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Demanda asiática acelera sumiço de tubarões no país
Só em 2007, Brasil exportou US$ 2,3 mi em barbatanas, usadas em sopa na China
Pesca de vários tipos tem feito populações declinarem em até 95%; tubarão-azul, fácil de capturar, é uma das espécies mais cobiçadas
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
Os tubarões do litoral brasileiro estão protagonizando um
filme de horror -só que como
vítimas, não vilões. Nesse novo
roteiro, populações inteiras estão sendo dizimadas pelos vários tipos de pesca. Algumas,
como é o caso do cação-listrado, já declinaram em até 95%.
O incremento na cobiça pelos tubarões no país em todas
as partes do mundo ocorre por
causa do aumento no preço da
sua barbatana, puxado principalmente pela demanda asiática. Hoje, ela pode chegar a custar até R$ 100 o quilo no Brasil.
É usada em uma sopa muito
apreciada pelos chineses.
A procura pelas barbatanas
pode ser vista, por exemplo, em
Itajaí (Santa Catarina). Um
barco que atracar naquele porto carregado com tubarões-azuis (Prionace glauca), após
20 dias no mar, vai ter de fazer
um leilão de seu produto. Em
média, pelo menos três compradores, representantes de
empresas, aparecerão interessados nas barbatanas. Depois
da compra, eles encaminham
os produto para o exterior.
"Depende do caso, mas 200
kg podem ser arrematados por
até R$ 20 mil", diz o armador
José Kowalski, dono de cinco
barcos de pesca de tubarão na
região de Itajaí. "Acho que vai
tudo depois para Taiwan."
Números oficiais das exportações brasileiras atestam a
existência de um mercado nascente. Sob a rubrica barbatanas
de tubarão secas, o Brasil ganhou, em 2007, US$ 2.312.544.
Isso equivale a 131 toneladas.
O favorito
A pressão sobre o tubarão-azul, capturado pela modalidade de pesca conhecida como espinhel, é crescente. O pesquisador Jorge Kotas, do Cepsul
(Centro de Pesquisa e Gestão
de Recursos Pesqueiros do Litoral Sudeste e Sul), contabilizou a retirada de 35 mil indivíduos das águas do Sul do Brasil
entre 1997 e 2005. Essa espécie
é uma das favoritas dos pescadores, por ser fácil de apanhar e
ter barbatanas enormes.
Só dessa espécie, 2 milhões
de exemplares são retirados do
Atlântico Sul todo ano. "Os sinais de declínio na população já
apareceram no período estudado, porque houve muitas capturas de indivíduos jovens", diz.
Segundo Kotas, o declínio
pode ser notado no esforço de
pesca, ou seja, o número de horas que é preciso ficar no mar
para capturar uma dada quantidade de peixes. Em 2001, cada
viagem rendia 5,7 toneladas de
tubarão-azul desembarcadas
em Itajaí. Em 2005, eram 3,4
toneladas por viagem.
"Finning"
Kowalski diz que não está fazendo nada de ilegal -e é verdade. "Não existe nenhuma
proibição de captura desse peixe", diz o empresário, que vende parte de sua produção nas
madrugadas do Ceagesp, em
São Paulo (ali, o quilo da barbatana custa R$ 5,00).
Mas o que é ilegal, segundo o
Ibama, é a prática do "finning"
-a retirada da barbatana do tubarão em alto-mar com o descarte do animal logo em seguida- e a captura de filhotes ou
de determinadas espécies
ameaçadas de extinção.
"Hoje, a prática do "finning"
em águas brasileiras praticamente não existe", afirma Fábio Hazin, biólogo da Universidade Federal Rural de Pernambuco. "Os barcos nacionais
aproveitam 100% dos tubarões
capturados e os estrangeiros
têm observadores de bordo."
Nem todo pesquisador que
trabalha com tubarões descarta
a hipótese de que o "finning"
ocorra no Brasil. Para o biólogo
Marcelo Szpilman, diretor do
Instituto Ecológico Aqualung,
a pesca ilegal de tubarão, inclusive o "finning", não só existe
como precisa ser coibida. "O
Brasil precisa fiscalizar o seu
mar territorial. O que ocorre,
muitas vezes, é que os chamados navios-fábrica operam em
alto-mar por meses. Eles não
precisam atracar."
Um dos maiores especialistas no tema no Brasil, o biólogo
Carolus Vooren, da Universidade Federal do Rio Grande, levanta outro problema.
Várias espécies mais costeiras, como o cação-anjo e o cação-viola, estão seriamente
ameaçadas de extinção porque,
além de serem alvos da pesca
industrial, elas acabam sendo
capturadas, às vezes de forma
acidental, pela pesca amadora.
Arrastão no mar
Neste caso, os anzóis do espinhel (veja quadro abaixo) são
trocados pelas redes de arrasto.
Os vários tipos de pesca, segundo Vooren, dizimaram mais de
80% do cação-anjo e do cação-viola no litoral sul do Brasil.
No litoral norte do país, o cação-quati, ameaçado de extinção, tem uma queda anual na
sua população de 18,4%. Em
2006, foi listado como "criticamente em perigo". No Nordeste, o problema é a pesca do tubarão-toninha. Essas espécies
estão caindo na rede cada vez
mais cedo. Cerca de 90% dos
animais capturados são jovens
de até cinco anos de idade.
"A pesca de arrasto é uma
ameaça para os elasmobrânquios [grupo dos tubarões e
raias] em geral por causa da estratégia de vida deles", diz Vooren. A taxa de crescimento populacional desses animais é
baixa, e a pressão de pesca, alta.
"São poucos filhotes por prole,
de cinco a dez no máximo, dependendo da espécie."
Uma das sugestões dele é que
sejam criadas áreas de proibição à pesca nos locais onde os
tubarões se reproduzem. Existem ao menos cinco zonas de
reprodução no litoral Sul do
Brasil e uma em São Paulo.
Até a pesca considerada amadora deverá ser fiscalizada, dizem os cientistas. Se no Sul, em
Rio Grande, o Ibama local é
atuante, em São Paulo os atravessadores de barbatanas correm as vilas de pescadores e,
quase sempre, conseguem
comprar o que buscam.
Na própria tabela do Ceagesp
na internet, o preço do quilo do
cação-viola -cuja captura é
proibida- pode ser consultado
pelos consumidores. No dia 19
de junho, o quilo do peixe para
o atacado custava R$ 2,25.
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