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DESAFIO DE GOVERNO
Exploração sexual de crianças e adolescentes se intensificou na semana que antecedeu o Carnaval
Prostituição de jovens aumenta no Rio
MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO
Menos de dois meses depois de
o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva afirmar em sua primeira
reunião ministerial que o combate à prostituição infanto-juvenil
seria ""questão de honra" do novo
governo, a exploração sexual de
crianças e adolescentes se intensificou no Rio na semana que antecedeu o Carnaval.
Garotas de outros bairros cariocas, cidades fluminenses, Distrito
Federal e Estados como São Paulo
e Espírito Santo se juntaram às
que habitualmente se prostituem
em Copacabana. O bairro da zona
sul é a principal concentração de
turistas nacionais e estrangeiros,
especialmente à noite.
As jovens buscam clientes na
pista da av. Atlântica, junto aos
carros, nas calçadas, em bares,
restaurantes e diante de boates.
No começo da madrugada de
sexta-feira, a carioca de Bonsucesso (zona norte) Ellen (nome fictício, como o de todas as menores
de idade nesta reportagem), 17
anos declarados, oferecia o programa de uma hora por R$ 100,
mais R$ 40 para pagar o hotel (de
endereço não revelado).
Ao seu lado, Cátia, 16, cobrava o
mesmo preço. Uma terceira amiga, aparentemente mais nova, negou-se a dizer a idade. Estavam
em frente à boate Help.
Na noite de quarta-feira, na Barra da Tijuca (bairro de elite da zona oeste), Maria Luísa, jurando 18
anos e aparentando menos, pedia
R$ 80 pelo programa. Ela fazia
ponto à altura do posto 3 da av.
Sernambetiba. Na av. Érico Veríssimo, duas adolescentes abordavam os motoristas no ponto de
ônibus mais próximo da praia.
Ellen e Maria Luísa contam uma
história cada vez mais comum.
Elas são jovens viúvas. Os companheiros de ambas morreram, dizem, em conflitos do tráfico de
drogas. Ellen cria sozinha o filho
de um ano de idade.
Tanto em Copacabana como na
Barra, foi fácil encontrar adolescentes se prostituindo -ou sendo exploradas sexualmente, como preferem as ONGs (organizações não-governamentais) que
tratam do tema.
De segunda-feira à madrugada
da sexta, a Folha não testemunhou nenhuma operação policial
ou de órgãos públicos específica
de combate à prostituição infanto-juvenil. Contatada pelo jornal,
a PF (Polícia Federal) informou
que começaria na noite de anteontem ações que se estenderão
até a Quarta-Feira de Cinzas.
O Ministério da Justiça anunciou uma operação especial de
combate à prostituição de crianças e adolescentes durante o Carnaval em todo o país. Participam
seis ministérios e duas secretarias
especiais da Presidência. Oficialmente, a operação teve início no
sábado retrasado, em Recife.
Pelo menos no Rio, contudo, a
""campanha socioeducativa" direcionada ""à população brasileira,
turistas estrangeiros e nacionais"
parece menos efetiva do que a do
ano passado.
Em 2002, a Embratur entregou à
saída dos vôos com origem em
outros países panfletos alertando
para o caráter criminoso da exploração sexual de menores (pena
de quatro a dez anos de reclusão).
Conforme a empresa, neste ano
não está prevista a distribuição
dos panfletos nem a exibição, como há um ano, de vídeos em vôos
internacionais.
A Riotur não promove campanha específica contra a prostituição infanto-juvenil. A empresa
prevê que 388 mil turistas (30%
dos quais estrangeiros) viajem ao
Rio no Carnaval. A cidade é a que
mais recebe visitantes estrangeiros (29% do total), de acordo com
os números de 2001 da Embratur.
É a preferida de 42% dos italianos.
Um ano atrás, a então secretária
de Estado de Ação Social, a hoje
governadora Rosinha Matheus,
comandou 600 jovens que foram
à orla distribuir propaganda em
quatro idiomas. Agora, não ocorreu nada semelhante.
Ao contrário, as prostitutas
adultas de um dos mais tradicionais redutos de turismo sexual no
Rio, o pedaço da praia de Copacabana em frente ao hotel Othon
Palace, passaram a dividir fregueses com as adolescentes.
Embora Copacabana seja o
bairro onde mais crianças (até 11
anos, segundo o Estatuto da
Criança e do Adolescente) e adolescentes (até 17) prostituídos são
encaminhados a órgãos de assistência, a Operação 12 de Outubro
(referência ao Dia da Criança),
realizada pela PF em janeiro, só
fez prisões na Vila Mimosa.
No tradicionalíssimo baixo meretrício na região central do Rio,
25 pessoas foram presas, inclusive
dois homens flagrados fazendo
sexo com menores. A Polícia Federal informou ter realizado diligências em Copacabana, mas lá,
onde a prostituição infanto-juvenil é mais rentável, ninguém foi
detido.
Sonhos
De cada quatro menores explorados sexualmente que são encaminhados à Fundação da Infância
e Adolescência (Secretaria de Estado de Ação Social e Cidadania),
um é abordado em Copacabana
(25% dos casos do município).
Depois de Copacabana, seguem
as praças 15 e Mauá (centro, 9,4%
na soma das duas), Barra da Tijuca (8,3%) e praça da Bandeira (arredores da Vila Mimosa, 7,8%).
No Estado, de 560 casos acompanhados sistematicamente desde 2000, os Crias (Centros de Referência Para a Infância e Adolescência) acolheram mais garotas
(79,3%) e garotos (20,7%, a maioria homossexuais) de 17 anos
(26%). De 16 anos, foram 25%. De
15 anos, 17,2%. De 14 anos, 13,3%.
De 13 anos, 9,8%.
Dez meninas de dez anos foram
encontradas, a maioria em Copacabana. Suspeitou-se que uma delas, que já havia menstruado, estivesse grávida. Diagnosticou-se
""gravidez psicológica".
Na terça à tarde, a jovem Michele, de Nova Iguaçu (Baixada Fluminense), pediu numa mesa do
bar Mab's, na av. Atlântica, R$ 150
pelo programa. Depois que o repórter se identificou como tal, e
não como candidato aos seus serviços, reconheceu não ter 18 anos,
como dizia, mas 16. Uma amiga a
contradisse: seriam 15.
Antes de sair com um turista
alemão, Michele disse sonhar
com o príncipe encantado estrangeiro que a levaria do Brasil para
um destino de felicidade. Poucas
alcançam o sonho recorrente -a
esmagadora maioria é de adultas.
Jéssica, uma antiga menina de
rua que fugiu de casa e se prostituía em Copacabana, chegou lá.
Há pouco menos de dois meses,
com um passaporte obtido graças
a uma carteira de identidade falsa,
com a idade adulterada, partiu
com um italiano.
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