São Paulo, domingo, 02 de junho de 2002

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VIOLÊNCIA

Estudo sobre criminosos presos no Estado de São Paulo revela que ação se apóia em marginais inexperientes

Sequestro atrai jovens de baixa renda

André Sarmento/Folha Imagem
Edson Lendro da Silva, 19, preso enquanto vigiava o cativeiro de um empresário sequestrado


GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois de levar uma surra da mãe, Edson Leandro da Silva, 19, prometeu deixar o crime. Mais do que a surra, foi o medo que o fez tomar essa decisão. Deixou o roubo, por temor de ser preso, e o tráfico, pelo medo de ser morto.
A promessa de Silva não durou seis meses. Por telefone, ele recebeu um convite para o que parecia o crime ideal: menor risco de ser morto ou preso, mais dinheiro e em menos tempo. O jovem aceitou participar de um sequestro.
Sem saber, se encaixava perfeitamente no perfil da maioria dos 198 sequestradores presos em São Paulo desde o início do ano até 23 de maio. É jovem, como 75% dos presos, de baixa renda (igual a 94% dos casos) e sem antecedentes criminais, como 44% dos detidos (veja quadro acima). Os dados são da Polícia Civil.
Além disso, estava desempregado, como cerca de 90% dos presos por sequestro. Segundo dados da Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados), 30,8% dos desempregados na região metropolitana de São Paulo têm de 18 a 24 anos, faixa em que está Edson Leandro da Silva.
Com o estudo interrompido na 4ª série do ensino fundamental e com uma filha de 1 ano e 7 meses, Silva pretendia ganhar, com um sequestro, de R$ 5.000 a R$ 6.000 -com o tráfico, demoraria seis meses para juntar a mesma quantia. Foi pelo envolvimento com drogas que levou a surra da mãe.
No último dia 15, Silva dormia enquanto o cativeiro onde "trabalhava" era cercado por PMs e investigadores do 25º DP (Parelheiros, na zona sul). Só nesse momento ele soube que o sequestrado era o empresário D.J.S., 29, no cativeiro havia dez dias.
O jovem era "funcionário" do que se chama cativeiro terceirizado, uma das novidades do sequestro banalizado. Sem contato com os líderes, esses funcionários são a garantia de que os cabeças não serão pegos se o cativeiro for descoberto pela polícia.
"Ele faz parte do grupo de criminosos que não têm conhecimento, escuta falar e resolve fazer também. É tudo no embalo", afirmou o delegado Darci Sassi, titular da Delegacia Seccional de Santo Amaro (zona sul), área na qual Silva foi preso.
A falta de planejamento, a escolha da vítima pela aparência -como em uma loteria-, a improvisação do cativeiro e os resgates com valores mais baixos são outras características dessa banalização, que representa um risco a mais para os reféns.
"Eles não têm nenhum preparo psicológico. Na primeira situação de pressão, podem matar a vítima", afirmou o delegado.
Segundo o pesquisador Luis Antonio de Souza, do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo), a banalização do crime é mais um atrativo para jovens marginalizados. "Mas, no final, os mentores ficam livres e só os pés-de-chinelo vão para a cadeia."
O perfil dos sequestradores presos -homens, entre 18 e 30 anos e da classe D- também mostra isso. Quase sempre são presos os guardiães dos cativeiros, que são os integrantes com menor poder dentro das quadrilhas.
Para o coronel da reserva José Vicente da Silva, pesquisador do Instituto Fernand Braudel, o jovem sequestrador tende a desprezar os riscos da atividade. "Nós somos seletivos nas informações que recebemos. Fazer o quê?"



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