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Oeste do Pará teme "exclusão florestal"
União vai licitar área para exploração de madeira, mas população receia ficar à margem do projeto de desenvolvimento
Moradores desconfiam que promessa de inclusão social seja igual a da mineração, que "só empregou doutor"
ao chegar nos anos 1970
EDUARDO GERAQUE
ENVIADO ESPECIAL A ORIXIMINÁ (PA)
Os "Raimundos" da Silva, um
de Faro e outro de Oriximiná
-ambas cidades do oeste do
Pará- estão preocupados. O
primeiro projeto de concessão
florestal do Estado, desenvolvido pelo SFB (Serviço Florestal
Brasileiro), vai ocorrer aqui. A
proposta prevê que uma empresa comece a explorar madeira na região, retirando árvores em um ritmo que não comprometa a saúde da floresta.
É uma proposta ousada. Na
mesma região, existe mineração de bauxita e a comunidade
local pleiteia participação na
atividade madeireira.
A preocupação do primeiro
Raimundo, mais conhecido como padre Dico, que dirige a paróquia da cidade de Faro há 13
anos e tem fama de encrenqueiro (leia texto à direita), resume o espírito percebido em
todas as três audiências públicas sobre a concessão, acompanhadas pela reportagem da Folha neste mês, sob a forte presença do calor equatorial.
"A sociedade está desinformada e mal organizada", diz.
"As palavras [do governo] não
são traduzidas. Não temos entidades que possam fazer reivindicações", afirmou o líder religioso durante a audiência em
sua cidade, que tem uma área
673% maior que a do município
de São Paulo, mas uma população de 10 mil habitantes.
Sem dominar a técnica do
manejo, ainda, a comunidade
local teme ser excluída do processo. O medo é que a nova proposta seja apenas discurso para
encobrir o "neocolonialismo"
que é comum na Amazônia.
"Quando a mineração chegou
[nos anos 1970], as promessas
foram as mesmas", diz Dico.
A palavra oficial, porém, foi
dirigida a todos desta vez. O
plano é licitar quatro trechos da
floresta nacional Saracá-Taquera. No total, serão entregues à incitava privada 215.354
hectares -já há vários interessados. Uma mesma empresa
não poderá acumular mais de
um lote. Todas terão de fazer
um manejo sustentável da floresta e não poderão vender açaí
nem castanha-do-pará, que já
são explorados pelos locais.
Caminho único
Com o segundo projeto de
concessão em curso -o primeiro, em Rondônia, está em implementação- o governo espera arrecadar R$ 13,6 milhões
por ano, no mínimo. Para o diretor-geral do SFB, Tasso Azevedo, promover a inclusão das
comunidades locais no manejo
florestal é o único caminho que
existe para a economia da Amazônia crescer sem desmatar.
Em Terra Santa, outra cidade
visada pelas concessões, a cultura do manejo também não
existe. Toda extração de madeira, afirma o prefeito Adalberto
Cavalcante (PMDB), é "ilegal".
O outro Raimundo da Silva,
63, que não é padre, mas um ribeirinho da região, afirma que,
antes de a mineração chegar, o
rio local era limpo e cheio de
peixes. "Depois, tudo ficou turvo e eles se afugentaram", diz.
Ele esteve na audiência pública de Oriximiná para defender seu ponto de vista. "Não podemos brigar com o governo,
mas a mineração só empregou
doutor. E será que agora [com a
concessão] não poderemos
nem tirar um pau para vender
ou fazer canoa?", diz o agricultor, que nunca saiu da região.
Sem a cultura técnica do manejo, a maioria vive do pequeno
extrativismo, do cultivo de
mandioca, do gado ou da pesca
-o povo prefere muito mais
não ser atingido por esses novos projetos do que fazer parte
deles. Os políticos, entretanto,
sonham com os empregos, os
projetos sociais (isso dá pontos
na licitação) e preferem que os
vencedores do edital instalem
as madeireras lá mesmo.
Riqueza mineral
A coexistência com a mineração, também, pode gerar conflitos com novas empresas de madeira no local. A vista desde o
avião pousando na pista privada de Porto Trombetas -a dona é a mineradora MRN - suscita uma pergunta. Bauxita ou
floresta? Na janela, em meio a
área da Flona (Floresta Nacional), vêem-se vários clarões.
São os chamados platôs -morros descascados para retirada
do minério no meio da floresta.
O ciclo da bauxita na região,
segundo Ademar Cavalcanti
Silva Filho, gerente de saúde,
segurança, ambiente e relações
com a comunidade da MRN, vai
durar mais uns 35 anos. E, até
lá, a mineração terá de conviver
com a concessão florestal.
A Flona de Saracá-Taquera,
criadas nos anos 1980, protegeu as áreas de bauxita. Agora,
os platôs vão ficar no meio das
áreas que serão licitadas.
"Não podemos ser contra. A
mineração considera o manejo
bem-vindo, ainda mais se ele
for feito antes [da extração de
bauxita]. Não tem problema fazer os dois", diz o piauiense Silva Filho, que há 30 anos vive na
"vila privada" de Trombetas.
As audiências públicas serviram para romper a desconfiança da sociedade sobre a concessão, mas pôr em prática a inclusão da comunidade local no
projeto ainda é desafiador. O
presidente da Câmara Municipal de Faro, que é da zona rural,
ilustra a dificuldade.
"Nossa produção aqui é farinha e peixe", diz José Maria
Gato Gonçalves (PTB). "É muito mais importante agora tentar preservar a comunidade
[dos novos projetos] do que
criar uma cultura do manejo".
"Nós vamos trabalhar com as
expectativas e a demanda da
sociedade", diz Azevedo, pelo
governo. A meta em questão é
impedir que a exploração econômica fique descolada do desenvolvimento social da região.
O repórter EDUARDO GERAQUE viajou a convite do Serviço Florestal Brasileiro
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