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Micro/Macro
O homem, colonizador galáctico
Marcelo Gleiser
especial para a Folha
Será que um dia seremos capazes de
viajar até as estrelas, visitar outros
sistemas solares e, quem sabe, colonizar
outros planetas? Essa pergunta pode parecer coisa de ficção científica. E, para ser
sincero, no momento é mesmo. O que
não significa que cientistas sérios não estejam pensando no assunto.
Existe um grande obstáculo entre nós e
as estrelas: as distâncias são enormes, inviabilizando o uso de combustíveis convencionais, baseados em processos químicos. Não só são necessárias quantidades absurdas de combustível, como a
viagem seria interminavelmente longa.
Consideremos, por exemplo, uma viagem até a estrela mais próxima do Sol,
Alfa Centauri, a 4,2 anos-luz. A luz que
sai de Alfa Centauri, viajando a 300 mil
km/s (você pisca o olho e a luz dá 7,5 voltas em torno da Terra), demora quatro
anos e pouco para chegar aqui. São cerca
de 40 trilhões de quilômetros, viagem
que, em naves convencionais, não só demoraria uns 90 mil anos como consumiria o equivalente a 50 anos do combustível de um ônibus espacial. Imagine o tamanho do tanque para armazenar essa
quantidade brutal. Para chegar às estrelas precisamos de combustíveis muito
mais eficientes, ou de processos físicos
para encurtar as distâncias interestelares.
Combustíveis alternativos já estão sendo propostos. Entre eles está a fusão nuclear, como a usada em bombas de hidrogênio e no interior do Sol: a energia
vem da fusão de núcleos do átomo de hidrogênio, convertendo-os em hélio. O
problema é que a velocidade ainda não é
muito alta (quando comparada à velocidade da luz), e a quantidade de combustível necessária é enorme (a menos que o
hidrogênio seja coletado na viagem).
Outra possibilidade é a vela a laser:
uma verdadeira caravela espacial, em
que a luz de um enorme canhão de laser é
focada por uma lente de mil quilômetros
de diâmetro e projetada sobre uma vela
plana. A luz, uma onda, transfere energia
e momento a objetos. A idéia é usar esses
recursos vindos da luz do canhão de laser
para impulsionar a vela, como uma caravela com ventilador próprio.
Mais uma vez, é necessária grande
quantidade de energia para fazer o canhão de laser funcionar (como a tomada
do ventilador). Entretanto, testes recentes são bem positivos: é possível criar veleiros espaciais que encurtariam a viagem a Alfa Centauri de 900 séculos para
40 anos. Uma viagem até Júpiter demoraria só oito horas, o mesmo que ir de
avião de Miami a São Paulo. Nada mau.
A melhor solução já foi discutida em
inúmeros filmes e livros de ficção científica: encurtar as distâncias, encurvando
o espaço entre as estrelas.
Imagine uma formiga andando sobre
uma cama elástica. Para ela atravessar a
cama de um lado a outro em velocidade
de formiga, demoraria muito. Mas se
uma formiga muito inteligente puser
uma bola de boliche no meio da cama, o
trajeto da formiga encurta. Quanto mais
pesada for a bola, mais deformada a superfície da cama elástica e menor a distância que a formiga tem de atravessar
(ou pular, em um foguete de formiga).
O mesmo poderia ocorrer para o espaço entre duas estrelas. Einstein mostrou,
em sua teoria da relatividade geral, que a
matéria encurva a geometria do espaço.
Caso fosse possível concentrar muita
matéria (uma estrela bem densa, por
exemplo) entre o ponto de chegada e o
de partida, a distância entre os dois encurtaria muito. Esses atalhos espaciais,
chamados buracos de verme, existem
apenas em teoria.
Não temos a mínima idéia de como seria possível desenvolver uma engenharia
de túneis espaciais. Vendo o que a ciência fez em tão pouco tempo, podemos
supor que descobriremos muita coisa
nos próximos milhares de anos. Quem
sabe não seremos nós os colonizadores
da nossa galáxia, criando uma rede de
buracos de verme que se estenda pelo espaço interestelar como a rede de estradas
da Terra? Afinal, o que hoje é fantasia pode, amanhã, se tornar realidade.
Marcelo Gleiser é professor de física teórica do
Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do
livro "O Fim da Terra e do Céu"
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