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Ciência em Dia
Planos demais para a Amazônia
Marcelo Leite
editor de Ciência
Se você acha que a batalha dos transgênicos dilacerou o governo Lula, espere para ver o que virá no caso da Amazônia, um pepino maior que a metade do
Brasil. O ensaio da crise ocorre nas próximas semanas, quando começa a discussão de nada menos do que dois planos para conter a devastação da floresta.
Dois planos específicos para a floresta,
quer dizer, porque o plano com "P"
maiúsculo que vai ditar de fato a dinâmica econômica da macrorregião é o famigerado PPA (Plano Plurianunal). Resumo da ópera: três planos de uma sentada
e, se não concorrentes, ao menos necessitados de coordenação e compatibilização. Como o assunto é inflamável, interna e externamente, sobra combustível
para confusão e inação.
Sem plano algum de desenvolvimento
e com crise econômica, a taxa de desmatamento já havia galgado 40% de aumento no período 2001-2002, alcançando a segunda maior área da história,
25.476 km2. A estimativa do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) foi
divulgada em junho e motivou a formação de um Grupo Permanente de Trabalho Interministerial (mais um).
Pois o grupo de 12 ministérios indicado
ainda no calor das taxas finalizou em
quatro meses um documento de 104 páginas, o primeiro da trinca: "Plano de
Ação para a Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazônia Brasileira"
(PAPCDA, para simplificar).
(Detalhe: o próprio PAPCDA menciona, na pág. 6 da introdução, que o Ministério do Meio Ambiente, MMA, já havia
iniciado um "Plano de Ação para a Prevenção e Controle de Desmatamento,
Queimadas e Exploração Madeireira Ilegal" -PAPCDQEMI, para simplificar...)
O PAPCDA, é bom dizer, tem qualidades. Embora não detalhe cronograma
nem fontes de recursos, como um plano
digno do nome deveria fazer, lista ações
prioritárias nos 50 municípios de Mato
Grosso, Pará e Rondônia onde se concentram 70% dos desmatamentos. Demonstra cuidado especial com o entorno
da rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163),
cuja pavimentação, se mal planejada, poderia induzir a repetição do padrão histórico de desmatamento na faixa de 30-50 km ao longo da estrada. Outras obras
de infra-estrutura consagradas no PPA,
como a hidrelétrica de Belo Monte (a polêmica Cararaô dos anos 80), deverão
passar por revisão profunda.
O segundo plano tem título curto, "Plano Amazônia Sustentável" (PAS), e 195
páginas nos dois volumes da versão
atual, preliminar. Quatro ministérios
-MMA, Integração Nacional, Planejamento e Casa Civil- organizaram o
grupo anunciado pelo presidente da República no início de maio, com três meses de prazo para o que então se chamou
de "programa de desenvolvimento sustentável".
O melhor do PAS é o primeiro volume,
de diagnóstico. Recomenda-se a leitura a
todos que quiserem entender a problemática socioambiental amazônica, na
sua complexidade inevitável. Com 77
laudas de texto corrido, chega a ser uma
proeza de concisão, mas pouco acrescenta em matéria operacional. Quem for
buscar isso no segundo volume, de sistematização de propostas federais e estaduais, terá muito com que se decepcionar: suas 116 páginas são pouco mais que
uma compilação de projetos e mais projetos, sem uma análise de seu efeito combinado sobre o ambiente da região.
O PAS ainda carece da chancela de Ciro Gomes e Marina Silva. Depois, seus
patrocinadores no MMA terão de enfrentar a concorrência ou coordenar-se
com o grupo envolvido no PAPCDA. Em
seguida, dobrar os interesses de governadores incrustados no PPA. Haja "transversalidade", como quer a ministra, para
fincar a bandeira ambiental em todos os
setores do governo federal.
E-mail: cienciaemdia@uol.com.br
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