julho, o sr. menciona uma empresa
(Alleanza), cujo faturamento seria
100% garantido por clientes seus.
Os sócios são praticamente os mesmos do Grupo Meta. O seu nome,
porém, não consta da sociedade.
Eduardo Jorge - Quando houve o
caso Eduardo Jorge um dos sócios
se apavorou. Ficou com medo do
que aconteceria com as empresas.
Então a gente fez uma cisão. E ficou um pedaço da clientela, a privada, com a Alleanza. A clientela
pública manteve-se com a Meta.
Folha - Estamos falando de mercado de seguros?
Eduardo Jorge - Sim. Quanto à
receita da Alleanza, ela vem de
clientes que eu tinha sido o contato. Não tem nada demais nisso.
Folha - Na mesma mensagem, o
sr. fala da necessidade de promover o descruzamento da Meta e da
Alleanza. O que quer dizer isso?
Eduardo Jorge - Você passou a
ter a Alleanza no Rio e a Meta em
Brasília. Com o tempo, o afastamento começa a gerar conflitos.
Como a Meta é uma das sócias da
Alleanza, um pedaço do lucro tinha que ser repassado para a Meta. Decidimos descruzar. A parcela que era da Alleanza reverte para
o pessoal de Brasília, para a Meta.
Folha - O sr. anota no e-mail que
100% da receita da Alleanza, da
qual nem era sócio, vem de clientes
seus. E cobra dos sócios providências para equilibrar as coisas.
Eduardo Jorge - No ramo de seguro, o camarada que traz o cliente costuma ganhar uma participação na lucratividade da apólice.
Como virou tudo para a Alleanza
e agora a gente está fazendo a reconstituição eu digo: olha, se são
clientes que eu arranjei, todos privados, diga-se, como fica isso? Eu
não sou sócio da Alleanza e não
posso receber essa participação
nos lucros. Estou colocando pontos sobre os quais os sócios precisam pensar.
Folha - Ainda no texto de seu e-mail, o sr. fala de outra empresa, a
VML. O que é VML?
Eduardo Jorge - É uma empresa
que a gente está tentando montar.
Folha - Ainda não foi montada?
Eduardo Jorge - Eu ainda não
sou sócio dela. Acho que já foi
montada. Vou participar. É esse o
nosso acordo.
Folha - Dirigindo-se aos sócios, o
sr. disse que não recebeu nada das
empresas nos últimos três anos. E
fala de uma distribuição de dividendos da VML. Foi, segundo suas
palavras, "levada a crédito de meu
passivo", sem consulta prévia. Se o
sr. ainda não é sócio da VML, por
que faria jus a dividendos?
Eduardo Jorge - Estamos falando
de uma besteirinha -R$ 10 mil,
R$ 25 mil. Quando a situação da
Meta se agravou, decidimos que
certas facilidades, como motorista e plano de saúde, passariam a
ser reembolsadas por nós.
Folha - O que tem a VML com isso?
Eduardo Jorge - Como houve
uma distribuição de lucro na
VML em favor da Meta, eles pegaram o pedaço que viria a ser distribuído a mim e usaram para
abater do débito de pagamento de
seguro saúde e motorista.
Folha - O sr. pergunta ainda aos
sócios no e-mail se não estaria na
hora de formalizar as participações
na VML. Diz o seu texto: "Seja no
próprio contrato social ou, se se julgar que ainda existem riscos, num
contrato entre nós". O que é um
"contrato entre nós"?
Eduardo Jorge - O que está dito aí
é o seguinte: estamos combinados
que vou participar da VML. Não
está na hora de a gente formalizar
essa participação? Se essa participação tem risco político, ou seja,
se o nome Eduardo Jorge ainda é
pesado para ser carregado, vamos
fazer isso formalmente ou vamos
fazer num contrato de gaveta, como diz o relatório da Receita, ou
ainda de outras formas, como o
contrato de trabalho ou um contrato civil registrado em cartório e
declarado no Imposto de Renda.
Folha - O sr. acha correto o contrato de gaveta?
Eduardo Jorge - Por que não?
Sou um camarada que foi endemoniado durante três anos. As
pessoas têm que se proteger. A
questão é outra: se houver um
contrato de gaveta eu vou ter rendimento? Se tiver rendimento,
vou declarar esse rendimento?
Como? A questão não se pôs até
agora, porque ainda não houve isso, vocês estão presumindo que
eu ia sonegar, que eu ia burlar o
Imposto de Renda no futuro.
Folha - Não presumo nada, mas o
Fisco diz, em documento oficial,
que se trata de uma tentativa de
fugir à fiscalização.
Eduardo Jorge - Eles estão me fazendo uma fiscalização futura?
Folha - Pelo que entendi, eles supõem que, ao mencionar a hipótese de um contrato informal, o sr.
está falando de algo que, à sombra
de uma gaveta, não está exposta
aos olhos da fiscalização.
Eduardo Jorge - Isso quer dizer
que eu vou sonegar? Pode-se sonegar com contrato de gaveta ou
sem ser de gaveta.
Folha - O objetivo de um contrato
de gaveta não é o de ocultar a participação num negócio?
Eduardo Jorge - O objetivo de
um contrato de gaveta, eventualmente, neste caso, seria o de deixar um sócio que está sendo atacado pela imprensa não aparecer
publicamente.
Folha - Como ficou a dívida decorrente da antecipação de dividendos de R$ 903 mil que o sr. recebeu
do Grupo Meta em 2000, já foi liquidada?
Eduardo Jorge - Não. Digo no e-mail que, como mudou a situação, a gente não vai poder liquidar
como combinado. Mudou a conjuntura. E se você tem uma empresa e faz uma distribuição desproporcional em favor de algum
sócio, esse compromisso é puramente moral, não é dívida contábil, não é dívida cobrável. Meus
sócios não podem chegar para
mim e dizer: você me deve tanto.
Folha - Quanto já foi amortizado
dos R$ 903 mil?
Eduardo Jorge - Não sei. Veja
bem, isso não é uma dívida, é um
compromisso moral.
Folha - Não deveria ser uma dívida?
Eduardo Jorge - Por quê?
Folha - O sr. recebeu dividendos
acima dos recebidos pelos seus sócios. Em consequência, ficou devedor deles.
Eduardo Jorge - Suponha que eu
dê a você R$ 200 mil. Quando você puder, você me devolve. Você
tem uma dívida comigo?
Folha - Se recebo um empréstimo, claro que sou devedor.
Eduardo Jorge - Não, não. Eu
vou te dar R$ 200 mil. Ou seja, o
contrato de distribuição de dividendos desproporcionais se finaliza ali, não existe dívida. Numa
empresa de capital e serviços, é
comum que a distribuição seja
feita em parte pela proporcionalidade do capital e em parte pela
contribuição à lucratividade da
empresa. Como sócios, teremos
que sentar e apurar direito isso.
Folha - Seus sócios são generosos, não?
Eduardo Jorge - Depende.
Folha - Se tenho cotas de uma
empresa e meus sócios concordam
em me dar R$ 903 mil sem compromisso, digo que são generosos.
Eduardo Jorge - Tenho o compromisso de ficar com eles e de
trabalhar para conseguir que a
empresa cresça.
Folha - Continua sendo generosidade.
Eduardo Jorge - Não, é um investimento. A empresa estava de
vento em popa, tinha excelentes
perspectivas.
Folha - O sr. não se considera devedor.
Eduardo Jorge - Legalmente,
não. Posso ser devedor moralmente.
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