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Ciência em Dia
Tamanho e documento da pesquisa brasileira
Marcelo Leite
editor de Ciência
Saiu há pouco pela Editora Unicamp
(www.editora.unicamp.br) o volume "Indicadores de Ciência, Tecnologia
e Inovação no Brasil", organizado por
Eduardo Baumgratz Viotti e Mariano de
Matos Macedo (616 págs., R$ 90). São 12
ensaios de interesse para todos quantos
se interessarem por diagnósticos apoiados em estatísticas sobre o desempenho
ímpar da pesquisa científica nacional.
A produção brasileira cresce a olhos
vistos, mas nem por isso ganhou a projeção que só os ufanistas conseguem enxergar. Muitos dados e análises do catatau da Unicamp são conhecidos, mas revisitá-los ajuda a conservar algum senso
de realidade. O Brasil publica apenas
1,44% da pesquisa mundial.
O dado foi aferido pelo critério consensualmente havido como o menos problemático: artigos aceitos por publicações
indexadas pela empresa Thomson ISI
(www.isinet.com). A organização mantém o principal banco de dados de publicações e estatísticas que instrumenta a
chamada cientometria. Em 2002, havia
8.569 periódicos nessa liga de elite, 66,5%
deles de ciências "duras", as naturais.
(Que fique por ora de lado o questionamento da idéia algo tacanha de ciência
por trás desses números, claramente colonizada pelo reducionismo materialista
característico da física, da química e da
biologia da moda, a molecular.)
Esse 1,44% brasileiro pode parecer insignificante, mas não é. Primeiro, porque
o dado estático elide um desenvolvimento histórico: em duas décadas, essa participação passou de 0,44% para 1,44%. Em
números absolutos, de 1.889 artigos em
revistas indexadas no ano de 1981 para
10.555 em 2001 -um aumento de mais
de cinco vezes. Segundo, porque a taxa
de crescimento no número absoluto de
artigos brasileiros, da ordem de 400%,
foi superior à média mundial, de 66%.
O desempenho nacional no âmbito da
América Latina, como anotam Jacqueline Leta e Carlos Henrique de Brito Cruz
no terceiro ensaio, também foi acima da
média, porque o aumento de artigos da
região ficou em 300%. Com isso, a participação da ciência brasileira no total publicado por latino-americanos passou de
33,3% para 42,1%.
Fenômeno semelhante de predomínio
regional ocorre dentro das fronteiras nacionais. Os Estados de São Paulo e Rio de
Janeiro concentram 70% da pesquisa
brasileira que passa por esse crivo internacional. Mas atenção: Minas Gerais saltou de 6% para 10% do total doméstico, e
o Rio Grande do Sul, de 6% para 8%.
Assinalando que apenas três universidades públicas (USP, Unicamp e UFRJ)
respondem por quase a metade da produção nacional de conhecimento científico, Leta e Brito Cruz atacam diretamente, à pág. 143, a peça de resistência (ou de
propaganda) de Roberto Amaral à frente
do Ministério da Ciência e Tecnologia:
"Esta tendência à concentração indica
que programas que visem a descentralização da ciência no Brasil podem ter alto
custo e não ter efeitos práticos".
A surpresa maior, ao menos para leigos, fica com a distribuição entre áreas
de conhecimento. A julgar pela projeção
pública dos últimos anos, deveria dar
biologia molecular e genética na cabeça,
mas as campeãs são as mais estabelecidas ciências agrárias (3,07% da produção
mundial) e física (2,04%). Sinal de que
investimentos em pesquisa são de longa,
longuíssima maturação, e de que o dever
maior de seus administradores é o de
não abortar o desenvolvimento consistente das últimas décadas.
E-mail: cienciaemdia@uol.com.br
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