|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
HISTÓRIA
Em Capivari, família resistiu à pressão dos canaviais e ao preconceito por 144 anos; reconhecimento impede venda de área
Quilombo é reconhecido no interior de SP
CAROLINA FARIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA CAMPINAS
Mesmo com a pressão dos canaviais e com o preconceito da comunidade, o sítio Santa Rita de
Cássia, em Capivari (135 km a noroeste de São Paulo), resistiu 144
anos e foi reconhecido como terra
quilombola na segunda quinzena
do mês passado.
O quilombo será o primeiro do
Estado de São Paulo a deixar de
ser uma área particular para ser titulado como local ocupado por
descendentes de escravos.
Com seis hectares, o mais novo
quilombo reconhecido pelo Estado é isolado pela cana-de-açúcar
desde seu surgimento, em 1860.
Foi comprado por Eva Barreto,
negra, que recebeu as terras de
seu ex-dono com o compromisso
de trabalhar para pagar pela área.
Desde então, a terra nunca deixou de ser ocupada por descendentes da primeira proprietária.
Venda proibida
Com o reconhecimento, nenhum membro das famílias que
descendem da matriarca poderá
vender glebas da terra, como
ocorreu na época da expansão da
cana-de-açúcar na região.
"Na década de 70 do século passado, com a expansão do canavial,
aconteceu a migração da maioria
dos descendentes de escravos que
vivia no quilombo. Eles vendiam
as terras para as usinas e iam para
a cidade", disse a antropóloga
coordenadora do levantamento
sobre o quilombo de Capivari, Patrícia Scalli dos Santos, 33.
"Por anos, usinas de açúcar tentaram comprar a área", disse
Cleonice Pereira, 50, que mora na
área atualmente.
Reconhecimento
O processo de reconhecimento
começou em 2002, quando o pastor evangélico Carlos Alberto
Sampaio, 43, quinta geração de
Barreto, procurou o Itesp (Fundação Instituto de Terras do Estado
de São Paulo) para tentar a regularização do quilombo.
Hoje o Estado de São Paulo tem
17 quilombos, reconhecidos pelo
Itesp a partir de 1998, e cinco em
fase final de reconhecimento.
Com o reconhecimento, 16 famílias da descendência de Barreto
são consideradas quilombolas.
De acordo com a antropóloga, o
reconhecimento é importante
não somente para preservar a
área como terra quilombola,
"mas para o resgate do valor cultural, histórico e da auto-estima
dos negros".
Além disso, o Itesp também oferece cursos e oficinas de capacitação na área agrícola para ajudar as
comunidades dos quilombos.
A antropóloga explica que os
negros em Capivari, com base nos
estudos feitos pelo Itesp, sofreram
com o preconceito da população
branca da cidade. "Negros não casavam com brancos, andavam do
lado oposto da praça e não podiam entrar no clube", afirmou.
Agora cabe ao Incra (Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária) dar o título de quilombo à área após avaliar qual tipo de procedimento será utilizado por ser uma área particular,
herdada pelas famílias quilombolas locais.
Texto Anterior: Centro de idéias congrega estudantes e paga para pensar Próximo Texto: Local não tem luz nem esgoto Índice
|