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Governo abre debate sobre punição à tortura
Audiência, que discutirá crimes cometidos na ditadura, reunirá ministros, advogados e sociedade civil; Exército não foi convidado
Funcionalidade da Lei da Anistia será discutida; para Paulo Abraão, presidente da Comissão de Anistia, "idéia é fazer um debate técnico"
LUCAS FERRAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Assunto sensível e caro às
Forças Armadas, a possibilidade de responsabilizar quem cometeu crimes de tortura durante a ditadura militar (1964-1985) será tema de audiência
pública hoje, no Ministério da
Justiça, que reunirá ministros,
advogados e representantes de
entidades da sociedade civil.
Nenhum representante do
Exército foi chamado -o ministro Tarso Genro afirma que
os convidados têm visões plurais. Procurado por meio de sua
assessoria de imprensa, o Exército não quis comentar o fato.
O evento foi intitulado "Limites e Possibilidades para a
Responsabilização Jurídica dos
Agentes Violadores de Direitos
Humanos durante Estado de
Exceção no Brasil" e vai analisar a eventualidade da punição
nos campos civil e penal.
Em conversa com a Folha,
contudo, Tarso afirmou que o
evento não tem caráter "revanchista" nem pretende avaliar as
"ações das Forças Armadas ou
de policiais" na época. "O Ministério da Justiça não tem intenção de promover ações ou
punir pessoas, mas colocar [o
tema] dentro do debate e fazer
com que as opiniões aflorem."
O ministro já declarou publicamente ser favorável ao julgamento e à punição daqueles
que cometeram "delitos" no regime militar -para Tarso, a Lei
da Anistia não protege "torturadores". Opinião oposta tem o
ministro da Defesa e chefe das
Forças Armadas, Nelson Jobim, para quem a lei trouxe
"conciliação e pacificação".
O cerne do debate está na
aplicação da Lei da Anistia, de
1979, e sua funcionalidade depois de quase 30 anos, com ainda muitas feridas abertas. Um
exemplo, citado por Tarso, diz
respeito aos agentes que agiram de acordo com a ordem jurídica do regime de exceção
que vigorou entre 1964 e 1985.
Para ele, o agente que invadiu uma casa à noite, prendeu
alguém para interrogatório e o
manteve por um determinado
tempo preso, cometeu delitos
que estão abrigados na Lei de
Anistia, já que foram feitos
"dentro da ordem jurídica repressiva" do período. "Agora,
se este agente leva a pessoa para o porão e a tortura, está cometendo ilegalidade dentro do
próprio regime." Neste caso,
diz, trata-se de um crime comum e contra a humanidade.
"Não há processo de reconciliação em matéria de tortura",
diz o presidente da Comissão
de Anistia, Paulo Abraão, ao citar a Constituição de 1988 e
evocar a tortura como um crime imprescritível. "A idéia",
conta ele, "é fazer um debate
técnico, não apaixonado".
Para o presidente do Conselho Federal da OAB (Ordem
dos Advogados do Brasil), Cézar Britto, que também vai participar da audiência, o Brasil
não "relativizou" sua anistia.
"Anistia não é amnésia, ela não
pode abranger atos cometidos
à margem da lei."
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