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NO PLANALTO
Uma reforma agrária do futuro do pretérito
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Sob Lula, Brasília acenou com
uma "reforma agrária do século 21". O futuro chegou com tal
rapidez que já virou futuro do
pretérito. Teria sido radioso o
amanhã, não fosse a terrível cara
de ontem que exibe hoje.
Em seis meses, o maior feito
agrário do governo foi o loteamento. Não de terras, mas de cargos. Assentaram-se nas superintendências do Incra o MST, a
CUT, o sindicalismo rural, o PT, a
Pastoral da Terra...
Estado e movimentos sociais casaram-se em regime de comunhão de interesses. No universo agrário, porém, a felicidade conjugal só é possível a três. Excluído,
o naco sério do agropatronato ficou amuado.
Ainda na lua-de-mel, o MST se
deu conta de que o baú do governo é raso. E passou a responder
aos apelos de "paciência" de Lula
com invasões até de praças de pedágio. O Incra tornou-se uma casa à beira da conflagração.
Cinco dias atrás, o presidente da
autarquia, Marcelo Resende de
Sousa, enviou aos superintendentes um memorando de conteúdo
patético. Coisa de circulação interna, reservada.
"Na reforma agrária inexiste espaço para descrenças e melindres", disse Resende de Sousa a subordinados precocemente incrédulos e suscetíveis. Lembra-os
do "compromisso" com o "trabalho". Cobra-lhes "prioridades".
Vai mal a repartição. Depois de
desperdiçar meses em seminários
e reuniões, seu presidente pede
aos comandados, por escrito, que
se ocupem do óbvio: "aplicação
dos recursos orçamentários disponibilizados", "cadastramento das
famílias acampadas", ajuizamento de "ações desapropriatórias", emissão de TDAs de "imóveis já declarados de interesse social para fins de reforma agrária"
etc.
Nas últimas três linhas do inusitado memorando, Resende de
Souza reafirma sua "convicção de
que a equipe de dirigentes do Incra reúne todas as condições técnicas e políticas para bem desempenhar" sua "importante missão". O chefe dele, ministro Miguel Rossetto, não parece tão convicto.
Há 23 dias, Rossetto fez publicar
no "Diário Oficial" uma portaria
que, na prática, desapropria o Incra de sua principal atribuição. O
documento transfere para um
grupo de trabalho da pasta do Desenvolvimento Agrário, o GETTERRA, a tarefa de identificar as
propriedades passíveis de utilização em assentamentos rurais.
Em entrevistas, Rossetto reconhece uma certa morosidade na
implementação da reforma agrária. Mas reafirma a sua fé no êxito. O chefe dele, Lula, não parece
tão crente.
Na semana passada, Lula pediu
a dois colegas de Rossetto, José
Dirceu e Luiz Dulci, que tentem
amansar o MST. Marcou para 7
de julho reunião com os líderes do
movimento. Cogita confiar ao petista Plínio de Arruda Sampaio a
elaboração de um plano de reforma agrária.
O "novo" plano, esboçado em
documento de 25 de março, é sósia de programa concebido em
1985, sob José Sarney. Retoma a filosofia do velho Estatuto da Terra, elaborado em 1964, sob Castello Branco.
No papel, o petismo previu assentar 60 mil famílias em 2003. O
dinheiro disponível -R$ 250 milhões- só dá para 27 mil. Por
ora, foram à terra 3.000. Superada a "descrença" e o "melindre"
do Incra, chega-se a dezembro
com, no máximo, 10 mil famílias.
Nos textos internos, o "novo"
governo diz que a reforma agrária de FHC fez-se de marketing. O
Planalto recebe na próxima sexta-feira as propostas da licitação
aberta para contratar as três
agências de publicidade que beliscarão os R$ 150 milhões reservados à construção da imagem do
governo Lula.
O edital encomendou às agências concorrentes justamente uma
campanha sobre as maravilhas
do "novo modelo de reforma
agrária". Lula está na bica de injetar no futuro mais uma dose de
pretérito.
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