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Ciência em Dia
Fritjof Capra viaja na transversal
Marcelo Leite
editor de Ciência
Passou por Brasília na semana passada o autor de best-sellers paracientíficos Fritjof Capra, conhecido por obras
como "O Tao da Física" e "Ponto de Mutação". Deitou falação, em seminário do
Ministério do Meio Ambiente (MMA),
sobre o desafio da "transversalidade" para a administração Lula, ou seja, sobre a
necessidade de permear todas as ações
de governo com preocupações como a
"sustentabilidade social, cultural, política e ambiental" -nas palavras da ministra Marina Silva.
Nos últimos anos, Capra voltou suas
lucubrações além da ciência para o tema
do ambiente, que tem atraído o maior
número de espíritos simples -ainda
que bem-intencionados- nostálgicos
de um mundo uno que nunca existiu,
não-dilacerado, virgem de tecnologia.
Duas de suas obras recentes são "As Conexões Ocultas - Integrando Dimensões Biológicas, Cognitivas e Sociais da
Vida em uma Ciência da Sustentabilidade) e "A Teia da Vida - Um Novo Entendimento dos Sistemas Vivos", ambos
traduzidos para o português.
A julgar pelos títulos dos volumes, têm
tudo a ver com preocupações vicejantes
nas margens do Fórum Social Mundial.
Foi numa dessas reuniões em Porto Alegre que Capra se engajou, em companhia
da ministra, na proposta de uma rede internacional por um "Brasil Sustentável",
cujos primeiros passos foram dados com
a reunião encerrada sexta-feira na ecologicamente duvidosa Academia de Tênis
de Brasília.
Capra pontificou: "Formular políticas
para um Brasil sustentável significa introduzir uma nova dimensão ética na
política. A ética ecológica é um padrão de
comportamento que flui através da percepção de que todos pertencemos à comunidade global da biosfera". Disse
mais: "A rede é o padrão básico de organização da vida. Desde o princípio, há
mais de 3 bilhões de anos, a vida surgiu
no planeta não através da competição,
mas através da cooperação, de parcerias
e da formação de redes".
Marina Silva aplaudiu: "Essa rede
mundial de ecologistas está aqui para
nos ajudar a tornar o nosso sonho realidade". De fato, a ministra anda necessitada de ajuda internacional, porque no
plano doméstico os "ecologistas" (ambientalistas) já começaram a chiar. O
Instituto Socioambiental (ISA), do qual
saiu o secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, João Paulo Ribeiro Capobianco, publicara dias antes um primeiro documento de cobrança, sintomaticamente intitulado "Transversalidade na Corda Bamba" (
www.socioambiental.org/ website/especiais/novogov2/index.shtm).
Coincidência ou não, eles se queixam
exatamente da perene ausência do
MMA, ou pelo menos da questão ambiental, na formulação de políticas públicas por outros ministérios -como no
caso do agronegócio exportador e sua
predileção pela soja transgênica. Já lá vão
quase dois meses desde que se tornou
conhecido o desmatamento de mais de
25 mil km2 na Amazônia no período
2001-2002, 40% a mais que no anterior, e
não há ainda notícia concreta da comissão interministerial (mais uma) criada
para resolver o problema.
Enquanto isso, a monocultura da soja
avança em direção a Santarém (PA), produzindo divisas para o país ao mesmo
tempo em que induz desmatamento.
Não é contradição que se resolva com
platitudes e transversalidades caprianas.
E-mail: cienciaemdia@uol.com.br
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