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Japão desiste de disfarçar a caça à baleia de "ciência"
País admite que faz pesquisa com objetivo de provar que é possível voltar a caçar cetáceo comercialmente na Antártida
Joerg Sarbach/Associated Press
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AFRA BALAZINA
ENVIADA ESPECIAL A TÓQUIO
Perto do templo mais famoso
de Tóquio, o Asakusa Kannon,
uma loja chama a atenção: tem
uma das paredes coberta pela
pintura de uma baleia e as prateleiras estão repletas de latas
de diferentes tipos -todas contém carne do maior animal marinho. Uma baleia azul de pelúcia enfeita o local, além de inúmeros suvenires desses mamíferos em miniatura.
O dono do mercadinho primeiro expulsa a curiosa ao ver
um flash ser disparado. Depois,
ao perceber que a suposta turista -uma repórter- insiste
em conhecer a loja e comprar
latas de carne, pede desculpas,
em inglês, e lhe dá de brinde pequenas baleias de porcelana.
A reação do comerciante e
seu receio às fotos reflete a polêmica existente em torno da
caça científica realizada pelo
Japão e que tem, como produto, a carne vendida em mercados e restaurantes japoneses.
Apesar de a moratória à caça
comercial vigorar desde 1986, o
Japão possui uma cota de captura científica na Antártida que
atinge cerca de mil baleias por
ano. O governo japonês reconhece que a atividade resulta
na venda de 5.000 toneladas de
carne de baleia ao ano no país.
Tsuyoshi Iwata, diretor-assistente da Divisão Oceânica da
Agência de Pesca do Japão, usa
vários argumentos para justificar a intenção do país de voltar
a caçar comercialmente. Diz
que é preciso matar animais
"para pesquisa" e que a importância da carne de baleia na dieta local tende a aumentar.
"Nós temos tradição de comer carne de baleia. E, no futuro, esse uso deve ficar ainda
mais importante em razão da
crise mundial de alimentos",
diz Iwata, lembrando que o Japão importa muitos alimentos.
Ele diz, ainda, que só matando é possível saber o que as baleias comem (ao analisar o conteúdo do estômago) e descobrir
com precisão idade e tamanho.
Matar para argumentar
Sara Holden, coordenadora
internacional da campanha de
Baleias do Greenpeace, ironiza
esse tipo de afirmação. "O conteúdo do estômago é o mesmo
de muitos anos atrás. E é possível saber aproximadamente
idade e tamanho sem matar."
Iwata, porém, afirma que,
quanto mais baleias forem
mortas, mais estatística haverá
para provar que é viável voltar a
caçar de maneira comercial.
"Em nossa opinião, não existe diferença entre carne de baleia e atum, por exemplo. É um
recurso marinho que deve ser
utilizado, desde que seja abundante." Os japoneses abatem
na região da Antártida até 935
baleias minke, espécie que aparece na categoria "risco menor/dependente de conservação" na lista vermelha de animais ameaçados da IUCN
(União Internacional para a
Conservação da Natureza).
Também estão na cota 2007/
2008 outras 50 baleias-fin, espécie da categoria "em perigo",
e 50 jubarte, da categoria "vulnerável". Sob pressão, o país
disse que não caçaria jubartes
pelo menos até o meio do ano.
Tanto ONGs quanto outros
países, como o Brasil, questionam a matança. Na opinião de
Bernardo Velloso, chefe da Divisão do Mar, da Antártida e do
Espaço, do Ministério das Relações Exteriores, o número de
baleias abatidas na caça "dita
científica" não é justificável do
ponto de vista técnico.
De acordo com ele, outro
problema é o fato de a cota incluir "50 baleias jubarte, consideradas universalmente o símbolo da espécie em extinção".
O Brasil, que só na década de
80 proibiu a caça, hoje defende
o "uso não-letal" desses animais, como o turismo para observação de baleias, que gera
lucro e está em expansão.
Mesmo assumindo considerar o abate de baleias natural,
os japoneses ainda parecem
sentir certo constrangimento
com a ação. Leandra Gonçalves, do Greenpeace, seguiu navios na Antártida entre o final
de 2007 e início deste ano. "Decidiram não caçar na nossa
frente. Perseguimos a frota por
duas semanas e impedimos a
caça de mais de cem baleias."
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