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Ciência em Dia
PLoS e SciELO dão o que falar
Marcelo Leite
editor de Ciência
Um espectro ronda as publicações
científicas internacionais. Com um
nome em aparência inofensivo, "PLoS",
o fantasma transita pelas conexões de
banda larga na internet. É o espírito do livre acesso, que está dando o que falar
com seu potencial para virar de pernas
para o ar o primeiro time das revistas, como "Nature", "Science" e "Cell".
"PLoS" quer dizer "Public Library of
Science", ou biblioteca pública de ciência. Trata-se de um guarda-chuva editorial para a família de revistas eletrônicas
que por ora gerou uma filha única,
"PLoS Biology", lançada há coisa de um
mês. A proposta é que qualquer cientista
do planeta possa ler os artigos de pesquisa que publica, bastando ter acesso à internet e saber inglês -o mínimo, hoje.
Essa tentativa de furar o esquema das
revistas tradicionais, que exigem caras
assinaturas mesmo para uma consulta
on-line, teve o impulso inicial de US$ 9
milhões da Fundação Gordon e Betty
Moore (sendo Gordon Moore um fundador da indústria de chips Intel).
Um dos cabeças do movimento, que
chegou a recolher 30 mil assinaturas de
apoio, é o Nobel em Medicina americano
Harold Varmus. Outro é Patrick Brown,
um pioneiro dos chips de DNA, que já se
envolveu na primeira encrenca do ramo:
retirou seu nome da lista de autores de
um trabalho que seria publicado na famosa "New England Journal of Medicine" (www.nejm.org), depois que a revista recusou o compromisso de pôr o artigo no domínio público. O "paper" sobre
transplantes renais saiu na "NEJM" de 10
de julho (vol. 349, págs. 125-138), tendo
Minnie Sarwal como autora principal.
O galho com a PLoS (www.plos.org) é
que, se ela não cobra para ser lida, cobra
-e bem- para ser recheada. O pesquisador que quiser publicar no novo órgão
terá de pagar US$ 1.500 de "taxa de disseminação". O preço é proibitivo para
muitos cientistas de países mais pobres,
que de resto já contam com toda espécie
de dificuldade para conseguir publicar
nas revistas chiques (de alto impacto).
Além disso, há quem duvide que esse
valor possa de fato cobrir os custos de
edição, mesmo que a distribuição sobretudo eletrônica permita economia de
uns 20%. Ocorre que revistas do calibre
da "Cell" rejeitam até 90% dos manuscritos que recebem, mas submetem todos
os que chegam a uma avaliação por especialistas, uma maneira segura de encarecer astronomicamente a operação. Nem
é preciso dizer que a torcida contra vem
das revistas estabelecidas na praça.
A favor já se pronunciaram alguns pesos-pesados entre os financiadores de
pesquisa, como o Wellcome Trust britânico e o Howard Hughes Medical Institute norte-americano. Ambas as instituições anunciaram que cobrirão até US$
3.000 de "taxas de disseminação" para
pesquisas por elas custeadas.
O Wellcome Trust pôs o dedo na ferida
em um relatório recente, afirmando que
o sistema atual de milhares de publicações especializadas com assinaturas dispendiosas "não trabalha no interesse de
cientistas e do público, mas é antes dominado pela determinação comercial de
mercado em melhorar a própria posição
mercadológica".
A boa notícia, para quem tem interesse
em publicações científicas brasileiras, é
que o país já tem um sistema próprio
-apesar do nome colonizado- de livre
acesso, a "Scientific Electronic Library
Online" (www.scielo.br), uma biblioteca
eletrônica com 114 periódicos nacionais,
a maioria de interesse bem mais restrito
que "Nature" ou "Science". A SciELO
tem recebido mais de 326 mil consultas
por dia -o tipo da aparição bem-vinda.
E-mail: cienciaemdia@uol.com.br
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