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DANUZA LEÃO
Triste sina
Mulher de candidato não
pode fazer o que quer; tem
sempre de perguntar ao marqueteiro se pode.
Se quiser almoçar num sábado
com duas amigas enquanto o marido faz carreata, pode ir a um
restaurante caríssimo ou tem de
ir a um botequim para ficar mais
perto do povo? E pode beber? E, se
passar da conta e sair cambaleando, leva um pito dos assessores ou
tem sempre um por perto para
não deixar que isso aconteça?
E as roupas, pode usar o que
quiser ou tem de fazer a linha sóbria e modesta para que os eleitores a considerem uma mulher
correta? E, se um dia resolver usar
um sapatinho de onça, será que
vai pegar mal? E aquela bolsa de
crocodilo que era da avó e ela
guardou carinhosamente? Se
usar, o Partido Verde vai sair da
coligação porque o Ibama, aquelas coisas? Mas o jacaré já estava
morto quando ela ganhou a bolsa, será que nem assim pode?
Cheia de complicação, essa tal
dessa política.
Quando estava no colégio
-público, naturalmente-, ela
tinha um amigo com fortíssimas
tendências homossexuais. O tempo passou, ele se operou em Londres, hoje é travesti e os dois continuam amigos fiéis. Dá para sair e
jantar num restaurante com ele/
ela, ou o marido vai perder votos
por causa disso?
Ah, ser mulher de candidato
não é fácil.
Não pode ser vaidosa, não pode
ir à praia nem ao bingo, tem de
arranjar assunto para falar com
as mulheres dos vereadores, deputados, prefeitos e só Deus sabe o
que mais. Tem de ser simpática
mas não expansiva, delicada mas
não íntima, e é melhor que não dê
uma só opinião sobre nada, a não
ser que isso tenha sido aprovado
pelo comitê de campanha.
As coitadas não podem nem
sair de casa, pois haverá sempre
um fotógrafo na porta xeretando
-e fotografando- aonde elas
foram e com quem. E falar no celular, nem pensar. Logo aquela
para quem até então grampo era
só para usar no cabelo.
Tem de visitar creches, hospitais, botar crianças no colo e ter
sempre 40 quilos de café em casa
para quando o marido chega com
a tropa de choque -talvez até
uma comidinha. Não pode fazer
cara feia; tem de estar de bom humor o tempo todo e tratar muito
bem aquele de quem teve ódio
durante anos porque era inimigo
político do marido, que falava
hor-ro-res dele; agora são aliados
e amigos assim, ó. Que vida.
Mulher de candidato só pode
abrir a boca para comer e, aliás,
tem de comer tudo que lhe for oferecido -e elogiar. Se falar em
dieta, está ferrada; e uma possível
futura primeira-dama pode ser
chegada a essas futilidades?
Mulher de candidato não pode
sair para comprar um vestidinho
novo; compras só no supermercado, e tem de passar as noites decorando os preços de tudo.
Já pensou se um repórter pergunta quanto custa um quilo de
feijão e ela não sabe?
E tem mais: o futuro. Se o marido for eleito, vai ter de convidar
as embaixatrizes dos países estrangeiros para tomar chá -e
não há nada pior do que receber
para um chá- e se curvar a tudo
que o protocolo mandar. Enfim,
curto e grosso, durante quatro
longos anos, não vai mais ser dona do seu nariz.
Só tem uma coisa que mulher
de candidato pode fazer -e talvez alguma faça: votar no candidato de outro partido.
E-mail -
danuza.leao@uol.com.br
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