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Ciência em Dia
Ambiente de luxo
Marcelo Leite
editor de Ciência
O que têm em comum o empresário
Gordon "Intel" Moore e o ator Harrison "Indiana Jones" Ford, além do talento para ganhar milhões e milhões de
dólares? A capacidade de doar uma certa
parte deles para a preservação ambiental, mais precisamente para a organização não-governamental Conservation
International (CI), que acaba de lançar
no Brasil "Wilderness" (Grandes Regiões Naturais), o terceiro de uma série
luxuosa de livros que não fariam feio numa mesa de centro de rancho algum nas
Rochosas ou na Patagônia.
Fica para outras pessoas a discussão
das implicações morais (ou moralistas)
desse estilo de ambientalismo. O fato é
que, luxuosos ou não, os mais de 5 kg e as
576 págs. não têm só centenas de fotografias de embasbacar quem se disponha
a desembolsar os US$ 75,00 (mais de R$
250,00) pelo "coffee-table book" de 35
cm por 30 cm, mas também muita informação e substância para reflexão.
Os irmãos mais velhos do volume,
"Megadiversity" (Megadiversidade) e
"Hotspots" (Áreas Prioritárias de Biodiversidade), seguem o mesmo princípio:
mapeamento de áreas de interesse biológico no mundo todo, segundo um conjunto de critérios, para influenciar políticas públicas nacionais e internacionais
de conservação de áreas naturais.
No caso de "Megadiversity", foram
identificados países com maior concentração de espécies. Brasil e Indonésia ficaram no topo da lista. O catatau, financiado pelo grupo mexicano de cimento
Cemex, está esgotado e sob risco de tornar-se item para colecionadores -além
de ser citado com frequência, pela meticulosidade do levantamento.
"Hotspots" destacou biomas com
grande quantidade de espécies únicas
(endemismo) sob ameaça. O conceito
havia sido formulado uma década antes
pelo ecólogo britânico Norman Myers e
ganhou roupa nova com o levantamento
da CI (www.conservation.org), sob o
comando de Russell Mittermeier. Virou
capa da revista científica "Nature" e, de
novo, referência comum quando se trata
de debater prioridades para conservação
(do Brasil, figuram na lista a mata atlântica e o cerrado).
Agora, "Wilderness" repete a dose destacando áreas segundo o critério da extensão (no mínimo 10 mil km2), da baixa
densidade populacional (menor que 5
habitantes/ km2) e da conservação (pelo
menos 70% de vegetação intacta). Foram
dois anos de trabalho, com o envolvimento de 200 autores.
Não deu outra: Amazônia na cabeça,
com 6,7 milhões de km2 (dos quais cerca
de 5 milhões no Brasil) e 40 mil espécies
de plantas (30 mil endêmicas). É a maior
extensão de floresta tropical em bom estado, com uma relação custo/ benefício
para conservação muito favorável.
Outras regiões campeãs são a ilha da
Nova Guiné, as florestas do Congo, as de
Miombo Mopane, também na África, assim como as pradarias do sul do continente, e a os desertos da América do
Norte. São 11,8 milhões de km2 (6,1% da
superfície terrestre, ou cerca de um Brasil e meio), que abrigam 17% das espécies
de plantas endêmicas do mundo.
Um quarto volume da série está em
preparação, "Spectacle" (Espetáculo),
sobre grandes concentrações de espécies
animais, de formigas a borboletas e pinguins. Será mais um livro de impacto visual, decerto, mas é difícil enxergar nele
uma vocação para a repercussão científica, como foi o caso dos dois primeiros.
Mas, se ajudar a CI a levantar entre as celebridades outros US$ 200 milhões de
fundos para conservação (além dos que
já administra), que mal pode causar?
E-mail: cienciaemdia@uol.com.br
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